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Poder público segue iniciativa privada e investe em agenda ESG

Para especialistas, governos precisam atuar de forma mais efetiva não só na disseminação de informações, mas também na regulamentação e na punição a empresas que descumpram normas

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Por Beatriz Capirazi

A atenção dada a temas ambientais, sociais e de governança cresceu no mundo corporativo e estabeleceu o ESG como uma das principais preocupações dos executivos de grandes empresas.

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A explicação para isso, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, seria a cobrança da própria população, que busca consumir de empresas socialmente responsáveis. Agora, a agenda ESG parece ter se expandido também para o poder público.

A Prefeitura de São Paulo e a Secretaria Municipal de Relações Internacionais, por exemplo, lançaram a “Virada ODS” no Vale do Anhangabaú e na Praça das Artes, para conscientizar a população paulistana sobre os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU).

O evento, que acontecerá em 17 e 18 de junho, terá shows, atividades e a presença de especialistas como a co-fundadora do movimento Black Lives Matter, Ayo Tometi. Para disseminar termos como ESG e outros atrelados à agenda de sustentabilidade, a prefeitura equipou dez pontos movimentados da capital com banners e cartazes informativos. Além disso, a instituição deve distribuir 500 sacos de compostagem para engajar a população em ações que contribuam para a promoção do desenvolvimento sustentável.

A idealizadora da Virada ODS, a secretária de relações internacionais de São Paulo, Marta Suplicy, defende que uma das principais razões para a criação do programa foi não só colocar em prática, mas traduzir para a população o que é essa agenda sustentável ainda desconhecida.

Secretária de relações internacionais de São Paulo afirma que evento é uma forma de aproximar a agenda ESG da população. Foto: Gervásio Baptista/ Agência Brasil

Segundo o Dossiê ESG, pesquisa idealizada pelo Grupo Boticário em parceria com o Instituto Locomotiva, 66% dos brasileiros nunca ouviram falar sobre o tema. No entanto, ao terem a explicação do que é, 86% dos brasileiros dizem que consideram o conceito “importante” ou “muito importante”.

“Eles podem não entender o que é o termo, mas eles sabem o que é uma vida com dignidade, qualidade e sustentável. Isso é ODS, mas a população ainda não sabe. Quando você começa a traduzir, as pessoas estão muito interessadas na questão climática. Elas entendem que faz um calor intenso, frio quando não deveria”, afirma.

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O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, é da mesma opinião, destacando que trazer o pertencimento da população para a causa sustentável é essencial para o desenvolvimento da causa a longo prazo. “Todo mundo pratica cada uma das ODS no dia a dia, e muitas vezes sem querer. Acho muito importante que todos saibam que uma simples atitude faz parte de um movimento global que vai impactar num futuro melhor e numa vida melhor.”

Prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, destaca que a Virada ODS é uma forma de mostrar para a população que hábitos sustentáveis já fazem parte das suas rotinas.  Foto: Taba Benedicto/ Estadão

Outras iniciativas

Com 15 mil habitantes, Assaí, no Paraná, vem aplicando painéis de controle preditivos e prescritivos, já tradicionais de cidades grandes que adotam a tecnologia para tornar as cidades mais sustentáveis e inteligentes.

Através da plataforma GOVSUN, o município reúne um conjunto de atores públicos e privados, conduzindo a cidade para ser a 1ª cidade cashless do Brasil, eliminando o uso do dinheiro físico, diminuindo o consumo do papel e se tornando consequentemente mais sustentável.

Outro exemplo é o programa federal Cidades Sustentáveis, uma parceria do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação com o Instituto Ethos e a Rede Cidades, cujo objetivo é incentivar o poder público municipal a aderir à agenda com os objetivos para 2030, além de um conjunto de ferramentas que auxiliam para que essas localidades alcancem esse objetivo.

Entre os compromissos que compõem o programa estão realizar um diagnóstico, por parte da cidade, para avaliar a situação em relação aos ODS e o estabelecimento de um plano de metas. Atualmente, esse projeto conta com mais de 280 municípios signatários, em todas as regiões do Brasil.

Papel do governo no ESG

Especialistas destacam que, embora o poder público tenha começado a olhar para essa agenda para acompanhar a indústria privada, ele está dando apenas os seus primeiros passos. “Ainda falta uma priorização desse tema”, afirma o diretor-adjunto do Instituto Ethos, Felipe Saboya.

Para o especialista, um fator-chave para o atraso da pauta ESG no poder público foram os governos passados, que se envolveram em diversas polêmicas relacionadas a pautas como sustentabilidade e meio ambiente.

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“O governo federal anterior negligenciou sua responsabilidade. A Comissão Nacional para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) foi desfeita e não houve nenhuma iniciativa de monitoramento dos indicadores assumidos pelo Brasil frente à Organização das Nações Unidas (ONU).”

Cubos representandos as ODS da ONU montados na Prefeitura de São Paulo. Foto: Divulgação /Prefeitura de São Paulo

Para Saboya, diferentemente do governo federal, os estaduais passaram a atuar consistentemente em pautas de sustentabilidade e de cunho social. Mauricio Colombari, sócio da PwC, é da mesma opinião, destacando que temas como sustentabilidade sempre foram inerentes ao poder público, mas é preciso reforçar a regulamentação e a criação de políticas públicas.

“Isso ajudará não só a desenvolver e fortalecer a agenda, mas também a tratar das empresas que não tem boas práticas.”

Ele defende que o poder público adote uma atuação mais efetiva fortalecendo a legislação existente, além de combater o desmatamento, o garimpo ilegal e desenvolvendo ações que diminuam as emissões climáticas e o efeito estufa, por exemplo.

“É preciso um plano de ação para chegar lá. É necessário avaliar os temas que têm relação com o governo e desenvolvê-los. Já temos muitas leis, é preciso fiscalização e mecanismos para ter certeza que nossas leis estão sendo cumpridas”, afirma Colombari.

Saboya é da mesma opinião, mas destaca que o cenário de mudança só será efetivo, de fato, quando toda a população participar do debate. “Existe uma corresponsabilidade entre governos, empresas e sociedade civil”, explica, afirmando que o poder público tem uma função de indução de mudanças no mercado, já que é o maior contratante de empresas.

O especialista do Instituto Ethos ainda defende que o poder público tem como função criar comissões nacionais para reunir setores representativos da sociedade. Ele ainda exemplifica que outras atitudes práticas que iriam incentivar as empresas a se tornarem mais sustentáveis seria a isenção de impostos para empresas que cumpram com o ESG, a taxação das atividades insustentáveis e a institucionalização de comissões multipartites para coordenar os esforços da Agenda 2030.

“Uma ação interessante seria reconhecer publicamente as companhias que mais contribuem para a Agenda 2030, oferecendo selos e premiações”, afirma o especialista do Ethos, defendendo que neste sentido a atuação da sociedade civil é fundamental, tendo como papel central cobrar ações das empresas e também do governo.