A ‘bolha’ no Brasil vai estourar: falta de fair play financeiro deve trazer consequências

‘Estadão’ procura os 20 clubes da Série A para saber se são a favor do fair play no futebol brasileiro e como defendem a implementação dessa medida

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Atualização:

Medida que poderia ajudar a equilibrar o futebol brasileiro, o fair play financeiro não avançou no Brasil, mas o debate segue intenso. É comum ver dirigentes de alguns dos principais times da primeira divisão comentando o assunto, especialmente após os altos gastos dos clubes na atual janela de transferências. O Estadão entrou em contato com os 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro para saber o posicionamento de cada um sobre o assunto.

Questionados se são a favor da implementação do fair play financeiro no Brasil, todos os clubes ouvidos pela reportagem afirmaram ser favoráveis a uma regulamentação sobre o tema no País. Ao serem perguntados de que maneira a regra deveria aplicada, as respostas foram diversas. Algumas da hipóteses citadas foram limitar gastos de maneira proporcional à receita, veto à inscrição e contratação de atletas como punição a pendências financeiras, além de um estudo para a implementação de um regulamento condizente com o mercado brasileiro. Bahia, São Paulo e Vasco foram os únicos a não responder. O Botafogo respondeu um dia depois de a reportagem ter sido publicada.

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Uma das cartolas mais poderosas do País, Leila Pereira, presidente do Palmeiras, defende veemência a regulamentação. “Se depender dos clubes, não vamos ter isso (regulamentação), porque vários agem de maneira irresponsável. Dirigentes deixam dívidas para os seus sucessores e não acontece nada. Luto para que tenhamos mais investimentos no nosso futebol. Sonho para que venha a regulamentação, o fair play financeiro para que dirigentes mal-intencionados sejam punidos”, disse ela recentemente.

Times da primeira divisão já movimentaram aproximadamente R$ 371,6 milhões de euros (R$ 2,2 bi na cotação atual) em transferências, maior valor já registrado na história do Brasil. Paulo Bracks, diretor executivo do Atlético-MG, demonstrou preocupação com o aumento das cifras e fez uma alerta: “a bolha vai estourar”.

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Palmeiras e Corinthians adotaram posturas diferentes na janela de transferências.  Foto: Alex Silva/Estadão

“Há clubes fazendo investimentos que não têm condições. E pela falta de fair play financeiro, o papel aceita tudo. Mas essa bolha vai estourar. E o Atlético vai estar pronto quando essa bolha estourar. Os investimentos estão acima de um nível que se esperava para o futebol brasileiro, os salários estão acima do que se esperava no futebol brasileiro e o mercado brasileiro entre clubes tem gerado negociações que até três, cinco anos atrás eram impensáveis”, comentou o dirigente, em entrevista coletiva.

O economista Cesar Grafietti, referência no País sobre o tema, concorda que há uma bolha no futebol nacional e que ela irá estourar em algum momento. Ele destaca que o movimento acontece porque naturalmente uns clubes podem gastar mais do que outros, enquanto os demais gozam de incentivo adicional pela entrada de dinheiro extra incomum por patrocínios de casa de aposta, além de algumas SAFs que estão aportando valores sem lastro para deixar equipes competitivas.

“A bolha vai estourar, isso é fato”, sentencia o economista. “Já enxergo que os números de 2024 serão muito ruins do ponto de vista de resultado e dívida, e 2025 será ainda pior. Não adianta todo mundo gastar o que não tem porque o resultado será sempre prejuízo e aumento de dívida. O que Flamengo e Palmeiras fazem é justificável. O Bahia também, porque é do Grupo City, que tem muito dinheiro. Os outros, não, porque ninguém tem todo esse dinheiro. Só que eles se sentem na obrigação de ‘correr’ para acompanhar esses que têm mais condição”, explica.

Quando eu vejo Corinthians, São Paulo, mesmo o Cruzeiro, que é SAF, e o próprio Atlético-MG, fazendo esses movimentos, eu não consigo ver lógica financeira. Eles fazem um movimento de reação para competir com os mais organizados que estão um passo à frente. O Botafogo mesmo não tinha condição de contratar jogadores como fez e foi campeão. Então ele é mais um incentivador do crescimento da bolha pelo lado ruim.

Cesar Grafietti, economista

Em resumo, o fair play financeiro tem como objetivo manter “o equilíbrio da indústria do futebol por meio da saúde financeira dos clubes”, explica Grafietti. Boas práticas incluem não atrasar o pagamento de salários e encargos trabalhistas, recolher impostos em dia e evitar o acúmulo desenfreado de dívidas. A ideia nasceu há cerca de 15 na Europa, após a Uefa ver clubes de maior investimento ficarem em débito com outros mais modestos, que, por sua vez, não conseguiam manter suas operações estáveis.

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Tem um jogador brasileiro de clube médio que está ganhando como um clube grande da Itália, da França, da Alemanha, ou mesmo da Espanha. Não faz nenhum sentido.

Cesar Grafietti, economista

Sem citar nomes, Grafietti diz que são irresponsáveis os dirigentes que contratam atletas com salário alto, de mais de R$ 1 milhão, e que não estariam em nenhum top 100 de receita em ligas mais fortes da Europa. “É um sinal claro de que perdemos a mão e estamos gastando demais com jogadores que não têm espaço em mercados que teriam a capacidade de pagar”.

Limite de gastos

Existem diferentes modelos de fair play financeiro aplicados nas principais ligas da Europa. Recentemente, Everton e Nottingham Forest foram punidos com perdas de pontos na Premier League por apresentarem déficits financeiros superiores ao permitido pela liga inglesa em um período de três anos. Na Espanha, LaLiga segue um caminho parecido com o da Uefa, limitando 45% dos gastos da receita com salários, e planeja aumentar a margem para 70% na temporada 2025/26.

Grafietti diz que existem diferentes condições e características entre os clubes no Brasil pelo fato de um modelo de fair play financeiro não ter sido implementado anteriormente. Assim, ele aponta que o controle de gastos em relação à receita deva ser um dos pilares do regulamento, mas destaca que a limitação dos gastos poderia estar associado a um controle das dívidas.

“Porque eu preciso limitar o Fortaleza, que é um clube praticamente sem dívidas, a gastar 70%, 80% da sua receita se ele não tem mais nenhuma obrigação? Ele poderia gastar até 95% se suas dívidas estivessem zeradas ou próximas disso. Já o Corinthians, que tem R$ 2,4 bilhões de dívida, eu não posso deixar ele gastar 70% da receita porque ainda vão ter as dívidas para cobrir. Se ele não vai cobrir, elas vão continuar crescendo e gerando problemas”, sublinha.

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“É necessário um modelo que combine as duas coisas, pelo menos por algum tempo, até que a gente consiga chegar daqui cinco, seis anos, com um cenário em que as dívidas estão mais equacionadas, os times podem ter mais liberdade de gasto e aí, sim, se passa a controlar basicamente os gastos”, completa.

Há quem acredite que o investimento no futebol por meio do dinheiro de um terceiros, como acontece com as SAFs, ferem o fair play financeiro. Sobre isto, o especialista faz uma ponderação.

“Quem entra em uma neste negócio de SAF, geralmente está comprando um ativo desvalorizado, que precisa de investimento. Não me parece fazer sentido neste primeiro momento limitar os gastos de Botafogo e Cruzeiro, por exemplo, em relação a suas receitas porque até para elas crescerem, o clube não consegue ter uma mudança necessária. É necessário ter flexibilidade para aceitar que algum dinheiro extra entre para garantir que as contas estejam em dia.”

Disputas internas

Assunto antigo no futebol nacional, o fair play financeiro voltou à pauta após os altos investimentos do Botafogo, campeão brasileiro e da Libertadores em 2024, incomodarem rivais. O time carioca tem SAF controlada pela Eagle Holding, rede multiclubes do bilionário americano John Textor, que também administra o francês Lyon. A principal queixa é de que o time alvinegro carioca não teria condições de realizar movimentações arrojadas no mercado da bola somente com a própria arrecadação.

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Segundo a edição 2024 do relatório Convocados, o Botafogo apresentou receita de R$ 355 milhões em 2023 e gastos de R$ 444 milhões. No ano passado, a SAF alvinegra investiu impressionantes R$ 373,2 milhões somando as duas janelas de transferências, com destaque para as contratações de Thiago Almada (R$137,4 milhões) e Luiz Henrique (R$ 106,6 milhões), as duas mais caras da história do futebol brasileiro. O clube faturou R$ 245 milhões somente com premiações no ano passado.

Diferentemente de Ronaldo Fenômeno, que adotou uma postura de austeridade quando comprou a SAF do Cruzeiro, Textor entende que é preciso investir forte no negócio para aumentar as receitas do clube e, a longo prazo, torná-lo sustentável. Ao se tornar sócio majoritário, o americano também assumiu a dívida bilionária do clube associativo, cujo passivo teve parte renegociada no Regime Centralizado de Execuções (RCE). As parcelas de 2024 somam R$ 151 milhões pagos aos credores.

Além do Botafogo, outras SAFs do futebol nacional entraram na jogada dos grandes investimentos, como o Bahia, que está atrelado ao Grupo City, dos Emirados Árabes Unidos, abastecido pelo “infinito” dinheiro do petróleo, e o Cruzeiro, que agora está sob o controle de Pedro Lourenço, empresário mineiro dono da rede Supermercados BH e cruzeirense fanático.

O Palmeiras, com receias potencializadas pela venda de jogadores promissores das categorias de base, decidiu mudar de postura em 2025 e foi agressivo para o mercado, fazendo contratações com altas compensações financeiras. O atacante Paulinho foi comprado junto ao Atlético-MG por R$ 118 milhões, a transação mais cara do futebol nacional neste ano até o momento.

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Rede multiclubes

Segundo o Observatório Social do Futebol, atualmente 178 clubes estão distribuídos em 56 redes multiclubes diferentes. Botafogo e Bahia se beneficiam também por fazerem parte de conglomerados. O time carioca, por exemplo, tem como “carta na manga” em negociações por atletas oferecer uma ida à Europa por meio do Lyon. Porém, a maneira como ocorre o pagamento entre times do mesmo grupo levanta a questão sobre a legitimidade do negócio, assim como o fato de a Eagle utilizar um “caixa único” para gerir todas as equipes da rede, alocando dinheiro onde é necessário para evitar problemas.

“Deveria haver uma regra controlada pela Fifa quando falamos de grupos trabalhando internacionalmente. O Botafogo é um caso atípico porque o Textor entrou no mercado querendo impor uma condição dele, não é assim em lugar nenhum. O City e a Red Bull, por exemplo, trabalham clube a clube, segundo as regras de cada país. O regulador na França não tá interessado em saber se o dinheiro tá no caixa da Eagle, nos Estados Unidos, no Botafogo ou na Bélgica. Ele quer saber da condição sustentável do Lyon. O Textor entra no mercado querendo modificá-lo e acaba criando uma confusão para ele mesmo”, comenta.

Veja a opinião de cada clube da Série A sobre o fair play financeiro

  • Atlético-MG (Paulo Bracks, diretor executivo): Mais do que a favor, consideramos o fair play uma necessidade no futebol brasileiro. Precisa haver uma limitação de gastos proporcional à receita do clube. Isso gerará um controle e limite do endividamento. E, pela realidade do futebol mundial e brasileiro, é essencial ter regras para aportes de capital. Qual o limite? Não pode ser infinito. Precisa haver limite. E os clubes precisam publicar seus balanços e auditar essa demonstração financeira. Passou dos limites? Prazo de 1 ano para corrigir, sob pena de sanções severas. E tudo com regras e definições aplicáveis a todos os clubes. A UEFA já está em fases avançadas e discussões permanentes para deixar o sistema melhor entre as Federações, e no Brasil ainda se vê resistência para sentarem os clubes em uma mesma mesa e debater, valorizando o futebol, fortalecendo o nosso esporte. Precisamos de Liga forte e regras claras.
  • Botafogo: O Botafogo já manifestou seu posicionamento sobre o tema através de declarações e entrevistas coletivas do acionista majoritário John Textor.
  • Ceará (presidente João Paulo Silva): Sou a favor do fair play financeiro. É uma pauta que se discute entre os clubes desde 2018. Seria muito interessante para os clubes ter uma organização, um planejamento de médio e longo prazo com o monitoramento da CBF em relação ao endividamento dos clubes. Seria muito positivo. O Ceará é totalmente a favor.
  • Corinthians: O Corinthians apoia a implementação de um modelo de fair play financeiro no futebol brasileiro, desde que seja estruturado com responsabilidade e um plano de médio prazo, respeitando as diferenças financeiras entre os clubes, inclusive dentro da própria Série A. É fundamental que haja um período de transição adequado, permitindo que todos os times se adaptem sem comprometer a competitividade e a sustentabilidade do nosso futebol. Para o futebol brasileiro, um modelo de fair play financeiro precisa equilibrar responsabilidade fiscal e competitividade, respeitando as realidades distintas dos clubes. O ideal seria um sistema baseado em regras claras de controle de gastos, associadas à receita operacional de cada time, garantindo que os investimentos sejam sustentáveis. Além disso, é essencial um período de transição bem estruturado, permitindo que os clubes ajustem suas finanças sem comprometer a qualidade do futebol. Medidas como limite de endividamento, maior transparência na gestão e incentivo à formação de atletas podem fortalecer o futebol nacional sem engessar o crescimento dos clubes. O objetivo deve ser criar um ambiente mais equilibrado e saudável para todos, sem desconsiderar o contexto de cada equipe. Esse é um passo fundamental para o futuro do nosso futebol.
  • Cruzeiro: O Cruzeiro entende que deveria haver um rigoroso controle a respeito dos compromissos financeiros assumidos pelos clubes, tanto em relação às questões internas, como remunerações e premiações destinadas aos próprios atletas, comissões técnicas e colaboradores, como em relação aos demais players do mercado do futebol, como outros clubes, agentes, prestadores de serviços e fornecedores em geral. Dessa forma, haveria mais isonomia nas disputas, pois o cenário atual é de clubes que não arcam com suas responsabilidades, mas continuam realizando investimentos no futebol, competindo contra instituições que zelam por manter todos os compromissos em dia, como é o caso do Cruzeiro.
  • Flamengo: Sim, o Flamengo é a favor de um sistema de Fair Play Financeiro. É importante premiar aqueles que pagam seus impostos e obrigações em dia. O Flamengo entende que os clubes devem se reunir para estabelecer os critérios deste sistema, que precisa passar por um período de transição ao longo de cinco anos, permitindo assim que todos se adequem ao novo momento do futebol brasileiro.
  • Fluminense (presidente Mário Bittencourt): Sim. Porque o clube entende que esta é uma das formas mais eficazes de aumentar o equilíbrio competitivo no futebol brasileiro. Tanto é verdade que é um mecanismo adotado nas maiores ligas europeias. As regras devem ser estudadas e adaptadas ao mercado brasileiro, começando com regras simples e objetivas para depois evoluir para conceitos mais rígidos como existe na Europa. Creio que um pontapé inicial poderia ser, por exemplo, a instituição de uma regra na compra e venda de atletas, ou seja, clubes que não cumprem com seus compromissos estarem impedidos de contratar e inscrever esses atletas nas competições.
  • Fortaleza (CEO Marcelo Paz): Sim, nós somos a favor do fair play financeiro e justifico, pois é uma prática consolidada nas principais ligas do mundo e gera uma possibilidade de uma disputa mais justa, de uma disputa não impactada por situações financeiras que causam o que chamo de “doping financeiro”, que seria dinheiro de origem não declarada para clubes de futebol; contratos além da condição financeira; e compras de jogadores para além da condição financeira. Isso gera um ganho esportivo imediato baseado em situações não sustentáveis do ponto de vista econômico. Eu acho que poderia, primeiro, se estudar as melhores práticas de fair-play financeiro ao redor do mundo em outras ligas, pegar as boas experiências para ver o que pode ser adaptado ao futebol brasileiro mas, de imediato, eu acho que um clube que tem um histórico de dívidas que, por exemplo, não paga a compra de jogadores, de forma mais rápida e imediata não deveria por adquirir outros atletas, ficando proibido de contratar enquanto não saldar com as dívidas já assumidas por outras compras em outros momentos. Esse, sem dúvidas, é um item que teria que ter no fair-play financeiro, entre outros que podem ser debatidos como limite de salários, origem dos recursos, o que entra naquela sugestão já dita sobre estudar o que se faz de melhor ao redor do mundo.
  • Grêmio (presidente Alberto Guerra): O Grêmio é favorável porque entende que o fair play financeiro protege o futebol dentro e fora do campo. Ao impor limites de gastos em relação às receitas, os clubes vão evitar endividamentos excessivos e crises financeiras, o que proporcionará uma operação mais equilibrada e segura no longo prazo. Por outro lado, pode evitar que os Clubes com maiores recursos criem desequilíbrios nas competições, privilegiando o talento e a estratégia dos times. A medida pode também incentivar uma gestão mais responsável e transparente, atraindo mais investidores, patrocinadores e parceiros. Por fim o fair play financeiro pode contribuir para um mercado mais estável, onde os riscos de bolhas financeiras e falências são minimizados, em benefício de todos os que se envolvem com o futebol.
  • Internacional (vice-presidente e membro do Conselho de Gestão Dalton Schmitt Jr): Sim, somos a favor. O futebol brasileiro ainda precisa dar passos na estruturação de um ambiente de alta eficiência, e a implementação de regras de sustentabilidade financeira ajudaria a acelerar esse processo. A visão de curto prazo do ambiente dos clubes associativos, com ciclos curtos de gestão, pode levar a decisões econômicas e financeiras que comprometam a sustentabilidade. De outro lado, o novo modelo de SAFs, dependendo da estrutura e dos vínculos societários, igualmente pode levar a caminhos que sejam desconectados de sua real estrutura econômica. Essas diferentes dimensões e conflitos de interesse, potencialmente existentes tanto nos modelos de associação quanto no privado, têm produzido distorções significativas, ora com os clubes elevando significativamente seu endividamento, ora com clubes fazendo elevados investimentos na formação de equipes em proporções desconexas de sua estrutura econômica. Acreditamos ser saudável ao futebol brasileiro a determinação de regras conjuntas que visem estabelecer padrões voltados à eficiência. Naturalmente, não podemos criar modelos que eliminem as vantagens competitivas dos clubes que tenham mais potência de investimento econômico e financeiro. Isso é mérito de sua história, de sua torcida e de sua capacidade de gerar receitas e resultados. Contudo, acreditamos que estabelecer regras de gestão lógicas ajudará o futebol brasileiro em um processo de gestão mais firme e eficiente, trazendo benefícios de alto impacto, mesmo que imponha aos clubes normas de conduta duras e um processo cultural de transformação que não será fácil, mas que é necessário. É preciso estabelecer regras claras para a gestão, adotando indicadores e metas que balizem os investimentos, gastos e despesas, norteadas pela capacidade de geração de receitas dos clubes. Como exemplo de um efeito benéfico dessas regras, isso geraria um natural incentivo à busca de gerar novos ativos, trabalhando a formação de atletas de base. Adicionalmente, é necessário estabelecer regras conectadas à imposição de uma gestão eficiente dos clubes para a participação em competições, bem como políticas de compliance e indicadores que, se não cumpridos, gerem sanções para o descumprimento. Essa construção deveria ser promovida pelas entidades organizadoras do futebol e pelos clubes, assessorada por profissionais especializados e com um período de transição estabelecido para a adaptação de todos às novas regras.
  • Juventude (presidente Fabio Pizzamiglio): Sim, o Esporte Clube Juventude defende a implantação do Fair Play Financeiro no futebol brasileiro. Consideramos essa medida extremamente importante para garantir a sustentabilidade dos clubes, estabelecendo limites claros entre receitas e despesas dentro do Departamento de Futebol Profissional. Acreditamos que um controle mais rigoroso sobre os investimentos evitaria distorções no mercado, como aconteceu em algumas ligas europeias, onde o aporte de valores excessivamente altos por investidores inflacionou os custos e reduziu a competitividade entre os times. Além disso, entendemos que um cenário mais equilibrado contribuiria para a saúde financeira do futebol brasileiro a longo prazo. O Juventude entende que é essencial estabelecer limites de gastos proporcionais às receitas dos clubes, além de um teto geral de investimentos para evitar desequilíbrios extremos. Defendemos que essa discussão deve envolver todos os clubes e ser conduzida de forma coletiva para que o futebol brasileiro possa garantir maior competitividade, evitando a concentração de recursos nas mãos de poucos e garantindo um crescimento sustentável para todos. No último ano, vimos equipes assumindo grandes dívidas para realizar contratações elevadas na janela de transferências, impactando diretamente o equilíbrio do campeonato. Enquanto isso, o Juventude seguiu sua política de responsabilidade financeira, sem comprometer seu orçamento e sem recorrer a endividamento excessivo.
  • Mirassol: O Mirassol Futebol Clube é favorável ao Fair Play financeiro pois entende que a responsabilidade na gestão financeira é uma marca da instituição, que fez inclusive com que, sendo um clube do interior, atingíssemos o patamar em que nos encontramos hoje. Trabalhar com recursos compatíveis com nossas receitas faz parte das nossas práticas desde antes do debate sobre Fair Play financeiro. Acreditamos que, se aplicadas as regras, o não cumprimento deveria ser punido com perda de pontos dentro das competições.
  • Palmeiras: O Palmeiras é favorável à implementação do Fair Play Financeiro. O futebol brasileiro necessita de regulamentação a fim de coibir condutas irresponsáveis, assegurar a isonomia das competições e adquirir maior credibilidade. O Fair Play Financeiro precisaria ser implementado de forma gradual para que todos os clubes pudessem se adaptar às regras, que são indispensáveis para fiscalizar e punir gestões irresponsáveis. Exemplo: um clube que não é capaz de pagar dívidas relacionadas a salários de atletas ou aquisições de jogadores deveria ser impedido de fazer novos investimentos em contratações.
  • Red Bull Bragantino (CEO André Rocha): Sim, porque entendemos que o mercado brasileiro está em processo de franca evolução, com investimentos cada vez maiores, mas muitas vezes aplicados de forma não-sustentável. O Fair Play financeiro nos permitiria entre outras coisas, garantir o crescimento estruturado do nosso mercado. Entendemos que não precisamos criar nada novo, pelo contrário, temos o benefício de buscar o que aconteceu de melhor e também os reveses observados em ligas mais maduras. Precisamos considerar um processo de implementação adequado à nossa realidade, sem dúvidas. Mas não podemos abrir mão de uma aplicação imediata de um licenciamento dos clubes, nos moldes que já observamos em outros mercados.
  • Santos: Com certeza. É uma questão de responsabilidade com o futebol brasileiro. Não é justo que dirigentes gastem o que não podem apenas para trazer resultados a curto prazo e ganhar moral com os torcedores, afundando o clube em dívidas. Isso queima a imagem do nosso esporte, pois, além de não ser bem visto no exterior, a longo prazo, é prejudicial às instituições, o que afeta diretamente na qualidade dos nossos campeonatos. Não é uma questão de quem tem mais ou menos dinheiro, mas sim sobre o discernimento na hora de investir. Até o momento, já paguei mais de R$ 110 milhões em dívidas. Não dá para fingir que não existem as pendências, pois uma hora a conta chega. Temos vários modelos ao redor do mundo para nos inspirarmos, em diversos esportes, afinal, não é uma prática restrita ao futebol. É necessário fazer um balanço de quanto o clube arrecada e traçar um comparativo com os gastos, para verificar se está adequado ao orçamento. A partir daí, as regras precisam ser definidas de forma consensual entre todas as instituições. O mais importante é que possamos acabar com a irresponsabilidade administrativa nas nossas competições.
  • Sport (presidente Yuri Romão): Sim porque a competitividade de um campeonato como o nosso, ela só se dará a partir do momento que tenhamos um nivelamento entre as equipes participantes. O “produto” Brasileirão só se valorizará quando todos os clubes estiverem em igualdade financeira para montar seus elencos. Acreditamos que essa iniciativa é fundamental para promover a sustentabilidade financeira e a responsabilidade nos clubes de futebol. Isso não apenas beneficia os clubes, mas também os torcedores, os patrocinadores e o futebol como um todo. O Fair Play Financeiro incentiva ainda os clubes a investirem mais em suas próprias estruturas, como bases, academias e infraestrutura, o que é essencial para o desenvolvimento do futebol brasileiro. É fundamental que a regra seja aplicada de forma uniforme e justa para todos os clubes, sem exceções ou tratamentos diferenciados. Outro aspecto importante é a necessidade de uma maior transparência nos clubes, como regra a ser cumprida. Acreditamos que essa regra deve ser aplicada em conjunto com outras medidas que visem promover a sustentabilidade financeira dos clubes. É todo um processo que os clubes e o sistema futebol como um todo precisará se adaptar.
  • Vitória (presidente Fábio Mota): É evidente que o Vitória é a favor. Um clube como o Vitória se esforça muito para honrar seus compromissos e você vê um concorrente que deve 10, 20 vezes o que arrecada, fazendo investimento, não pagando salários, luvas e, no final, terminar na frente de quem faz tudo certo. Temos que ter responsabilidade. Não precisa criar nada aqui, basta copiar o que é feito nas grandes ligas europeias, França, Alemanha, Holanda. É muito simples: é só determinar que o clube não possa gastar mais do que arrecada, inclusive com penalidades que têm que ir na individualidade do patrimônio do dirigente.