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Vídeo engana ao relacionar consumo de leite e beterraba a câncer

Postagem viralizou ao listar produtos que causariam doença em até 30 anos; especialistas explicam que câncer é causado por uma combinação de fatores, e não por um alimento específico

Foto do author Gabriel Amorim
Foto do author Laura Abreu
Por Gabriel Amorim e Laura Abreu
Atualização:

O que estão compartilhando: vídeo aponta relação direta do consumo de alimentos como leite e beterraba com a ocorrência de câncer. A postagem ainda determina a janela temporal entre o consumo e o aparecimento da doença. O autor do conteúdo fala que o leite “vai te dar câncer e te matar em cerca de 25, 30 anos”.

O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. O Estadão Verifica ouviu três especialistas que afirmam que, apesar de alguns dos alimentos citados serem potencialmente cancerígenos, como a salsicha e o suco em pó, o seu consumo não pode ser considerado como fator determinante ou isolado na ocorrência de câncer. Além disso, os nutricionistas consultados apontam que nenhum estudo científico determinou janelas temporais como as citadas na publicação, já que o câncer é considerado uma doença multifatorial.

Vídeo engana ao relacionar leite e beterraba a câncer Foto: Arte/Estadão

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Saiba mais: de acordo com os especialistas ouvidos pelo Estadão Verifica, o consumo de determinados alimentos pode sim ser um fator que contribui para o aumento no risco da incidência de câncer. No entanto, segundo o oncologista clínico da Santa Casa de São Paulo Luis Eduardo Silva Moz, a doença não tem uma única causa, e depende também de fatores genéticos, laborais e ambientais, que diferem em cada indivíduo. “Por isso, as pesquisas precisam de grande número de pacientes e longo tempo de seguimento para que seja possível constatar a relação de determinado agente (alimento ou substância) e o risco aumentado de desenvolvimento de câncer”, explicou.

Além disso, em geral os hábitos alimentares estão ligados a tipos específicos de câncer. A nutricionista e mestre e doutora em oncologia Tayana Vago aponta que a rotina alimentar pode influenciar na ocorrência, principalmente, de casos de câncer do trato digestivo, o que inclui esófago, estômago, intestino e os que ocorrem na cavidade oral. O câncer de mama também pode estar relacionado a hábitos de alimentação não saudáveis.

O vídeo analisado aqui aponta o conservante nitrato de sódio como o aditivo que causa o câncer. Segundo o responsável pelo conteúdo, o composto estaria presente no leite em pó, suco em pó, salsicha, leite desnatado e beterraba em conserva. De acordo com a consultora da Associação Brasileira de Nutrição e professora da Universidade Federal de Pernambuco Viviane Lansky, essa informação é falsa. O conservante está presente apenas nos embutidos. Estudos de fato relacionam a substância ao aumento do risco de câncer, mas não a apontam como fator isolado nem determinante para o adoecimento.

Ainda segundo Lansky, a legislação sanitária brasileira permite a inserção do nitrato de sódio nos alimentos, mas estabelece quantidade máxima que é de 0,015 g a cada 100 gramas do produto final. Segundo ela, o consumo de um produto isolado com níveis de concentração dentro da quantidade permitida por lei não é um problema. O preocupante é o consumo aumentado de embutidos, inclusive de mais de um tipo.

Outra alegação falsa contida no vídeo é a de que a salsicha demora cerca de 30 anos para ser totalmente digerida e eliminada do corpo. O tempo de metabolização é diferente para cada indivíduo e não existem, de acordo os especialistas ouvidos, estudos científicos que determinem o tempo de metabolização do alimento. “Cada um tem uma capacidade diferente de eliminação de substâncias estranhas ao organismo, como os nitritos e nitratos que estão presentes na salsicha”, explica a nutricionista Tayana Vago, que aponta que hábitos alimentares mais saudáveis diminuem o tempo de digestão e metabolização dos alimentos.

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A pedido do Estadão Verifica, Tayana analisou cada um dos alimentos citados no vídeo. Confira:

Leite: O consumo do alimento não tem relação estabelecida com câncer, e o leite pode estar inserido em rotinas saudáveis de alimentação. O leite de caixinha tem mais aditivos e conservantes que o leite em pó, mas a presença dos compostos não é regra para todas as marcas. Uma dica é analisar o rótulo, e buscar produtos em que o único ingrediente seja o próprio leite.

Suco em pó: O consumo do produto já tem, de acordo com estudos, uma relação bem estabelecida com o aumento no risco de câncer. O suco em pó apresenta componentes considerados carcinogênicos, como corante caramelo IV e tartrazina, por exemplo. O aparecimento da doença, contudo, é relacionado à frequência e à intensidade do consumo, aliada a outros fatores particulares de cada indivíduo.

Salsicha: Outro alimento que tem relação bem estabelecida com o aumento do risco de câncer, em razão da presença de nitrato e nitrito, considerados compostos carcinogênicos. Novamente, o aparecimento da doença vai depender da frequência e intensidade do consumo aliada a outros fatores particulares de cada indivíduo.

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Beterraba em conserva: A beterraba é naturalmente fonte de nitrato, mas ele é diferente dos conservantes utilizados nos industrializados, por exemplo. Neste caso, a substância não representa um fator de risco.

A postagem analisada é introduzida com um trecho de um vídeo mostrando uma suposta produção de leite de caixinhas. Esse vídeo já foi analisado pelo Estadão Verifica que investigou que, na verdade, se trata de fabricação de queijo na Coreia.

Como lidar com postagens do tipo: O post analisado utiliza informações verdadeiras — a presença de nitrato na salsicha e a relação do conservante com o aumento do risco para o câncer — mas as apresenta de forma distorcida. Ao se deparar com postagens do tipo, pergunte-se se o responsável pelo conteúdo tem conhecimento sobre o assunto. Além disso, utilize outros recursos para verificar a informação, como o contato com médico e a observação dos rótulos na hora da compra. Saúde e alimentação são alvos constantes de desinformação, o Estadão Verifica analisou, também, que não há substâncias tóxicas no leite de caixinha.

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