A bioeconomia está em evidência nos principais fóruns de discussão. É um tema atraente, relativamente incontroverso e versátil o suficiente para cativar públicos distintos, desde antropólogos de esquerda até investidores profissionais. No Brasil, sua vertente mais visível atende pelo nome de sociobio. Como o nome sugere, essa variante privilegia os aspectos social e ambiental da produção. Na prática, a sociobio enfatiza pequenos negócios de base comunitária, frequentemente estabelecidos em regiões próximas à floresta e portanto distante dos grandes centros comerciais.
A ênfase na sociobioeconomia baseia-se na visão de uma economia inclusiva e solidária, onde o ser humano produz em harmonia com a natureza tropical. Estas iniciativas têm contribuições importantes: além de garantir a subsistência de seus integrantes, elas capacitam uma nova geração de empreendedores locais. Além disso, os negócios mais bem estruturados ocupam nichos de mercado específicos e lucrativos e ajudam a educar consumidores sobre o valor dos atributos socioambientais.
O problema da sociobio é que o capitalismo é cruel. Pequenos negócios em localidades isoladas enfrentam enormes obstáculos para prosperar. Os custos operacionais são altos em todas as frentes. Esses negócios carecem de economia de escala ou escopo, seus insumos e maquinário precisam ser trazidos de longe, e o frete para levar seus produtos até o mercado também é elevado. Ainda mais: os gestores do negócio enfrentam enorme dificuldade para recrutar, capacitar e reter bons profissionais. Distantes dos consumidores, não conseguem antecipar ou mesmo acompanhar as tendências do mercado.

Nesse cenário, muitos desses empreendimentos acabam vendendo parte importante de sua produção nos mercados locais, inevitavelmente pequenos. Outros buscam clientes dispostos a pagar sobrepreço, mas esse nicho é restrito e as quantidades limitadas.
Na busca por alternativas mais rentáveis, algumas pessoas defendem a prospecção por compostos orgânicos que podem gerar royalties aos detentores do conhecimento tradicional. Talvez, um dia, alguém ganhe dinheiro com isso, mas as chances são limitadas. Outra alternativa envolve o mercado voluntário de créditos de carbono. Há bons motivos para acreditarmos que esse mercado vai crescer e esperamos que recupere sua estabilidade. Ainda assim, seus principais beneficiários serão os intermediários que facilitarão um número elevado de transações, e possivelmente os governos que administram extensas áreas preservadas. Os ganhos para pequenos proprietários e comunidades, embora importantes, dificilmente serão suficientes para transformar a economia regional.
O clima de euforia em torno dessas alternativas, porém, ofusca aquilo que o governador do Pará, Helder Barbalho, denominou “bioeconomia pé-no-chão”: a produção de bens tangíveis comercializados em mercados consolidados. Essa modalidade abrange alimentos como cacau, café conilon, açaí, pimenta-do-reino e frutas tropicais. Inclui produtos extrativos como a castanha, e pode incluir insumos para indústrias mais pesadas, como o dendê, a macaúba e outros produtos utilizados na fabricação de biocombustíveis, amido e fibras naturais. Dependendo das circunstâncias, pode incluir a madeira de áreas bem manejadas e até mesmo produtos agropecuários mais convencionais.
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A Amazônia já conta com diversos empreendedores atuando nesses segmentos mas seu número é insuficiente, e a maioria está estagnada, sem conseguir expandir sua atuação. Ao mesmo tempo, investidores no Brasil e no exterior estão buscando oportunidades para multiplicar seu capital, mas uma parte ínfima desse dinheiro aporta na Amazônia. E o Brasil possui também um sem número de empreendedores experientes, talentosos e arrojados que, em sua maioria, têm optado por buscar oportunidades em outros setores ou regiões.
A bioeconomia pé-no-chão não está conseguindo atrair esses fatores de produção. Em muitos casos, ela nem consta das discussões sobre desenvolvimento econômico regional. Enquanto debatemos intensamente a exploração de petróleo na foz do Amazonas, deixamos de enxergar uma riqueza inexplorada bem diante de nós, representada pelas extensas áreas que foram desmatadas e posteriormente abandonadas ou severamente subutilizadas.
Um plano de promoção da bioeconomia deve ter três vertentes principais: primeiro, precisamos fortalecer os negócios existentes, para que ganhem maior produtividade, capacidade gerencial e fôlego para expandir sua atuação.
Segundo, precisamos aceitar que o governo, muitas vezes sem intenção, cria obstáculos que sufocam esses negócios. Nem sempre esses obstáculos são grandes. Para quem é de fora, muitos podem parecer pequenos, quase como uma pedrinha. Mas, quando essa pedrinha está dentro do nosso sapato, ela ganha outra proporção. Precisamos de bons instrumentos para encontrar essas pedrinhas e removê-las de forma sistemática e com determinação.
Por fim, nossos diplomatas precisam atuar com criatividade e vigor para abrir mais espaço para nossos produtos da bioeconomia nos mercados internacionais. Há uma demanda crescente por produtos livres de desmatamento. O Brasil está excepcionalmente bem colocado para ser seu principal fornecedor.
Juntas, essas atividades podem posicionar o Brasil como líder da bioeconomia global.