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O mecanismo de transmissão do afrouxamento quantitativo

Hoje afirma-se que o afrouxamento quantitativo (QE) está sendo um sucesso - e, é claro, a economia americana, que parecia caminhar para um marasmo deflacionário em meados do ano passado, ganhou força e confiança desde então. Mas por que motivo? Vejamos.

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Por Paul Krugman (The New York Times)
Atualização:

Antigamente, quando os dinossauros vagavam sobre a face da terra e os estudantes ainda aprendiam economia keynesiana, ouvia-se falar muito em "mecanismo de transmissão" monetária - ou seja, em como o Federal Reserve  ganhou força na economia real. Tanto a frase quanto o sujeito caíram em desuso - mas a questão continua sendo importante e, evidentemente, agora mais do que nunca.

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Ora, o que aprendemos naquela época foi que o mecanismo de transmissão funcionou em grande parte no mercado imobiliário. Por que motivo? Porque os investimentos mais antigos eram muito sensíveis aos juros, e os investimentos mais recentes nem tanto.

Se uma companhia está pensando em dotar seus empregados com smartphones que no prazo de três anos serão ultrapassados, o juro não influirá muito em sua decisão; e muitos investimentos corporativos são assim, talvez não tão extremos. Mas as casas duram muito tempo e não se tornam obsoletas (o que é válido até certo ponto para as estruturas empresariais, mas de uma forma mais limitada). Portanto, a política do Fed, agindo sobre os juros, em geral exerce este efeito principalmente no mercado imobiliário, no setor da habitação.

Mas não desta vez, porque o setor da habitação está profundamente deprimido e existe uma enorme quantidade de capacidade excedente.

Logo, se o QE2 funcionou, como foi que funcionou?

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Bom, se olharmos para as causas do crescimento do quarto trimestre, veremos o seguinte:

 Foto: Estadão

Trata-se basicamente de consumo e exportações líquidas. Agora, o número referente às exportações líquidas é engraçado: houve uma enorme queda das importações, o que provavelmente se deveu em grande parte à redução dos estoques, e não é sustentável.

No entanto, o comércio aparentemente está tendo uma contribuição positiva. Os investimentos não residenciais cresceram rapidamente, mas isto já acontecia antes que o QE2 fosse anunciado.

E o que estará impulsionando o consumo e as exportações líquidas? Vejamos abaixo:

 Foto: Estadão

A observação casual sugere que grande parte do crescimento dos gastos com o consumo se deu na faixa mais elevada, o que por sua vez sugere que o que o está impulsionando é uma alta do mercado acionário. E o dólar mais baixo claramente ajudou os exportadores e as empresas importadoras concorrentes.

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Se o QE funciona de fato sobre as ações e sobre o dólar, há outras implicações? Não tenho certeza - em uma sociedade extremamente endividada, pode-se hesitar diante de medidas que aumentam ainda mais o endividamento privado, mas se as ações são o fator principal, os consumidores que agora gastam mais não são os mesmos que têm problemas de endividamento - portanto, na realidade isto é bom. E, quanto ao dólar mais fraco, se os chineses e os brasileiros não gostam, eles têm toda a liberdade de deixar que suas moedas se valorizem.

De todo modo, esta é a minha opinião sobre o que aconteceu. Contudo, se o que eu disse estiver certo, não está absolutamente claro que a recuperação será autossustentada.

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