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‘PSDB vai entregar um partido vazio para Tabata’, afirma líder da bancada na Câmara de São Paulo

Gilson Barreto, que anunciou desfiliação junto com a bancada inteira do partido, critica recusa em apoiar o prefeito Ricardo Nunes; direção tucana diz que situação é ‘página virada’ e fala em ‘controle por holerite’

Foto do author Samuel Lima
Por Samuel Lima
Atualização:

A insatisfação é visível quando o vereador Gilson Barreto, um dos fundadores do PSDB na década de 1980, fala sobre o cenário político atual da sigla e a recusa da direção tucana em apoiar a reeleição de Ricardo Nunes (MDB) em 2024. Ele, que é líder da bancada tucana na Câmara Municipal de São Paulo e vice-presidente da comissão provisória que lidera o diretório municipal, anuncia oficialmente a desfiliação em plenário nesta terça-feira, 2.

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O partido, até então o maior da Câmara, ao lado do PT, com oito vereadores, agora se vê diante da possibilidade concreta de perder todos os seus representantes nesta janela partidária. A debandada ocorre até a próxima sexta, 5 de abril, data limite para estar filiado ao partido que representará nas urnas em outubro. A direção do partido minimiza o episódio, diz que a questão é “página virada” e que a decisão de não fechar com Nunes foi feita democraticamente, por 9 votos a 2, entre militantes históricos do PSDB que compõem o diretório municipal (veja mais abaixo).

Em conversa com o Estadão em seu gabinete no Palácio Anchieta, o vereador criticou abertamente a cúpula partidária e reclamou que as decisões são tomadas “de cima para baixo” em Brasília e no Rio Grande do Sul — uma referência a líderes no plano federal, como o governador gaúcho Eduardo Leite e o presidente da sigla, Marconi Perillo. Para ele, há uma “falta de compreensão” a respeito da continuidade da gestão Bruno Covas, prefeito tucano que faleceu em 2021, na cidade de São Paulo.

O empenho do PSDB estaria principalmente em apoiar a deputada Tabata Amaral (PSB), segundo observa pelas tratativas das semanas recentes, mas o endosso acabaria sendo feito apenas em termos de marca, e não no corpo a corpo com os eleitores paulistanos. “Eles vão entregar a sigla, o PSDB, juridicamente, porque a militância, os adeptos, os filiados estão com o Ricardo Nunes”, declara o parlamentar, falando em nome de uma suposta maioria nos 58 diretórios zonais da capital, berço político do partido.

O vereador Gilson Barreto, líder do PSDB na Câmara, que acompanha a debandada de toda a bancada antes das eleições de 2024. Foto: Richard Lourenço/Câmara Municipal de São Paulo

Essa decisão, no entanto, ainda não foi tomada. Há dentro do partido quem defenda uma candidatura própria. Barreto alega, porém, que nunca foram apresentados nomes concretos para a bancada nas reuniões, o que reforçaria o interesse em Tabata. Nesse caso, haveria o temor de que o apoio tucano acabe se revertendo, ainda que indiretamente, no segundo turno, ao deputado Guilherme Boulos (PSOL), em razão da proximidade entre o PSB e o PT no plano federal e da incredulidade nas chances eleitorais da deputada, que está em um distante terceiro lugar nas pesquisas neste momento.

Eles vão entregar a sigla, o PSDB, juridicamente, porque a militância, os adeptos, os filiados estão com o Ricardo Nunes

Gilson Barreto, líder do PSDB na Câmara Municipal de São Paulo

Outra questão apontada publicamente pela direção nacional para rejeitar o atual prefeito é a aproximação dele com o ex-presidente Jair Bolsonaro. Nunes compareceu, por exemplo, a ato convocado pelo ex-presidente na Avenida Paulista em meio a investigações da Polícia Federal que o acusam de participar de uma trama de golpe de Estado antes e depois das eleições de 2022, vencidas pelo petista Luiz Inácio Lula da Silva. Nesse caso, repete um argumento comum do prefeito — de que o candidato na cidade é ele, e não outro. “É importante para o Nunes ter o apoio, e acho que não é problema nenhum aceitar.”

O fato de o PSDB, que ganhou a eleição passada com Bruno Covas na cabeça de chapa, sequer compor com o vice não é algo que afaste a bancada tucana dissidente na Câmara. Barreto argumenta que a questão da legenda “é muito relativa” e que Nunes manteve gestores nomeados por Covas na prefeitura, seus projetos e o plano de metas.

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“Hoje a prefeitura está num estágio muito bom, dá para fazer obras à vontade, graças ao enxugamento da máquina, a reorganização de tudo”, diz. “E o Ricardo tem sido leal com o PSDB. Se ele tivesse chegado e dito ‘Agora sou eu, sai todo mundo’, era uma coisa. Mas ele pegou um vereador e colocou como secretário, pegou o staff do Bruno e não mexeu em ninguém. A questão é só de sigla?”

A debandada tucana também seria motivada pela dificuldade de formação de chapa no estourar do prazo da janela partidária. Essa prévia é importante para a tomada de decisão do parlamentar porque dificilmente o candidato obtém sozinho o número de votos para conquistar a cadeira, dependendo do desempenho geral do partido. Apesar da desfiliação, Barreto ainda aguarda para decidir o destino, escolhendo uma legenda que apoie Nunes e que não esteja com candidatos competitivos em excesso. Ele citou na conversa diretamente o MDB do prefeito e o PSD de Gilberto Kassab, os dois destinos preferidos dos tucanos até agora.

Direção do PSDB fala em ‘controle por holerites’ e defende protagonismo

O Estadão procurou o presidente da comissão provisória do diretório municipal, o ex-senador José Aníbal, nome indicado pelo presidente Marconi Perillo na capital paulista após a intervenção contra Fernando Alfredo, ligado ao ex-governador João Doria, ainda no ano passado, e a posterior saída de Orlando Faria, que atualmente trabalha na pré-campanha de Tabata Amaral. Ele rebate as afirmações dizendo que a proposta apresentada a Nunes só era “inviável” porque o partido foi escanteado pelo vice de Bruno Covas em favor de uma aliança com Bolsonaro e o PL.

José Aníbal, presidente municipal do PSDB, diz que partido foi tratado como um 'apêndice' do prefeito Ricardo Nunes (MDB), vice de Bruno Covas em 2020. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

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“O nosso objetivo era retomar o acordo vitorioso de 2020, com o PSDB agora indicando o vice. Eles não consideraram em nenhum momento, nem esses vereadores. Nenhum deles quis assumir a relevância e o protagonismo do partido”, diz Aníbal. “O MDB nos tratou como apêndice. Foi atrás de outra freguesia (em referência ao PL de Valdemar Costa Neto). A gente sabe que o não acordo é caminho livre para o acerto com Bolsonaro, e com ele nós não vamos. Bolsonaro é golpista, como as investigações estão mostrando. O fato de ele ter voto é um desafio para todos que não são golpistas, de conquistar esse eleitorado que se deixa seduzir por um cara que teve um governo desastroso.”

Aníbal considera que críticas sobre a rejeição do PSDB ao prefeito já são “página virada” e que o processo que sepultou o acordo, por 9 votos a 2, foi democrático e teve a participação de “pessoas que tem militância histórica no partido”. A campanha interna na capital em favor de Nunes é atribuída por ele a um suposto “controle por holerites” na prefeitura, ou seja, a presença de diversos indicados políticos entre os dirigentes zonais do PSDB na cidade de São Paulo.

O MDB nos tratou como apêndice. Foi atrás de outra freguesia. A gente sabe que o não acordo é caminho livre para o acerto com Bolsonaro, e com ele nós não vamos.

José Aníbal, presidente do diretório municipal do PSDB em São Paulo

“A nossa proposta não era fisiológica, não. Era acordo político, como o que foi feito quatro anos atrás”, afirma o dirigente. “Enquanto tiver esse controle dos zonais através dos holerites, esse diretório municipal estará totalmente contaminado. Vamos cuidar disso fortemente a partir da semana que vem. Não vamos ficar inertes”. Ele também rebate a afirmação de que o partido estaria esvaziado. “O PSDB tem um ativo, fez o Plano Real, mudou o Brasil e governou São Paulo por vários mandatos. Esse partido tem história, tem imagem, e é preciso trabalhar isso.”

A respeito dos problemas na construção da chapa para o Legislativo, motivo apontado inclusive por parlamentares que manifestavam o desejo de ficar, Aníbal entende que houve comodismo dos próprios vereadores a partir do momento em que Ricardo Nunes passou a ter a “bancada na mão”. “Eles se conformaram com uma situação que certamente julgaram que era melhor para eles, mas não era o melhor para o partido, nem para a cidade. São Paulo queria que o partido estivesse ativo, se posicionando.”

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