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'Não se faz uma Copa sem o governo'

Dirigente considera que saída de Ricardo Teixeira vai ajudar a deslanchar a organização, mas ainda faz críticas ao Brasil

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Por JAMIL CHADE e BUDAPESTE

Ricardo Teixeira era um obstáculo e sua saída da CBF permitiu que finalmente a Fifa e o governo brasileiro estabelecessem uma "organização adequada'' para a Copa do Mundo de 2014. Mesclando ataques sutis e elogios rasgados, escolhendo cuidadosamente as palavras e fazendo de tudo para não citar Teixeira nominalmente, o presidente da Fifa, Joseph Blatter, fez questão de apontar que a nova fase na preparação do País só foi possível depois que José Maria Marin assumiu a CBF.

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Velhos rivais, ambos travaram uma verdadeira guerra, com o suíço ameaçando divulgar documentos secretos que, segundo a BBC, mostrariam que Teixeira recebeu suborno quando estava na Fifa. Para o brasileiro, a guerra não passava de uma disputa de poder para Blatter abrir caminho para seu aliado Michel Platini ser presidente em 2015.

Ontem, Blatter fez o primeiro ataque a Teixeira desde sua queda. Em entrevista a jornais brasileiros, rejeitou que a entidade esteja se enriquecendo às custas do Brasil. Segundo ele, os ganhos da Fifa com o evento - deve arrecadar no total US$ 4 bilhões com a Copa - vem graças aos patrocinadores, que não são brasileiros.

Ele, porém, não menciona o fato de que as obras públicas e de estádios custarão ao governo até R$ 33 bilhões e que, em apenas um ano, o orçamento já sofreu incremento de 15%. Questionado sobre o orçamento, afirmou desconhecer. Apenas alerta que a Copa deve ser vista como um evento "solidário'' em que se dividem os lucros a todas as federações.

O suíço comemora o fato de o governo estar envolvido na preparação. Mas chama Luis Fernandes, o representante do Ministério do Esporte no COL, de "carteiro'', indicando que apenas levará e trará informações. Eis os principais trechos da entrevista, concedida em uma das salas de um andar inteiro que a Fifa passou a ocupar em um hotel de luxo em Budapeste, local de sua reunião anual.

A Fifa tomou medidas em relação à Copa, mudou o COL, incluiu o governo na preparação e acelerou as construções. O que mais precisa ocorrer para colocar um fim aos atrasos…

Era evidente que era necessário ter pessoas do governo no COL. Isso foi feito em todos os lugares do mundo e só foi possível com o novo presidente da CBF (José Maria Marin). Agora, temos uma organização adequada. Não se pode organizar uma Copa sem a representação do governo no COL. Se não, não tem comunicação. Trata-se de ter um comunicador, um carteiro para levar informações. Isso está feito agora. Do lado do governo, será Aldo Rebelo o encarregado do progresso e suas responsabilidades. E do lado da Fifa será Jérôme Valcke.

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O senhor participará?

Eu não ficarei fora. Mas não sou quem executa. A presidente Dilma concordou que vamos no encontrar com mais frequência, quando ela estiver na Europa. Envolvemos o presidente da comissão de organização do Mundial no COL. Queremos isso porque uma decisão tomada no COL já é a decisão do Comitê Executivo da Fifa. O representante será o presidente da Conmebol, Nicolas Léoz. Tenho certeza que Copa estará pronta e que a Copa das Confederações também. Com quantos estádios, ainda veremos.

O que é a Copa para a Fifa?

A Copa é a maior organização esportiva do mundo e para a Fifa é a única fonte de renda. Temos 85% de nossa renda vindo da Copa. Organizamos outras competições. Salvo o Mundial de Clubes, que tiramos um pouco de dinheiro, todas as demais são deficitárias e ainda temos programas de desenvolvimento. Para a Copa vão 32 times. Mas o resto das federações também ganham.

Há acusações de que a Fifa vem lucrando com o Brasil...

O dinheiro não vem do Brasil. Isso precisa ser dito. Até agora, não temos um só patrocinador internacional do Brasil. São seis (Coca-Cola, Visa, Emirates, Adidas, Hyundai e Sony). Não tenho certeza, mas acho que não tem ninguém do Brasil. O Brasil precisa obter um certo número de patrocinadores locais.

O senhor apontou que as mudanças no COL só puderam ser feitas depois de que a própria CBF passou por mudanças.

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Sim. Até agora a organização se concentrou no que tinha de organizar. Talvez não entendiam que precisavam do governo, se não, não funcionava. Talvez não estavam envolvidos no dia a dia dos trabalhos. Sempre tivemos um participante do governo nas organizações de Mundiais. Estou um pouco surpreso que não tínhamos isso antes.

A relação entre a Fifa, COL e governo não funcionava…

Bem, agora está melhor. Era hora de estar melhor. Fiz essa viagem para ver Dilma e era o momento de eu ir. A mudança ocorreu justamente quando houve a mudança na CBF. Acho que teve uma grande influência também dentro do Brasil.

O senhor está aliviado que essas mudanças aconteceram dois anos antes da Copa?.

Sim. Era o momento de ocorrer. Se temos profissionais na organização, a atenção é na construção de estádios, infraestrutura e aeroportos. Mas isso não é nossa responsabilidade direta. É do Brasil. Nossa esperança é que unimos forças. Não é como começar do zero. É como na F-1. Trazem o safety car e a corrida continua.

Mas o safety car só entra quando há um choque na pista.

Não, pode ser chuva.

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A percepção de que dinheiro público está sendo usado para a Copa preocupa o senhor…

Fiquei surpreso. Foi Romário quem me disse isso e eu respondi: 'Você está totalmente errado'. E ele ainda disse que deveríamos dar entradas para os brasileiros. Temos 3 milhões de entradas e vocês são 200 milhões. Como pode ser isso? Na segunda vez que fui ao Brasil (neste ano), não tive a impressão que há um sentimento pior em relação à Copa. Talvez não entendem que não estão prontos. Pelé disse que existem atrasos. Ele deveria ter dito isso antes. Mas ainda há tempo. Na Eurocopa, em Portugal, no dia do jogo, pintavam ainda estádios.

O senhor lamenta hoje não ter havido uma concorrência em 2007 para quem sediaria a Copa de 2014…

O Brasil é a sexta economia do mundo, talvez quinta. É um país organizado. Como não podemos confiar? Não lamentamos. É uma potência econômica. E tinha direito de sediar a Copa. É 5 vezes campeão. Se alguém tem direito, é o Brasil. Não poderia ter melhor país.

O senhor se preocupa com o fato de o orçamento do Brasil na Copa estar aumentando.

Não posso entrar nessas discussões. Pergunte ao secretário-geral da Fifa.

O que espera até final do ano sobre a preparação da Copa.

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Espero que quando façamos o sorteio da Copa das Confederações no dia 1.º de dezembro, saibamos os estádios que serão usados para a Copa das Confederações e também quais são os 12 estádios para a Copa.

Mas o senhor deixa um espaço aberto para que algum estádio seja retirado da Copa ainda…

Não, vamos saber quais estão prontos para a Copa das Confederações ano que vem. Mas em 2010, jogamos a Copa com 9 cidades e dez estádios. Mas não era um país tão grande e nem o interesse pelo futebol era tão grande.

Quando o senhor deu ao Brasil o direito de sediar a Copa, pensava que teria tantos desafios ou achava que seria mais fácil…

Com minha experiência na organização de competições, sou sempre otimista. Não sou um profeta e não era naquele momento. Estava certo que funcionaria. Talvez possa dizer que achava que seria mais acelerado. Mas agora estão acelerando.

Depois da experiência no Brasil, o senhor acha que a Fifa - como faz o COI - deva exigir que países candidatos assinem todos os compromissos antes mesmo de vencer a eleição…

No futebol, trabalhamos com a confiança. Sei que fazem isso no COI. Naquele dia, assinam qualquer coisa. Mas depois vão ler. Sei de casos que assinaram os compromissos e depois virão que não funcionaria. Sei de caso que assinaram e depois mudaram os planos.

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