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Brasil precisa entregar melhores resultados se quiser grau de investimento, diz Ana Paula Vescovi

Na avaliação da economista-chefe do banco Santander, sinalizações recentes das agências de classificação de risco são positivas e País deveria encaminhar reformas que melhorem o PIB

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Por Luiz Guilherme Gerbelli
Atualização:
Foto: Werther Santana/Estadão
Entrevista comAna Paula VescoviEconomista-chefe do banco Santander. Foi secretária do Tesouro

Na avaliação da economista-chefe do banco Santander, Ana Paula Vescovi, o Brasil precisa de reformas que melhorem o Produto Interno Bruto (PIB) potencial para voltar ao grupo de economias com grau de investimento — selo perdido pelo País em 2015. “Chegou a hora de a gente entregar melhores resultados fiscais e condições para o crescimento”, afirma.

Ex-secretária do Tesouro, ela vê como positivo o movimento das agências de classificação de risco. Primeiro, com a S&P que, em junho, alterou de estável para positiva a perspectiva da nota de crédito do Brasil, e, nesta quarta-feira, 26, pela Fitch, que melhorou o rating brasileiro de BB- para BB.

“O tempo (para voltar ao grau de investimento) só nós iremos (dizer), porque depende muito do que o Brasil vai fazer em termos de agenda de reformas e das respostas que daremos para as crises”, diz.

Brasil deveria perseguir volta ao grau de investimento, diz Ana Paula Vescovi Foto: WERTHER SANTANA

A seguir os principais trechos da entrevista ao Estadão.

Qual é a avaliação da sra. sobre a decisão da Fitch?

Foi extremamente positiva. O primeiro movimento começou com o outlook (positivo) da S&P e, hoje (quarta-feira), veio o upgrade da Fitch. Eu acho que a S&P deve responder com um upgrade também, porque os fundamentos são mais ou menos os mesmos e foram colocados de forma bem clara no comunicado da Fitch. O Brasil perdeu o grau de investimento em 2015 e, depois, outros downgrades vieram. O comunicado coloca um tom de qual o caminho a economia brasileira percorreu desde a perda do grau de investimento e dos (seguidos) downgrades e o que ocorreu que suscitaram esses fatos positivos.

Agora, pela Fitch, o Brasil está a duas notas do grau do investimento. É possível chegar lá?

Voltar ao grau de investimento não só é possível como desejável. É uma meta que o Brasil deveria perseguir e é uma nota importante para países que querem alçar uma condição de um crescimento mais estável e sustentável. O tempo só nós iremos (dizer), porque depende muito do que o Brasil vai fazer em termos de agenda de reformas e das respostas que daremos para as crises. O comunicado da Fitch deixou claro isso: crises podem ocorrer, mas o importante é avaliar quais são as respostas a esses eventos e quão resiliente o País estará. A resiliência da economia é importante e a construção de fatores para essa resiliência é mais ainda. E, sim, é um caminho bem viável.

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Mas é viável alcançar o grau de investimento com o arcabouço fiscal, que, de acordo com a avaliação de parte dos analistas, não deve reduzir a relação dívida/PIB?

Mais do que o arcabouço, agora, depende da execução. O Brasil tem de entregar. Chegou a hora de a gente entregar melhores resultados fiscais e condições para o crescimento. Traduzindo: são reformas que tragam um PIB potencial maior e de melhor qualidade. O caminho é bem conhecido, e o comunicado é muito claro. O Brasil precisa melhorar a sua condição fiscal, e o comunicado diz que estão sendo criadas condições para isso.

O governo fala em zerar o déficit no ano que vem e entregar um superávit de 1% do PIB em 2026. Ele vai conseguir alcançar as metas de primário?

Eu acho essas metas extremamente desafiadoras. São impossíveis? Não, mas muito desafiadoras, dado que tem um ajuste pelo lado das receitas. Antes de garantir a arrecadação, nós aumentamos a despesa. Esse aumento da despesa já vem dos últimos anos. Agora, temos uma agenda claramente passando pelo ajuste no lado da receita, mas numa economia que, ciclicamente, em função do aperto monetário para o controle inflacionário, está passando por uma desaceleração.

Força do setor externo brasileira compensa a fragilidade fiscal, diz economista-chefe do banco Santander Foto: Werther Santana/Estadão

O comunicado da Fitch também dá destaques para as reformas realizadas no País. Qual é a avaliação da sra. sobre esse conjunto de mudanças?

As reformas foram importantes para o País. Desde a crise de 2015 e 2016, o Brasil enfrentou reformas para poder se recuperar. Ele (o comunicado da Fitch) cita a reforma de pensões (da Previdência), a trabalhista e, agora, a reforma tributária. Cita a independência do Banco Central. Então acho que tem, sim, aspectos que são importantes para a sociedade entender que é fundamental esse esforço de debate, de discussão, para se achar consensos e encontrar caminhos.

Esse movimento das agências de classificação num período tão curto de governo surpreende?

Foram vários fatores que pavimentaram esse caminho. Na minha visão, as reformas foram um caminho muito importante, mas eu queria destacar outro fator que também tem sido importante para o Brasil. É a robustez do nosso setor externo. E ela está assentada, primeiro, nas exportações — dois terços da pauta exportadora já são commodities. Segundo, o câmbio flexível com um nível de reservas bem superior à média dos nossos pares, dos países emergentes. Terceiro, uma baixa dependência externa do financiamento da dívida pública brasileira. Os principais financiadores da dívida brasileira são os residentes e grande parte é financiada em reais. Nós também temos um déficit em transações correntes, mas largamente financiado por entrada de investimentos diretos estrangeiros. Esses elementos do nosso setor externo vão dando muita resiliência à economia brasileira. É uma construção importante para compensar, em alguma medida, a nossa maior fragilidade, que é a fiscal.

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