A lista de pendências já começa a pipocar ao acordar, antes mesmo de eu abrir os olhos: - ir ao mercado - organizar as mochilas das crianças - ver se tem lanche pra pôr na lancheira - responder a e-mails de ontem - planejar o almoço – e ver o que vai ter pro jantar - ligar pra ver se está tudo bem com os pais - marcar consulta no médico. Etc, etc, etc.
Fazer, arrumar, montar, preparar, antecipar, não esquecer... E dar conta de tudo e do resto ANTES de começar o trabalho oficial. Mudam as idades e os endereços, mas as reclamações de mulheres que enfrentam dupla, tripla, às vezes quádrupla jornada são as mesmas. Por que me sinto tão cansada é pergunta recorrente. E a resposta, segundo especialistas, tem a ver com um trabalho invisível e não remunerado que muitas vezes não computamos, mas acaba impactando nosso dia a dia: a carga mental.
Resumindo, é esse trabalho de lembrar, organizar, preparar e decidir sobre a vida doméstica e familiar que cabe sobretudo às mulheres. Desde 2015, a palavra cansada no Google vem sendo mais buscada do que cansado. E a pesquisa por termos como cansada psicologicamente e cansada mentalmente bateu recorde desde o início da pandemia.
Ainda que muitos homens dividam afazeres de casa, bem mais do que antigamente, em geral a elas cabe determinar o que cada um terá de fazer. Não basta fazer o churrasco, tem de pensar se a data não coincidirá com o aniversário da sobrinha, se a casa está limpa, se pratos, copos e talheres serão suficientes. Não basta comprar carne e sal grosso. Tem de pensar na salsinha do vinagrete, em encomendar o pão, ver se a salada está lavada. Ou seja, nem nas supostas horas de lazer é fácil se desvincular desse trabalho de comando pouco valorizado, que costuma se multiplicar em casos de viagem ou mudanças na rotina, como as causadas pela pandemia de covid-19.
Se prolongada, a carga mental pode gerar problemas físicos e psicológicos. Ansiedade, tensão muscular, sono não reparador, problemas gástricos e angústia são alguns deles.
A solução para aliviar esse peso invisível depende de cada pessoa. Especialistas dizem, porém, que reconhecer seu impacto é o primeiro passo. Isso passa por falar sobre o assunto, debater papéis que cabem a homens e mulheres e refletir por que delegar às vezes é tão difícil. Se faltarem argumentos, vale lembrar de uma frase destacada pelo Fatigatis, projeto que discute estresse materno: “As tarefas invisíveis que fazemos só se tornam visíveis quando deixamos de fazê-las”.
*EDITORA NO ESTADÃO, PROFESSORA NA FAAP E MÃE DE GÊMEOS