Governo prepara ofensiva comercial nos países da Ásia

Ministério das Relações Exteriores escolhe sete áreas do continente para promover ''''um ataque empresarial''''

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Com pelo menos três anos de atraso, a política externa brasileira vai se voltar para a Ásia em 2008. A decisão tomada pelo Ministério das Relações Exteriores, com o devido aval do Palácio do Planalto, atende à ambição do governo Luiz Inácio Lula da Silva de ampliar o comércio e o investimento entre o Brasil e as economias dinâmicas e em ascensão da Ásia e de reforçar as relações diretas com essas nações no período final de seu mandato. Politicamente, essa decisão embute ainda o interesse do governo Lula de limar as tradicionais intermediações da Europa e dos Estados Unidos nesses contatos e de alavancar a posição do Brasil no contexto multilateral. Nessa estratégia, o livre comércio foi descartado como mecanismo para elevar as trocas comerciais, a interconexão de cadeias produtivas e os investimentos recíprocos. A razão é clara e oportunamente escamoteada pelo governo - a deficiência de capacitação tecnológica de parte da indústria brasileira, em comparação com concorrentes asiáticos. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, defende novas modalidades de aproximação, que se casam com a iniciativa já tomada pela área comercial do governo de estimular um ''''ataque empresarial'''' do Brasil à Ásia. Uma iniciativa que pode ser vista como uma alternativa à reivindicação de setores produtivos por proteção contra a concorrência asiática. ''''2008 será o ano da Ásia'''', destacou recentemente Amorim, animado com os resultados da reunião ministerial Ásia do Leste-América Latina (Focalal), que ocorreu nos dias 22 e 23, em Brasília. ''''As empresas brasileiras deveriam invadir a Ásia'''', receitou na semana passada, em Tóquio, o presidente da Agência de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), Alessandro Teixeira, que colocou a moda brasileira na linha de frente de uma estratégia de ataque ao continente. O Itamaraty trabalha com sete grandes focos na Ásia. No novo desenho estratégico do continente, que exclui o Oriente Médio e incorpora países da Oceania, estão Índia, China, Coréia do Sul, Japão, Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean), Austrália, Nova Zelândia, além das ex-repúblicas soviéticas. Os quatro primeiros alvos começaram a ser trabalhados entre 2004 e 2005, mas ainda requerem impulsos mais fortes do governo e do setor privado. O presidente Lula deverá reforçar o interesse no diálogo direto do Brasil com a Ásia por meio de visitas aos países do Sudeste do continente, em companhia de missões empresariais, no próximo ano. Essas viagens estavam inicialmente previstas para este semestre. Amorim deverá se antecipar ao roteiro presidencial e iniciar suas visitas ainda neste ano. ''''Não podemos mais nos dar ao luxo de não manter relações diretas com essas economias. A intermediação não é útil aos nossos interesses'''', defendeu o embaixador Roberto Jaguaribe, subsecretário de Assuntos Políticos 2 do Itamaraty. ''''Esse desafio não é tão óbvio assim. Muitas das nossas relações com a Ásia ainda são intermediadas pelos países cêntricos.'''' A Índia é um raro caso para o qual já se encontraram mecanismos próprios para o diálogo econômico-comercial e político: o Ibas (Fórum de Cooperação Índia-Brasil-África do Sul) e o acordo-quadro entre a Índia e o Mercosul, que balizou a negociação da redução de tarifas no comércio bilateral. Limitado a poucos itens, esse acerto deve ser alvo de negociações para a sua ampliação. Mas a discussão de um acordo de livre comércio não está na agenda brasileira. Amorim insiste em que o livre comércio nem sempre traz as soluções esperadas e diz que ''''há outros caminhos'''' a serem explorados para elevar o fluxo comercial e de investimentos com os países asiáticos - de acordos mais limitados à conclusão das obras das vias de ligação do Brasil a três saídas ao Pacífico. Além do caso da Índia, sua teoria aplica-se à Asean e ao Japão, país que reiterou várias vezes seu interesse de iniciar negociações com o Brasil, além da China. ''''Em um acordo, o mais provável é que o Japão queira extrair tudo na área industrial e de serviços e não ceder nada em agricultura'''', afirmou o chanceler na Câmara dos Deputados, na última quarta-feira. O ''''outro caminho'''' prescrito por Amorim para revitalizar as relações com o Japão, que minguaram desde o fim dos anos 70, está sustentado em três eixos: cooperação na área de etanol, transferência de tecnologia e de investimentos decorrentes da escolha do modelo japonês de TV Digital e um plano para a integração de cadeias industriais. Esses três pilares serão utilizados pelo Itamaraty para dar um envoltório pragmático à comemoração dos 100 anos da imigração japonesa, em 2008. RADAR Em sua alçada mais restrita, a Apex preferiu capitalizar ''''a boa reputação'''' do País no Japão e investiu na organização de um desfile de moda em Tóquio, na semana passada, o ''''Brazil Fashion Now'''', e em uma rodada de negócios. Foi uma experiência para estimular exportações de pequenas e médias empresas dos setores de confecção e de calçados que deverá ser levada a outros países da Ásia - até mesmo à China, que concorre com produtos mais baratos. O Itamaraty também espera os resultados de um estudo sobre planificação produtiva encomendado a um grupo de altos executivos de grandes companhias do Brasil e do Japão. De fato, a Ásia entrou no radar de grandes empresas brasileiras bem antes que no do governo. Esses foram os casos da China e do sudeste asiático, que hoje estão entre possíveis investidores na produção de commodities e em obras de infra-estrutura no Brasil, e mercados crescentes para produtos industrializados brasileiros.

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