Em um cenário em que ainda não está claro quando será o melhor momento para a retomada do contato social – e de atividades paralisadas em meio ao combate ao novo coronavírus –, estudo da Bain & Company mostra que a recuperação entre diferentes setores estará longe de ser uniforme. Com a pandemia, as prioridades da população mudaram, colocando pesados desafios para as companhias de bens de consumo. Compras de “pânico”, como desinfetantes, máscaras, refeições prontas e medicamentos, ganharam espaço, enquanto laticínios, bebidas alcoólicas e produtos de luxo tiveram recuo.
Nas últimas semanas, a demanda por atividades como comida fora de casa, passagens aéreas, turismo e eventos praticamente se extinguiu. Em um cenário em que o medo deve predominar, a tendência é que segmentos que dependam de concentração de pessoas enfrentem desafios de longo prazo, enquanto atividades virtuais poderão preservar parte do “boom” que registraram na crise.
Os restaurantes hoje só operam com delivery e, no Brasil, as companhias aéreas reduziram o tráfego em cerca de 90%. No sentido contrário, ferramentas de trabalho e ensino a distância viram a demanda explodir. A ferramenta de videoconferência Zoom, por exemplo, viu sua média de usuários subir 340% desde o início do isolamento.
Para Luciana Batista, sócia da Bain & Company, esses dois grupos se posicionam em polos opostos. Enquanto as ferramentas online – grupo que também inclui cursos e streaming de vídeo e games – ganharam força e devem se fortalecer no médio e longo prazos, atividades que dependem da reunião de pessoas – grupo que também inclui restaurantes, eventos e turismo – vão demorar mais para ganhar fôlego. Quanto maior a necessidade de aglomerações, provavelmente mais difícil a recuperação. “Para essas atividades vai ser difícil voltar ao antigo normal.”
Estoques. A venda de gêneros alimentícios e de produtos de limpeza nos supermercados teve forte alta à medida que, amedrontadas, as pessoas viram necessidade de fazer estoques para a crise. Para esses itens de primeira necessidade, a tendência é que haja um retorno das vendas aos patamares anteriores após a crise, diz a especialista.
Já produtos de consumo não essenciais – como eletrodomésticos, produtos de beleza, roupas e calçados –, que sofreram neste primeiro momento, poderão ter um período de bonança. “Esses bens podem se beneficiar do ‘consumo de vingança’”, diz o estudo da Bain, referindo-se à necessidade de os clientes “compensarem” o consumo represado na crise.
Professora de uma escola particular de São Paulo, Luciana Vidal, de 44 anos, passou a comprar mais carnes congeladas e produtos de limpeza para higienização da casa. “Mas não corri para fazer grandes estoques. Passamos a ir a supermercados do bairro, comprando verduras e legumes para cozinhar em casa.” Ela e seu marido, o empresário de marketing de incentivo Fábio Goulart Ambrózio, de 40 anos, estão trabalhando em home office. Mas as prioridades da família mudaram. “Roupas e sapatos estão fora da minha lista.”
A família sente a falta da rotina, mas entende que o isolamento social é a melhor estratégia para evitar a contaminação. “É óbvio que a gente tem vontade de sair, dar uma volta no shopping. A Páscoa está logo aí e não podemos ir a uma loja comprar chocolate.”
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