Funcionária da USP admite culpa em morte de aluno e cumprirá oito meses de serviço comunitário

Família de Filipe Varea Leme, morto na Poli após ser atingido por um armário que transportava, ainda busca indenização da universidade na esfera cível

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Por João Ker
Atualização:

Mais de 18 meses após Filipe Varea Leme ter morrido enquanto transportava um armário na Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP), a funcionária que deu a ordem ao aluno admitiu que foi negligente no caso. Em audiência no último dia 2, ela fez um acordo com o Ministério Público que prevê a não-persecução penal pelo crime. Ela terá que prestar oito meses de serviços comunitários, mas segue como réu primária e sem antecedentes criminais. 

“O pacote anticrime criou um benefício aos acusados chamado acordo de não persecução penal. Para crimes com penas mínimas (abaixo de quatro anos), o MP deixa de denunciar e faz um acordo diretamente com o réu, desde que ele confesse”, explica Euro Bento Maciel Filho, que defende os pais de Filipe no processo penal.

Filipe Varea Leme tinha 21 anos e estava no 4º ano do curso de Geografia, na USP Foto: Reprodução Redes Sociais

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Em 30 de abril do ano passado, por volta das 15h37, Filipe estava na Poli, onde prestava auxílio de informática aos alunos e professores como bolsista. A supervisora então pediu que ele e um amigo transportassem um armário para outro andar do prédio, mesmo com a faculdade contando com uma equipe de manutenção que não chegou a ser acionada. 

O armário era pesado e, para transportá-lo até o andar seguinte, os estudantes pararam duas vezes no meio do caminho para descansar. Eles decidiram usar o elevador para pessoas com deficiência, que não tinha porta nem era próprio para carga. Pouco tempo depois, o estudante foi encontrado morto dentro do elevador. 

“Foi uma série de equívocos, fora o desvio de função”, avalia Maciel Filho. O “carrinho que ele usou para o transporte estava encostado no peito e o armário era maior que o elevador. O armário ficou preso na laje, de tal forma que o móvel veio pra cima dele”, conta. Aos 21 anos e no 4ºano de Geografia, onde era considerado um aluno prodígio, Filipe morreu por asfixia com um corte profundo no pescoço e dentro do elevador. 

Filipe foi morto enquanto transportava um armário de um andar ao outro na Escola Politécnica (Poli) da USP Foto: Reprodução Redes Sociais

O homicídio foi considerado culposo, quando não há a intenção de matar. Os pais do estudante, Fábio e Ester, agora tentam na esfera cível uma indenização contra a USP por danos morais, no valor de R$ 500 mil para cada um. De acordo com Rogério Licastro Torres de Mello, advogado cível da família, a universidade chegou a fazer um contato via reitoria e disponibilizar o setor de psicologia para os familiares, mas ele considera que foi algo “protocolar”.

“Foram os alunos e professores da Faculdade de Geografia que acabaram acolhendo emocionalmente os pais. O que a instituição deveria ter feito ficou por conta das pessoas”, afirma Mello. Ele ainda alega que a USP tentou responsabilizar o aluno pela escolha de ter carregado o armário pelo elevador. “Não houve um mea culpa, reconhecimento de responsabilidade ou pedido de perdão.”

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Para Maciel Filho, a admissão de culpa da funcionária pode beneficiar a ação que os pais de Filipe movem contra a USP. “De certa forma, demonstra a culpa da funcionária ou da universidade. É duro saber que a vida do seu filho foi reduzida a oito meses de serviço comunitário.”

A Diretoria da Escola Politécnica da USP afirma que "procurou manter contato com a família do aluno, oferecendo suporte em tudo que fosse preciso" e que "procurou agilizar de todas as formas o pagamento do seguro à família", além de ter publicado uma nota oficial de pesar em seu site, em 3 de maio do ano passado. Confira abaixo:

Os docentes, funcionários técnicos e administrativos e alunos da Escola Politécnica (Poli) da USP reafirmam sua solidariedade e respeito à família do jovem Filipe Varea Leme, à comunidade universitária da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e a toda a Universidade, e reitera as informações veiculadas na nota divulgada, no dia 30 de abril, pela assessoria de imprensa da USP e da Poli.

Esclarecemos que, em respeito aos pais de Filipe, somente tornamos publica a nota de pesar logo depois da comunicação oficial pelas autoridades competentes à família. Em todo esse período, a Diretoria da Escola Politécnica manteve contato e colocou-se à inteira disposição dos familiares do estudante.

Informamos, ainda, que, no dia 2 de maio, a Poli instaurou processo de sindicância para apuração das circunstâncias e responsabilidades relacionadas ao fato, e tem atendido todas as solicitações das autoridades para elucidação do ocorrido.

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