Tarifa sobre aço e alumínio é só o início de uma grande guerra comercial, dizem especialistas

Retaliações e contrapartidas de países afetados pelas taxas americanas aumentam o risco de uma escalada protecionista; União Europeia e Canadá já falam em uma eventual ‘resposta firme’

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Por Redação
Atualização:

A taxação de 25% para as importações de aço e alumínio pelos Estados Unidos, anunciada na segunda-feira, 10, pelo presidente Donald Trump, é apenas o início de uma grande guerra comercial no mundo. A China já adotou contrapartidas em relação à tarifa de 10% sobre seus produtos; o México e o Canadá aguardam negociações, mas já anunciaram que também vão retrucar; e a União Europeia prometeu retaliações firmes e proporcionais. O Brasil ainda estuda qual resposta dará sobre as tarifas do aço e alumínio.

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O banco alemão Commerzbank alerta que contramedidas podem levar a uma escalada da disputa tarifária. Além disso, lembra que Trump ameaça aplicar tarifas a outros produtos como veículos, medicamentos e semicondutores, e planeja implementar tarifas recíprocas. Portanto, isso é só o começo, diz a instituição alemã.

O estrategista-chefe da RB Investimentos, Gustavo Cruz, tem a mesma percepção: “É difícil imaginar que a tarifa siderúrgica não vai ser definitiva. É diferente do caso do Canadá e do México, em que houve recuo temporário das tarifas. Siderurgia não é um setor que estava brilhando. Estava desgastado”.

Ele lembra que as empresas do setor já enfrentam nos últimos anos desafios por causa do dumping (exportação de produto a preço mais baixo do que no mercado interno) adotado pela China. Nos EUA, mesmo durante o governo de Joe Biden, já havia uma pressão das siderúrgicas para uma resposta mais dura em termos tarifários.

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Decisão de Donald Trump de impor tarifas sobre vários produtos e países aumenta movimento protecionista Foto: Alex Brandon/AP

Para as siderúrgicas brasileiras, Cruz corrobora com a tese de que a Gerdau pode se beneficiar. O fato de a companhia ter unidades produtoras nos Estados Unidos deve blindá-la do tarifaço de Trump, argumenta. Não é este o caso, porém, de outros dois importantes players do setor: CSN e Usiminas. “A saída seria uma diversificação de mercados, ir para mercados europeus e asiáticos”, diz.

O ministro da Economia do México, Marcelo Ebrard, criticou a decisão do governo dos Estados Unidos de impor tarifas sobre o aço e o alumínio. Segundo Ebrard, a medida é injustificada e poderá prejudicar a economia de ambos os países. Ele ressaltou que a balança comercial do setor siderúrgico favorece os Estados Unidos, destacando que o México é o maior comprador de produtos siderúrgicos norte-americanos, absorvendo 52% das exportações globais do setor.

Em coletiva de imprensa ao lado da presidente do México, Claudia Sheinbaum, o ministro destacou que a decisão pode gerar um efeito cascata negativo no comércio internacional. “Imagine se todo mundo colocar oito vezes uma tarifa na fabricação de um veículo: não tem sentido”, declarou.

Canadá e União Europeia citam resposta ‘firme’

O primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, disse nesta terça-feira, 11, que conversará com outros aliados ocidentais sobre uma resposta “firme e clara” à tarifa sobre todas as importações de aço e alumínio. Em Paris, durante conferência sobre inteligência artificial (IA), o premiê afirmou que a taxa sobre metais do Canadá é “totalmente injustificada”, já que o aço e o alumínio canadenses são enviados para os EUA para serem usados na produção de equipamentos militares, navios, veículos e outros bens manufaturados.

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O Canadá é o maior vendedor estrangeiro de aço e alumínio para os EUA. “Trabalharemos com a administração americana nas próximas semanas para destacar os impactos negativos para os americanos e canadenses dessas tarifas inaceitáveis. Também trabalharemos com nossos parceiros e amigos internacionais”, disse Trudeau, que deixará o cargo de primeiro-ministro no próximo mês. “E, se for necessário, nossa resposta, é claro, será firme e clara.”

De mesma forma, a presidente da Comissão Europeia, braço executivo da União Europeia, Ursula von der Leyen, prometeu que as tarifas dos EUA sobre aço e alumínio “não ficarão sem resposta”, acrescentando que elas desencadearão retaliações “firmes e proporcionais”.

“A UE agirá para proteger seus interesses econômicos”, afirmou von der Leyen, em declaração. “Tarifas são impostos — ruins para os negócios, piores para os consumidores.”

Na Alemanha, lar da maior economia da UE, o chanceler Olaf Scholz disse ao parlamento que “se os EUA não nos deixarem outra escolha, então a União Europeia reagirá unida”, acrescentando que “no final das contas, as guerras comerciais sempre custam prosperidade a ambos os lados”.

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O Brasil, por enquanto, na defensiva

No Brasil, segundo maior fornecedor de aço dos Estados Unidos, o governo ainda avalia a situação e de que forma vai reagir às taxas impostas por Trump. Representantes das empresas siderúrgicas estiveram em Brasília para discutir medidas contra o tarifaço.

O professor de Ciências Econômicas da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), Hugo Garbe, diz num artigo publicado nesta terça-feira, 11, que as consequências para o Brasil podem ser significativas já que o setor siderúrgico brasileiro exporta uma parte relevante de sua produção para os Estados Unidos, e a imposição de tarifas pode reduzir essa demanda.

“Com menos exportações, empresas do setor podem enfrentar dificuldades financeiras, afetando empregos e investimentos. Além disso, se o Brasil decidir retaliar com tarifas sobre produtos americanos, pode haver impactos em outras cadeias produtivas que dependem do comércio bilateral.”

A reação de outros países, como é esperado, aumenta o risco de uma “escalada protecionista, em que medidas e contramedidas dificultam o comércio internacional”, destaca o professor.

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No horizonte, mais produtos taxados

De acordo com a BMI Fitch Solutions, especializada em análises econômicas,Trump espera que as tarifas criem o incentivo para produzir mais nos EUA, aumentando a produção industrial e os empregos, mas será um desafio aumentar significativamente a produção.

O setor de alumínio dos EUA não é competitivo em nível global, uma vez que os custos são muito altos, impulsionados por eletricidade cara e regulamentações ambientais rigorosas, diz a BMI Fitch.

“Considerando os comentários de Trump nas últimas semanas, esperamos que mais tarifas sejam implementadas sobre produtos que ele identificou anteriormente, incluindo certos medicamentos, cobre e chips de computador”, diz a consultoria. “Isso significa que economias como a do Chile, que responde por cerca de 6% das importações de cobre dos EUA, poderão ser atingidas, assim como os principais exportadores de semicondutores, como Taiwan, China, Vietnã, Tailândia, Malásia, Coreia, entre outros, já que eles respondem por mais de 70% de todas as importações de semicondutores e circuitos integrados para os EUA.”

EUA dependem de montadoras do México

A agência de classificação de riscos Fitch Rating observa que “ainda não está claro o desfecho das negociações entre os EUA, México e Canadá, nem até que ponto os EUA estão dispostos a revisar suas propostas”. A agência observa que as tarifas de 25% sobre veículos do México seriam as mais prejudiciais, devido à forte dependência da indústria automotiva dos EUA da produção mexicana, enquanto as taxas sobre o Canadá podem ter impacto relevante, mas menor. As tarifas adicionais à China devem ter efeito limitado, pois o setor já reduziu sua dependência das cadeias chinesas, acrescenta a Fitch.

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A agência aponta que o impacto dessas tarifas pode variar de acordo com o nível de exposição de cada montadora às exportações mexicanas e canadenses, assim como pela capacidade de cada empresa de repassar os custos aos consumidores, reduzir despesas, aumentar preços de outros modelos para diluir os custos das tarifas, redirecionar embarques ou implementar outras medidas compensatórias.

Honda, General Motors, Nissan e Stellantis estão entre as mais vulneráveis, dada a alta participação de veículos importados do México e do Canadá em suas vendas, segundo a Fitch. Segundo a agência de risco, empresas com maior margem de segurança em suas classificações de crédito terão mais flexibilidade para absorver os impactos. “As perspectivas negativas da Nissan e da Stellantis refletem o fraco desempenho na América do Norte, que já havia impactado a lucratividade e os fluxos de caixa antes mesmo do anúncio das tarifas”, afirmou a Fitch.

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