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Shania Twain: ‘Minha infância me preparou para o desrespeito que enfrentei no início da carreira’

Cantora, considerada a ‘rainha da música country’, lançou disco ‘Queen Of Me’ em fevereiro e falou com o ‘Estadão’ sobre infância difícil, nova obra, hits como ‘Man! I Feel Like A Woman’ e planos de vir ao Brasil

Foto do author Gabriela Piva
Por Gabriela Piva
Entrevista comShania TwainCantora, compositora, artista de música pop e country, considerada a mais bem-sucedida de todos os tempos

Shania Twain, de 57 anos, não sabia que criaria hit atrás de hit e acumularia cinco Grammys quando começou sua carreira musical ainda na infância. Hoje, ela aproveita o respeito e admiração que conquistou no mercado, entre os colegas de profissão e os fãs, e lança seu sexto disco, Queen Of Me, em uma fase mais “confiante” da vida.

Para vender mais de 100 milhões de cópias mundialmente de seus discos e alcançar o patamar de cantora country mais bem-sucedida de todos os tempos, Shania encarou — e superou — um passado difícil. De origem humilde, ela se apresentava em bares no Canadá quando criança para arrecadar dinheiro e ajudar a família a sobreviver. Na mesma época, foi vítima de abuso sexual do padrasto e perdeu os pais aos 22 anos em um acidente de carro, quando teve que sustentar seus irmãos mais novos.

Shania Twain relembra produção para clipe icônico de 'Man! I Feel Like A Woman', uma de suas músicas de maior sucesso Foto: Louie Banks

Anos mais tarde, assinou um contrato com a Mercury Records e lançou seu primeiro disco, Shania Twain, que não foi muito bem nas paradas. O cenário, no entanto, mudou nos álbuns seguintes The Woman In Me e Come On Over, com sucessos como Any Man Of Mine, I Feel Like A Woman e You’re Still The One, e a transformou em um ícone musical.

Shania estava por trás de cada detalhe das suas criações, como a roupa ou a maquiagem que usaria, mas não era creditada por isso. Mesmo quebrando recordes e alcançando o estrelato, ela ainda se deparava com o machismo, a desconfiança e o desrespeito na indústria musical.

“Era um pouco difícil, mas a minha infância me preparou com a força mental que eu precisava. O desrespeito não me intimidou, não me fez querer desistir. Eu relevava e continuava. Até que, eventualmente, começaram a me respeitar, mas demorou muito tempo... O sucesso veio, mas não necessariamente o respeito”, disse Shania em entrevista por Zoom ao Estadão.

A artista pausou a carreira depois do lançamento do quarto disco, Up!, de 2002, para cuidar de seu único filho, Eja Lange, fruto de seu relacionamento com o produtor musical e ex-marido, Robert “Mutt” Lange. Naquele período, Shania também foi diagnosticada com doença de Lyme, que afetou suas cordas vocais.

Ela retomou o trabalho em 2012 com sua residência em Las Vegas, nos Estados Unidos. No entanto, só quebrou o hiato de um novo disco em 2017, quando lançou Now. Agora, ela voltou à indústria com músicas fortes e letras marcantes no álbum Queen Of Me, criado durante a pandemia da covid-19. Em 12 faixas, ela falou sobre amor próprio, sua internação pelo coronavírus, amor e amizade.

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Ao Estadão, a cantora comentou sobre a criação do álbum, relembrou as dificuldades no início da carreira, falou de hits marcantes, seu recente documentário, Shania Twain: Not Just A Girl, disponível na Netflix, perspectivas de retornar ao Brasil e até uma possível parceria com Avril Lavigne, que homenageou a artista no prêmio ACM Honors, de música country. Confira o bate-papo:

Shania Twain relembra dificuldades e machismo que enfrentou no início da carreira Foto: Louie Banks

É muito especial para mim podermos conversar no Dia Internacional da Mulher. Pensando nisso, minha primeira pergunta diz respeito à sua relação com as gravadoras nos seus primeiros quatro discos. Por exemplo, você teve algum problema com contrato, tentaram controlar o que você vestia ou algo parecido? Como foi para você?

Minha carreira musical, no que diz respeito a ser mulher, os desafios envolviam mais... A estética, a beleza das imagens e dos vídeos e o estilo. Tudo isso era muito importante para mim. Era como uma extensão da música. E era difícil ser levada a sério às vezes por causa da estética... Foi um desafio que achei frustrante, mas decidi que perseveraria na direção artística que tinha e visualizava, mesmo sabendo que isso me faria ser menos respeitada pelo meu talento. Acredito que, na época, ninguém percebia que eu conduzia a direção artística.

Como mulher, acho que eu não era reconhecida direito. O respeito só está vindo agora, o que é interessante por demorar muitos anos, mas está tudo bem! Eu me preocupava mais em entregar um bom trabalho e fazer tudo o mais bem feito possível.

Eu imagino! E você tem uma história de vida muito interessante... Imagino que a sua infância preparou você para enfrentar essas dificuldades...

Sim, a falta de respeito foi um pouco difícil, mas é verdade... Acredito que a minha infância me preparou com a força mental que eu precisava. Não fiquei intimidada, não tive vontade de desistir (da música). Ignorei e foquei na carreira até começarem a me respeitar, mas demorou muito tempo... O sucesso veio, mas não necessariamente o respeito.



É curioso que você mencionou a estética... Aqui no Brasil, você bombou com músicas como ‘Man! I Feel Like A Woman’. Sobre o clipe da música, que é icônico, como você se sente hoje em dia quando o assiste novamente?

Adoro o clipe! Acho que é muito lindo. Quando assisto ao vídeo, eu me lembro de todos os detalhes, de todas as decisões, como a maquiagem nos olhos, a cor do batom, todos os detalhes... Como a roupa deveria ser! Eu me envolvi em toda a decisão estética e na criação do estilo, como o tamanho da saia, das botas. Todos os detalhes que ninguém sabia que eu estava envolvida.

Quando olho para trás, aprecio todo o trabalho feito para o clipe ser lançado. É muito gratificante ver novamente!

Você sabia que o clipe se tornaria um marco na sua carreira?

Não! Eu nem imaginava que a música faria tanto sucesso. Não acho que você realmente consegue saber essas coisas. Assim, eu sabia que era uma canção forte e marcante, mas superou todas as minhas maiores expectativas. E o clipe tem o seu próprio sucesso, então foi muito extraordinário e uma linda surpresa. Esse era o meu objetivo e queria fazer qualquer coisa para conquistá-lo, mas não imaginava que seria uma música e um clipe tão bem-sucedidos.

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E quando você pensa sobre quem você é agora e quem você era naquela época, o que mudou e o que continuou igual?

Sabe, não mudou muita coisa além de que eu me sinto mais segura e confiante na vida agora do que eu me sentia. Por exemplo, a vida ficou muito mais tranquila em comparação com quando eu cantava em bares e me preocupava em pagar aluguel, aquecimento e comida (para a minha família). Não tenho as mesmas ansiedades e preocupações sobre coisas monetárias.

Criativamente, eu me sinto mais inspirada do que nunca porque crio só pelo amor de criar em vez criar para tentar conquistar algo. Não sinto mais esse tipo de pressão... E é uma sensação ótima escrever e compor música por amor em vez de compor pela pressão de que talvez você fracasse. Não tenho mais medo de fracassar. E não tenho como fracassar agora porque faço música por amor. É uma vitória!



Como essa confiança se reflete no seu novo disco, ‘Queen of Me’, na sua opinião?

Nossa, essa é uma boa pergunta! (risos). Queen Of Me é um bom exemplo da fase da vida em que estou agora. Me sinto muito confiante de mim mesma... Sabe, envelheço todos os dias, mas estou bem - isso não me preocupa, sabe? E afirmo tudo isso no álbum. Aproveito que sou um espírito livre e me expresso sem pedir desculpa. Celebro isso e a independência de ser uma pessoa, pensadora, mulher e artista.

Tomo posse do meu estado de espírito e me responsabilizo por isso, que foi o que inspirou Queen Of Me. Se sou responsável pelo meu espírito e humor, ninguém mais é. E fico feliz em ser responsável por isso!

Interessante! E, recentemente, você lançou o documentário ‘Shania Twain: Not Just A Girl’. Como você se sentiu assistindo-o? Como ele foi importante para você?

Foi um momento saudável e oportuno para compartilhar a história da minha carreira e vida. Documentei tudo porque, durante a pandemia, eu tive tempo para pensar em todo o material... Foi um período muito demandante, mas foi divertido. Eu achei que, quando relembrasse as situações mais dificeís da minha vida, ficaria melancólica e triste, mas, na verdade, fiquei feliz. Pensava: “Nossa! Eu realmente sobrevivi a muita coisa”.

Pensar nesse documentário foi empoderador e acabei achando graça, sabe, do espaço entre meus dentes e de todas as coisas que poderiam ter me deixado confortável (sic) anos atrás... Agora, eu me sinto grata por todas as experiências que tive, até as mais dolorosas. Foi bom olhar para trás e enxergar toda a minha evolução.

Você tem uma grande história de vida... Como selecionou o que entraria e o que não entraria no documentário?

Foi um desafio, mas graças a Deus meu marido (Fréderic Thiébaud) coletou todo o material durante horas, semanas e meses. Ele categorizou os acontecimentos da história e, literalmente, foi o pesquisador e bibliotecário de todo o histórico da minha carreira. Isso facilitou tanto o processo para mim que pude sentar e analisar as situações mais marcantes que queria compartilhar com meus fãs. A fase da produção demorou um tempo também... Como um time, tivemos que trabalhar muito mais uma vez para terminar o filme da forma mais refinada e interessante possível.

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O que eu quero dizer é: sim, tínhamos muito material. O documentário poderia ter durado horas e horas, mas todo mundo estaria dormindo no final. Então, foi difícil narrar os acontecimentos, mas talvez eu faça outro documentário em outro momento e com outro objetivo. Este, no caso, foi sobre minha evolução do começo (da carreira) até agora como mulher, sobre os desafios que encarei e as dificuldades que encontrei no meio do caminho. Inclusive, a de ser uma mulher, que eu não via como uma desvantagem.

E, agora, falando sobre o Brasil... Você estourou aqui na década de 1990, mas veio pela primeira vez só em 2018. Por que demorou tanto tempo para tocar aqui?

Eu sei! Não vou esperar tanto tempo novamente. Estou animada para voltar ao Brasil em algum momento e celebrar meus fãs aí. Eu acho que, quando tive meu filho, entrei em uma fase longa na qual era incapaz de cantar. Tive sete anos de problemas sérios na voz e decidi que focaria na maternidade. Deixei a carreira um pouco de lado, sabe?

Quando retomei, percebi: “Nossa, eu tenho muitos fãs no Brasil!”. Então, foi uma viagem muito divertida com direito a um show fabuloso. Estou animada para repetir tudo isso novamente e fazer uma viagem mais longa.

Talvez neste ano?

Não, não neste ano (ela ri e faz um gesto com as mãos para dizer que deve vir no próximo ano, em 2024).

Está bem! (risos) Minha última pergunta é sobre os seus próximos passos da sua carreira. Você já realizou muitos sonhos, mas você ainda tem algum sonho?

Tenho muitos! Quero começar a compartilhar minhas composições com novos artistas. Percebi que, desde quando voltei a cantar e gravar músicas, que inspirei muitos artistas da nova geração. Então, seria um prazer imenso poder escrever e ouvir a minha música sendo interpretada por eles. Seria um sonho!

Sei que você e a Avril Lavigne têm uma relação muito próxima. Costumava ouvir os covers que ela fazia de você. Já pensaram em fazer uma música juntas? (risos)

Seria uma ótima ideia! A gente não tem planos de uma colaboração ainda, mas é uma boa ideia mesmo. Vou falar para ela que você disse isso e a gente vê o que pode fazer! (risos).

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