Crítica: Chato, Globo de Ouro 2024 tenta agradar a todo mundo na luta para recuperar credibilidade

Premiação consagrou ‘Oppenheimer’ e ‘Succession’, e só não esnobou ‘Barbie’ por nova categoria criada para bajular Hollywood

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Por Simião Castro
Atualização:

O Globo de Ouro 2024 agoniza para cumprir o compromisso de caminhar na direção de um prêmio mais diverso. E de provar que mudou, enquanto tenta recuperar a credibilidade que um dia teve no hall das principais premiações da indústria cultural. Mas, após a queda, ele ainda se arrasta.

Após as recusas de Chris Rock e Ali Wong de apresentar o prêmio — escolhas que aliariam talento e diversidade —, o lugar de mestre de cerimônias ficou para o comediante Jo Koy, numa definição que só saiu em 21 de dezembro. Talvez a pressa tenha afetado a performance: o host não cativou e foi, honestamente, chato.

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Por outro lado, a entrega dos prêmios certos a concorrentes certos fez um aceno de que busca resgatar seriedade. Troféus importantes pinçados para artistas específicos atenderam a parte das reivindicações. E a adição da categoria de ‘Conquista Cinematográfica e de Bilheteria’ é um claro agrado à cadeia produtiva hollywoodiana para manter relevância

Foi uma cerimônia à caça de equilíbrio. Tendo se consagrado por ser talvez a festa menos formal das premiações, com convidados sentados em mesas e open bar, ser divertido era o mínimo. Ao procurar por sobriedade, pode ser que o charme tenha se perdido em meio ao escândalo.

Comediante Jo Koy foi o mestre de cerimônias do Globo de Ouro 2024 neste domoingo, 7 de janeiro Foto: Ashley Landis/AP

Como o Globo de Ouro chegou até aqui

A Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood (HFPA, na sigla em inglês), que organizava o evento desde 1944, acabou extinta em 2023 com a compra dos direitos do prêmio pela Eldridge Industries e a Dick Clark Productions.

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A aquisição foi o ponto culminante de uma escalada iniciada em 2021, após o jornal Los Angeles Times expor um esquema de possível compra e venda de votos. Com ele, veio ainda a público o dado de que não havia nenhum jornalista negro entre os 87 integrantes da organização.

As repercussões que se seguiram trouxeram boicotes de artistas naquele ano, cancelamento da transmissão na TV pela rede NBC em 2022 e uma série de reformas estruturais. Premiar Michelle Yeoh e Ke Huy Quan como Melhor Atriz e Melhor Ator Coadjuvante por Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo no ano passado amenizou a pressão, mas não foi suficiente.

A HFPA entregou os pontos e, agora, os novos donos ampliaram o corpo votante para 300 membros de 75 países. O suposto objetivo era tornar o Globo de Ouro o órgão de premiação com maior diversidade cultural. De novo, não adiantou.

Ayo Edebiri (à esquerda) e Jeremy Allen White venceram Globo de Ouro pela série 'O Urso'  Foto: Allison Dinner/EFE/EPA

Pouca representatividade ainda é regra

Dos 90 indicados nas categorias de atuação, apenas 18 eram de origem não-branca. E entre cinco filmes em língua não-inglesa, dois eram americanos. Entre os premiados, baixíssima proporção também.

Por Os Rejeitados, Da’Vine Joy Randolph venceu como atriz coadjuvante. Ali Wong e Steven Yeun, de Treta, ganharam como melhores atriz e ator em Minissérie, Antologia ou Filme para TV.

Steven Yeun e Ali Wong conquistaram troféus do Globo de Ouro pelos papéis que interpreteram em 'Treta', da Netflix Foto: Chris Pizzello/AP

Ayo Edebiri foi premiada por O Urso como Melhor Atriz em Série de Comédia ou Musical. Lily Gladstone levou Melhor Atriz em Filme de Drama com Assassinos da Lua das Flores. E o Melhor Filme em Língua Não-Inglesa foi o francês Anatomia de uma Queda.

E acabou aí.

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Melhor Atriz em Filme de Drama, Lily Gladstone é a primeira mulher de origem indígena a vencer no Globo de Ouro. Ela usou uma língua falada por povos originários americanos na abertura do discurso de agradecimento do prêmio Foto: Sonja Flemming/CBS via AP

Cerimônia trouxe poucas surpresas

Os grandes troféus da noite ficaram com os favoritos. A Melhor Série de Drama do ano ficou para o sucesso estrondoso de Succession, que encerrou a última temporada em alta. E a produção levou quatro de cinco prêmios possíveis, pois tinha três indicados a atores principais e três coadjuvantes. O rapa veio com Matthew Macfadyen como Ator Coadjuvante, Sarah Snook de Melhor Atriz e Kieran Culkin como Melhor Ator.

Em outra sessão nobre do Globo de Ouro, O Urso foi destaque entre comédias. Venceu como a melhor série desse recorte e também emplacou pela segunda vez Jeremy Allen White como Melhor Ator, além do já mencionado troféu a Ayo Edebiri.

No cinema, dois dos principais prêmios ficaram com Oppenheimer. Melhor Direção, para Christopher Nolan, que venceu o primeiro Globo de Ouro após seis indicações, e o maior título da noite: Melhor Filme de Drama.

Ao total, foram cinco troféus, com destaque para Melhor Trilha Sonora Original (Filme) conquistado por Ludwig Göransson, de apenas 39 anos. Foi ele o responsável pelo deslumbre sonoro da produção sobre o criador da bomba atômica.

Codiretora Greta Gerwig, à esquerda, e a atriz e produtora Margot Robbie recebem o Globo de Ouro por sucesso de bilheteria pelo filme 'Barbie' Foto: Sonja Flemming/CBS via AP

Barbie quase foi esquecida no churrasco

Outro favorito impossível de ignorar, Barbie havia sido indicado nove vezes e venceu apenas dois prêmios, sendo quase tão esnobado quanto Assassinos da Lua das Flores. A lavada só não foi maior — visto que com sete indicações o filme de Martin Scorsese só levou um prêmio — porque a boneca de Margot Robbie conquistou a nova categoria que premia os ‘campeões de bilheteria’, depois do arroubo de público que provocou nos cinemas.

O outro prêmio de Barbie, Melhor Canção Original em Filme resumiu o tédio da cerimônia, com a modorrenta What Was I Made For, de Billie Eilish e Finneas — que tem lá fãs ardorosos.

É a síntese de um Globo de Ouro que atirou para todos os lados, atingiu alguns alvos e deixou até um Kevin Costner um tanto desconfortável no palco — como nós em casa.

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