O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino pretende tirar as despesas decorrentes de ações para o enfrentamento às queimadas do limite de gastos imposto pelo arcabouço fiscal, enquanto durar a emergência climática. O sinal foi dado pelo próprio Dino quando determinou ao governo medidas imediatas para o combate ao que classificou como “pandemia de incêndios florestais”.
Em seu despacho de terça-feira, 10, o magistrado diz que proferirá decisão sobre “créditos extraordinários no que se refere à aplicação do arcabouço fiscal e da contabilização para os resultados primários das contas públicas”.
Agora, a expectativa no Ministério da Justiça, na Advocacia-Geral da União (AGU) e na Casa Civil é de que haja uma “tábua de salvação fiscal” para o desembolso de recursos necessários no combate ao fogo.
A situação de calamidade já atinge 58% do território nacional. Levantamento da AGU indica que 85% dos focos de incêndio estão em 20 cidades, principalmente na Amazônia e no Pantanal. O Brasil já perdeu 33% de suas áreas naturais, com vegetação nativa, praias e dunas, segundo dados recentes do MapBiomas, grupo que reúne ONGs, universidades e empresas de tecnologia.
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A criação da Autoridade Climática, anunciada nesta semana pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), também deve ficar fora do limite de gastos. Planejada para gerir políticas de preservação do clima, a autarquia constou do cardápio de promessas na campanha de Lula, em 2022, mas nunca saiu do papel.
Ao contrário: no ano passado, quando uma comissão mista formada por deputados e senadores analisava a Medida Provisória de reorganização da Esplanada, a política ambiental do governo foi desidratada e a ministra Marina Silva perdeu poderes.
Sob pressão de uma onda de incêndios, o presidente ressuscitou o projeto da Autoridade Climática como resposta à crise. Mas a criação da autarquia ainda precisa passar pelo crivo dos parlamentares.
Lula enviará ao Congresso, depois das eleições municipais, uma Medida Provisória com o Estatuto da Emergência Climática. A ideia é que o governo possa agir antes do desastre, com medidas que permitam desvincular a liberação de recursos federais das regras do arcabouço fiscal.
“É preciso um marco regulatório criando a figura da emergência climática porque, quando é decretada a emergência, como no Rio Grande do Sul, a gente tem a possibilidade de que isso não conte no teto de gastos”, afirmou Marina, ao participar de audiência no Senado, na semana passada. “Se tenho de agir preventivamente, tenho de ter cobertura legal para isso.”
O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, identificou mais de 2 mil municípios sob risco de eventos extremos. Em relatório, o Cemaden destaca que muitos deles “já enfrentam condições de seca por 12 meses consecutivos, o que tem reduzido significativamente os níveis dos rios e aumentado o risco de propagação de fogo”.
Em maio, o Congresso aprovou projeto de decreto legislativo, assinado por Lula, permitindo que despesas do governo para socorro ao Rio Grande do Sul, após a crise das enchentes, fossem excluídas do limite de gastos e da meta de resultado primário.
No mesmo dia em que Dino mandou o governo reforçar as ações para o enfrentamento às queimadas – como a convocação de um mutirão de bombeiros militares para compor o efetivo da Força Nacional –, Lula visitou comunidades afetadas pela seca no Amazonas.
Em Manaus, ele anunciou R$ 500 milhões, em um prazo de cinco anos, para obras de dragagem dos rios Amazonas e Solimões. Por causa dos limites fiscais, no entanto, o que tem se observado até agora foi a redução da verba que deveria ser destinada à prevenção de desastres climáticos.