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Não cortar Juliana tirou chance de medalha de Larissa, Ana Paula e do Brasil

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Por Edmundo Leite
Atualização:

Um discurso há tempos consagrado é que a profissionalização é fundamental para o sucesso no esporte, seja em que modalidade for. Não são poucas as ocasiões em que atletas, treinadores e dirigentes de clubes e federações costumam lustrar suas declarações em entrevistas, artigos e palestras de motivação generosamente remuneradas com exaltação ao profissionalismo. Na maioria das vezes não passa de discurso vazio.

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A eliminação de Larissa e Ana Paula do torneio olímpico de vôlei de praia é a mais recente demonstração que a distância entre o discurso e a prática é tão grande quanto os milhares de quilômetros que separam Brasil e China.

A essa altura qualquer um que acompanhou minimamente o noticiário olímpico sabe da história da dupla, formada às pressas na véspera do início dos Jogos, após Juliana, a parceira original de Larissa, jogar a toalha - já em Pequim - e admitir não ter condições de disputar a competição.

Seria uma história louvável, se a lesão no ligamento cruzado anterior do joelho direito de Juliana tivesse acontecido nos últimos dias antes dos Jogos, quando as duas - atuais campeãs mundiais - já treinavam em areias chinesas. Mas como todo mundo também já está cansado de saber, a lesão aconteceu em 18 de junho, 51 dias antes da estréia da dupla em Pequim.

Apesar de qualquer peladeiro de futebol que joga com a turma de amigos saber que uma lesão desse tipo - freqüente em atividades esportivas - demanda um longo tempo de recuperação, a comissão técnica e a Confederação Brasileira de Vôlei optou por tentar um processo de recuperação em tempo recorde de Juliana. A cirurgia, considerada mais eficaz para casos de atletas profissionais, significaria o corte da jogadora, pois a recuperação exige um longo período de tratamento pós-operatório.

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Contrariando as recomendações médicas usuais de repouso e não se praticar atividades esportivas de alto nível no período de recuperação, insistiram na recuperação por tratamento fisioterápico, que é recomendado a quem não exerce atividades esportivas regurares.

"... A prática do esporte com um joelho instável (na presença de uma ruptura do LCA) é desaconselhada. O tratamento conservador (não cirúrgico) tem seu lugar para pacientes mais idosos sem ambição de praticar esportes. ..."

"... Os esportes de contato (futebol, rugby, handbol, etc.) são praticados de 6 a 9 meses após a cirurgia ..."

"... Aos esportistas que apresentam uma lesão do ligamento cruzado anterior e queiram continuar a praticar esportes de contato pivô, é indicada a reconstrução cirúrgica do LCA: a prática esportiva sem o LCA, pode levar a uma lesão meniscal e desgaste cartilaginoso, acelerando o aparecimento de artrose ..." (www.orthopedie.com)

"... O tratamento conservador deve ser considerado para aqueles que apresentem lesão isolada do LCA total ou parcial de bainha fechada e que se proponham a modificar suas atividades esportivas passando a evitar esportes que facilitem o surgimento de dor , edema e falseios ..."

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"... É sabido que todas as atividades esportivas que envolvem saltos, giros, mudanças bruscas de direção e velocidade levam grande stress ao joelho com deficiência de LCA, proporcionando com isso chances de aparecimento dos falseios de repetição. A mudança de hábitos esportivos competitivos ou não , é talvez o fator mais importante no bom resultado do tratamento conservador da lesão de LCA. Deve-se estimular a pratica de atividades esportivas de baixo risco para o joelho ..."

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"... A prática rotineira e segura destas modalidades não agressivas ao joelho, associada a uma atividade diária e profissional sem grande demanda da articulação, levará certamente a manutenção das condições musculares e proprioceptivas ideais adquiridas com o tratamento conservador ..."

"... Pacientes capazes de mudar seus hábitos esportivos, que não desempenham atividades profissionais de risco para o joelho ou aqueles que não apresentam episódios de dor, edema e falseios nas atividades de vida diária, são candidatos ao método apresentado, reforçando o conceito que existe um lugar para o tratamento conservador das lesões do LCA ..." (www.grupodojoelho.com.br)

Embora seja possível entender o empenho de Juliana em tentar se recuperar velozmente, o que só a dignifica, não dá para aceitar a postura que técnicos, médicos e dirigentes - os profissionais que deveriam orientar e cuidar da atleta - tiveram nesse caso. (Já de volta ao Brasil, Juliana foi operada na última quinta-feira. Segundo os médicos, a cirurgia foi um sucesso.)

Além de tomarem uma decisão que pode causar danos maiores ao corpo da jogadora, impediram que Larissa tivesse pelo menos 45 dias de treino para se entrosar com uma nova parceira de alto nível, como é Ana Paula, apesar das diferenças pessoais que as duas admitiram ter e que tentaram superar na luta por uma medalha.

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Ao não cortar Juliana logo após o diagnóstico da lesão, os dirigentes da Confederação Brasileira de Vôlei mostraram que o profissionalismo passou longe desse caso. E tiraram de Larissa, Ana Paula e do Brasil uma boa chance de medalha.

PS.: Registre-se também que a maior parte da imprensa não cumpriu o seu papel de informar corretamente qual era a real situação de Juliana. Na TV, principalmente, as matérias eram sempre emotivas, naquele tom de exaltação a uma guerreira que luta contra o próprio corpo por uma medalha.

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