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‘IVA brasileiro não segue os melhores padrões internacionais’; especialista explica por quê

O fato de ser ‘disfuncional’ o atual modelo de tributação, ponto de partida para a reforma, e a exposição a muitos lobbies afastam o País das melhores práticas, diz Melina Rocha

Por Diego Lazzaris

Para estudar o modelo do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), a consultora Melina Rocha se mudou para o Canadá. Agora, a mesma premissa está sendo aplicada ao Brasil, mas ainda depende da regulamentação no Congresso Nacional. A especialista, que na terça-feira, 23, participou do Fórum Estadão Think - A Indústria no Brasil Hoje e Amanhã, na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), afirma que a reforma tributária significa um avanço para o Brasil, mas o modelo de unificação de impostos que o País está adotando está aquém das melhores práticas internacionais.

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Consultora internacional para o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Melina observa que o potencial do IVA no Brasil é tolhido pelo atual modelo de tributação, ponto de partida para a reforma, por ser ‘disfuncional’, e pelo fato de as tentativas de simplificação de cobrança de impostos serem expostas a muitos lobbies.

“Os melhores modelos de IVA possuem uma alíquota única e não oferecem benefícios fiscais ou têm uma quantidade mínima de bens e produtos com alíquota reduzida ou zero”, explica. “Infelizmente, por razões políticas e devido ao ponto de partida do nosso sistema tributário atual, que é muito disfuncional e cheio de benefícios fiscais e alíquotas diferenciadas, foi politicamente difícil implementar um IVA conforme os melhores modelos internacionais.”

Melina Rocha, palestrante do Fórum Estadão Think 'A Indústria no Brasil Hoje e Amanhã, estudou no Canadá o modelo local de IVA Foto: Taba Benedicto/Estad

A especialista em IVA diz que o sistema atual possui muitos benefícios fiscais diferenciados, às vezes específicos para determinadas empresas, e não para setores ou produtos. “Esse histórico, conhecido como ‘path dependence’, torna politicamente desafiador estabelecer um IVA nos melhores moldes internacionais, devido à pressão de grupos de interesse para incluir certos produtos e serviços em alíquotas reduzidas ou zero”, explica.

Ela ainda acredita que o resultado final da reforma tributária seja muito positivo, pois tanto a Emenda Constitucional, promulgada em dezembro passado, quanto o Projeto de Lei Complementar (PLP), aprovado pela Câmara mais recentemente, em 10 de julho, mantiveram os pilares do modelo IVA. A maioria dos países que adotam o IVA possui alíquotas reduzidas, especialmente os modelos mais antigos, diz. “Além disso, a não cumulatividade plena foi garantida no projeto, assim como o princípio do destino”, destaca. “Portanto, os fundamentos essenciais do modelo IVA foram preservados nas discussões políticas, apesar das reduções de alíquotas e regimes diferenciados incorporados na reforma.”

Melina lembra que a avaliação quinquenal prevista na Emenda Constitucional será uma oportunidade para revisar esses regimes diferenciados. “Será possível analisar o impacto em termos de eficiência econômica, preço do produto final e consequências redistributivas”, observa. “Por exemplo, se constatar que a desoneração sobre a carne beneficia mais as famílias ricas do que as pobres, talvez não valha a pena manter essa desoneração.” Melina afirma que esse tipo de avaliação será crucial para revisar e possivelmente reduzir esses regimes diferenciados, aproximando-nos dos melhores modelos internacionais de IVA com uma alíquota única e o mínimo de exceções.

Segurança jurídica

Com a reforma, os cinco tributos atuais serão reunidos em apenas dois, e haverá também o Imposto Seletivo, que, de certa forma, substituirá o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). “Isso resultará em uma simplificação imensa, com uma legislação única e regras idênticas para os dois tributos”, afirma. “A segurança jurídica melhorará significativamente devido às regras idênticas desses dois tributos. Além disso, teremos apenas duas entidades para recolher os tributos: a Receita Federal e o Comitê Gestor.”

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A consultora lembra que haverá um período de adaptação, motivo pelo qual haverá uma transição de 2026 a 2033 para o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). A Contribuição Sobre Bens Serviços (CBS) substituirá o PIS e Cofins a partir de 2026, com um ano de teste com uma alíquota de 1%. “Esse período permitirá que as empresas se adaptem ao novo sistema e que a administração tributária implemente os sistemas necessários para começar a recolher a CBS e o IBS”, acrescenta. “Embora haja mudanças operacionais, acredito que todas serão positivas, simplificando significativamente a parte do setor produtivo no recolhimento dos tributos.”

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