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Ex-presidente do BC e sócio da Rio Bravo Investimentos

Opinião|Propensão ao consenso nas reuniões do Copom nada tem de acidental

Nosso sistema é o que melhor se adapta ao nosso passado em matéria de bagunça com a governança da moeda e ao risco de captura sobretudo do CMN, esse, sim, uma jabuticaba e um perigo

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Foto do author Gustavo H.B. Franco

O Copom foi criado em 1996, já faz mais de um quarto de século, e sua reunião mais recente, a de número 262, fez muito barulho. Não foi a primeira vez que, nesse colegiado, que sempre teve nove membros, se observou um 5 a 4. Foi a segunda. A primeira foi também recente, na reunião de número 256, de 2/08/2023.

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Os dois únicos casos de 5 a 4 na história do Copom foram, portanto, já na vigência do regime que alterou a sistemática dos mandatos dos dirigentes do Banco Central (LC179/2021). Os dois 5 a 4 ocorreram na parte da presidência de Roberto Campos Neto que fica no interior da presidência de Lula. Compreensível, ainda que inquietante.

Para entender o significado dessa divergência, é útil refletir sobre o que se passou nas 190 reuniões anteriores (a partir de 22/05/2002, a de número 71)¹: em apenas 28 dessas reuniões (14,7% dos casos) houve voto divergente, ou minoritário. Afora os dois casos recentes de quatro divergências, se observam 13 casos com três, 12 com duas e apenas um caso de um divergente solitário.

Nunca houve caso de divergência “de substância”, aquela mais profunda, na qual o minoritário queria ir na direção contrária do comitê. Foram sempre divergências de “dosagem” (0,25% a mais ou a menos, mas para o mesmo lado, por exemplo) ou de “timing”, ou seja, para apressar ou atrasar um ciclo que se confirma na reunião seguinte por meio de votos unânimes.

Sempre será possível melhorar alguma coisa, mas certamente seria um retrocesso substituir a colegialidade por um sistema de bancadas dentro do BC Foto: Wilton Junior/Estadão

Essa propensão ao consenso nada tem de acidental, e é bem mais que uma “cultura” da casa. A diretoria do BC é colegiada por força de lei (art. 3, LC179/2021), ou seja, toma decisões sempre por consenso e, por isso, possui uma única voz.

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Por transitividade, o Copom funciona como colegiado, pois, afinal, se confunde com a diretoria do BC, numa sessão especial, que funciona com a mesma dinâmica das outras reuniões, ainda que seja temática e traga chefes de departamento e seus números e estudos.

Uma diferença importante, entretanto, é a transparência: extensas atas transmitem inúmeras mensagens e, inclusive, registram os votos divergentes, funcionam como indicação de viés decisório.

Cada banco central faz de um jeito, em respeito à sua história. O nosso sistema é o que melhor se adapta ao nosso passado em matéria de bagunça com a governança da moeda e ao risco de captura sobretudo do CMN, esse, sim, uma jabuticaba e um perigo.

Sempre será possível melhorar alguma coisa, mas certamente seria um retrocesso substituir a colegialidade por um sistema de bancadas dentro do BC.

Opinião por Gustavo H.B. Franco

Ex-presidente do Banco Central e sócio da Rio Bravo Investimentos

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