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‘Montar fábrica não é única forma de catalisar revolução elétrica’, diz Co-CEO global da Volvo

Empresa pretende dobrar presença no Brasil e na América Latina em 2024 com chegada de novo veículo e aposta em carros premium 100% elétricos

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Por Beatriz Bulla
Atualização:


Foto: WERTHER SANTANA / ES
Entrevista comBjörn AnnwallCo-CEO da Volvo

A Volvo pretende dobrar presença no Brasil e na América Latina neste ano com sua aposta em carros 100% elétricos e novo lançamento de veículo a preço competitivo com marcas como Toyota e Jeep. O Co-CEO e CCO da Volvo global, Björn Annwall, afirma que a maneira de contribuir com o desenvolvimento regional e a agenda de descarbonização não é apenas montando fábrica no País.

“A maneira tradicional para as empresas automobilísticas tem sido criar uma fábrica para contratar operários para colocá-los no trabalho. E isso ainda é importante. Mas temos outra estratégia que consideramos igualmente importante. Uma delas é catalisar toda a revolução elétrica no Brasil investindo na infraestrutura de carregamento. E a segunda é realmente investir na criação de empregos reais de liderança em gestão altamente qualificados”, afirma Annwall, em entrevista ao Estadão, concedida durante sua passagem por São Paulo.

Em outubro do ano passado, o Brasil tornou-se sede da Volvo Car Global Importers Latam, responsável pelas operações da marca em toda a região, com o executivo Luis Rezende no comando. Rezende e o presidente da Volvo Car Brasil, Marcelo Godoy, também participaram da entrevista ao Estadão. Os executivos veem debate sobre carros híbridos como algo atrasado e dizem que público do segmento premium já busca carros 100% elétricos.

A Volvo passou a olhar com mais atenção para o Brasil e para a América Latina? Como a região entra na estratégia de aumentar a presença global da marca?

Björn Annwall: Acredito que o Brasil é parte central nisso. O time aqui tem feito um trabalho incrível em aumentar os negócios e da forma correta. Às vezes, as marcas premium tendem a ser muito elitistas e exclusivas. A abordagem premium da Volvo é muito mais inclusiva e calorosa. É uma marca aspiracional e claramente um carro premium é algo que nem todo mundo no Brasil pode pagar, mas também queremos ser uma marca muito atenciosa, sempre defendemos a segurança em tudo o que fazemos quando projetamos carros. E, ao longo do tempo, também evoluímos esse foco na segurança para fatores de sustentabilidade, para garantir que possamos ter este tipo de mobilidade também no futuro, porque temos um grande problema com as alterações climáticas no mundo. A indústria automobilística é uma grande parte desse problema. E precisamos ter certeza de que nos tornamos parte da solução. E a Volvo pode ajudar a liderar esse caminho. E é por isso que somos tão fundamentais em relação à eletrificação, porque a eletrificação é o caminho para uma indústria automóvel mais sustentável. Não é uma solução mágica que resolve todos os problemas do mundo, mas é um passo muito bom na direção certa.

Com qual cenário de crescimento de negócios a Volvo trabalha hoje, para o Brasil e região?

Björn Annwall: Vemos uma oportunidade fantástica para um maior crescimento. A América Latina apresentou um forte crescimento nos últimos anos. E vemos oportunidade para crescimento contínuo e também vemos forme contribuição em inovação por parte das equipes locais, que estão trazendo boas soluções sobre como navegar neste mercado. Tem muita coisa que a equipe de América Latina está fazendo que estamos exportando para outros países, as ideias. Portanto, é uma parte muito importante do nosso trabalho global.

Luis Rezende: Vamos passar de 20 mil carros para a ambição de 37 mil apenas na América Latina. Até o final deste ano, não venderemos mais nenhum carro híbrido ou a diesel, não mais. É totalmente eletrificado. Neste sentido, o EX30 será uma parte muito importante do crescimento, porque o preço deste carro que conseguimos alcançar será fantástico. Então vamos competir com o Toyota Corolla, Jeep Compass, com um carro premium 100% elétrico. Acho que conseguiremos alcançar famílias que antes não tinham dinheiro para comprar um carro premium. É totalmente novo na América Latina e por isso esse veículo vai ser tão importante.

Marcelo Godoy: No Brasil, a mentalidade dos consumidores tem mudado muito rápido. Por isso estamos tão confiantes.

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O atual governo brasileiro tem buscado estimular a indústria nacional e a produção de veículos híbridos ou elétricos no País. A Volvo planeja, nesse cenário, produzir no Brasil?

Björn Annwall: No momento, não há planos concretos para trazer a produção para o Brasil, acho que é sempre importante contribuirmos com a comunidade local em que estamos. Mas vemos um potencial maior para o Brasil exportar talentos de gestão, talentos de liderança, do que colocar a produção no Brasil. Então, agora estamos aproveitando mais a expertise do colarinho branco que existe no Brasil. É importante para a Volvo retribuir às comunidades em que atuamos. Você pode retribuir de diferentes maneiras. A maneira tradicional para as empresas automobilísticas tem sido criar uma fábrica para contratar operários para colocá-los no trabalho. E isso ainda é importante. Mas temos outra estratégia que consideramos igualmente importante. Uma delas é catalisar toda a revolução elétrica no Brasil investindo na infraestrutura de carregamento. E a segunda é realmente investir na criação de empregos reais de liderança em gestão altamente qualificados e na criação de oportunidades de carreira globais a partir de uma base e poder de venda.

Björn Annwall, co-CEO e CCO da Volvo global, em entrevista ao Estadão Foto: WERTHER SANTANA / ES

A falta de infraestrutura para carregar veículos elétricos têm contaminado o ambiente de negócios do segmento em outros países, como nos EUA. Qual o tamanho deste desafio, especialmente falando do Brasil e da América Latina?

Björn Annwall: É um desafio. A infraestrutura de carregamento no mundo não está onde deveria estar para que todas as indústrias automotivas mudem para o futuro elétrico. Mas não é um problema insolúvel. São necessários esforços para fazer os investimentos certos nas infraestruturas e também na produção de energia sem combustíveis fósseis. Em algumas partes do mundo, como no norte da Europa, isso está quase solucionado, porque os investimentos estão lá, as estações de carregamento estão lá. Em algumas partes da América Latina, não está lá. É por isso que nós, como a Volvo, investimos ativamente para construí-la e sermos um catalisador para a construção desta infraestrutura. Então, sim, ainda é um obstáculo, eu diria que é um obstáculo para realmente liberar o poder da eletrificação. Mas creio que estamos no bom caminho para resolver esse problema.

Luis Rezende: Temos parcerias com empresas no México, em Porto Rico, países da América Latina. Na Costa Rica o governo decidiu implementar (infraestrutura). Temos no Chile, Colômbia. O relevante é que Basicamente, 85% do tempo você vai carregar o carro em casa ou no escritório, você não carregará o veículo elétrico em todos os lugares, a menos que esteja na estrada por uma distância maior do que 400 quilômetros, por exemplo. Mas no Brasil temos feito algo diferente.

Fabricar (carros) aqui é uma maneira de ver as coisas. Outra forma de fazer as coisas é como a equipe no Brasil está implementando estações de recarga para todos. Quero dizer, de alguma forma, temos algumas marcas chinesas tendo sucesso na venda de carros porque elas sabem que podem carregar o carro em nossas estações de recarga. E estamos felizes com isso.

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Marcelo Godoy: No Brasil, a abordagem foi muito diferente. Aqui estamos construindo nossa própria infraestrutura. E desde o ano passado decidimos nos aprofundar cada vez mais nos carregadores. Acreditamos que aqui é obrigatório como empresa fazer isso. O mais importante até agora é que não é só para os clientes da Volvo, mas para todos os clientes dos carros eletrificados, porque precisamos ajudar a construir esse segmento no Brasil.

A Volvo aposta no veículo 100% elétrico, e não no híbrido?

Luis Rezende: Nós somos pró-eletrificação, estamos indo nessa direção. Sabemos que há discussões sobre etanol, mas decidimos como empresa ir para a eletrificação e vamos fazer o que precisar ser feito para que os consumidores sejam bem atendidos.

A Volvo tem produção na China. Gostaria de ouvir a avaliação da Volvo sobre o papel da China no investimento em veículos eléctricos.

Björn Annwall: Nós somos uma empresa global. Temos duas fábricas na Europa, uma nos Estados Unidos e três fábricas na China. Nossa estratégia claramente é garantir que temos investimentos espalhados de uma maneira inteligente. E também buscamos produzir o mais próximo possível de onde a demanda está, para precisar de menos transporte. O EX30, que foi lançado no Brasil mas chegará aos consumidores daqui a dois meses, é produzido em China e também vamos produzi-lo na Bélgica a partir do ano que vem.

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Vemos um influxo de novas marcas chinesas. Vamos ter algo como 30, 40 novas companhias de carro com veículos completamente elétricos. Isso é muito bom. O problema é que para ser uma companhia sustentável é preciso ter certa escala. E eles estão buscando como ter essa escala. E há uma enorme batalha de preços. Vai haver uma consolidação desse mercado durante os próximos três anos.

Você também vê que alguns fabricantes chineses estão começando a exportar para a Europa e para a América Latina. E, claramente, assim como algumas marcas japonesas tiveram muito sucesso, e algumas coreanas também, haverá algumas marcas chinesas que terão muito sucesso, não todos. Alguns, não todos, porque leva algum tempo para construir a marca e construir a infraestrutura de serviço para que os clientes possam confiar que seus carros estão sendo reparados, que irão obter as peças certas, leva tempo. Então isso vai acontecer.

Nós, globalmente, sempre tivemos uma centena de competidores, agora devemos ter uns 110 competidores. Não muda a cena. Somos focados em ser premium, somos elétricos premium. E acho que o influxo de mais carros elétricos em massa vindos de players chineses ajuda na implantação da infraestrutura de que falamos, mais pessoas investirão na infraestrutura de carregamento. Mas somos muito claros: somos marcas premium de carros elétricos. Até agora, não vimos um concorrente chinês forte que pudesse jogar esse jogo.

O Volvo EX30, que terá primeiras unidades entregues em abril de 2024, e empresa espera que contribua para expansão da presença no Brasil. Crédito: Volvo/Divulgação  Foto: Volvo/Divulgação


Quais os números de venda e crescimento esperados para o Brasil?

Marcelo Godoy: Nossa ambição de volume para o Brasil entre 2023 e 2024 é dobrar o volume. De maneira geral, vamos dobrar adicionando o EX30. Mas a gente ainda não entende o total potencial desse carro, porque se considerarmos o preço e o mercado, consideramos que temos um caminho bem grande de crescimento para esse veículo.

Luis Rezende: Na América Latina, o nosso cliente entende que a eletrificação é o futuro. Isso é muito claro para nós. O que precisaríamos que o Brasil saísse de 2% da população que pode comprar um Volvo para 10%. Não vai acontecer do dia para a noite. Então, o que a gente precisava era realmente de um novo produto que entrasse de uma nova forma. E foi muito interessante que o EX30 chegou corroborando toda nossa tese. Em 2018, falávamos que o híbrido era o primeiro passo do futuro. Então, todo mundo agora bate na tecla do futuro de híbrido. Agora, nós falamos que o elétrico o novo passo. Já temos quase 2.000 pedidos desse carro no Brasil e 7.000 na América Latina inteira. É uma onda super positiva e mostra que a nossa estratégia se deu muito acertada.

Se nós conseguimos ter toda essa atratividade de clientes, se chegou uma marca nova e conseguiu ter essa adesão por carros elétricos... não cremos que isso vai parar. O carro elétrico tem tantos mais benefícios do que um carro a combustão, seja ele etanol, diesel, qual for a tecnologia dentro do carro. Além disso, nenhuma tecnologia híbrida vai conseguir evitar que a poluição nas cidades continue. O lado positivo do Brasil é que eu vou reforçar são os clientes que estão começando a demandar os carros elétricos e a hora que vem uma força dos clientes, vai ter que mudar.

A volta do imposto de importação para elétricos teve algum efeito na estratégia de vocês?

Marcelo Godoy: Não muda nada a nossa estratégia. O Brasil continua sendo o país com grande ambição em volume e aí sim, a matriz fez o investimento. Ela acabou absorvendo o impacto grande esse ano e ano que vem. Não muda nada.

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