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Aquecendo a alma com schnapps, a bebida tradicional das montanhas austríacas

Por toda a região do Tirol, na Áustria, fazendas e destilarias alpinas atraem esquiadores e turistas de inverno com um forte toque de tradição local

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Por Aishvarya Kavi

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Quando o inverno chega ao oeste da Áustria e o sol desaparece muito rápido atrás dos Alpes cobertos de neve, você pode passear pelos pomares e logo depois saborear a fruta amadurecida pelo sol: basta beber um copo de schnapps.

Alexander Rainer, que dirige a destilaria Rochelt em Fritzens, na Áustria, deixa seu schnapps descansar em garrafões para equilibrar o álcool e os sabores de frutas antes de encher as garrafas manualmente. Foto: Sandra Singh/The New York Times

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Durante séculos, os agricultores da região do Tirol amassaram, fermentaram e destilaram maçãs, ameixas, damascos e outras frutas para fazer schnapps, uma bebida forte mais comumente apreciada como digestivo. Às vezes, o schnapps é infundido com ervas e plantas locais, como frutos do pinheiro austríaco.

Os mais de 4 milhões de turistas que visitam cidadezinhas tirolesas como Seefeld e Ischgl encontram cerca de 4 mil destilarias de schnapps espalhadas por toda a região, muitas vezes a poucos passos das pistas de esqui. Esse elixir não apenas aquece a alma: também fornece uma forte dose de uma profunda tradição local.

“Quando as pessoas visitam uma cidade, elas querem saber como vivíamos antigamente e o que comemos e bebemos hoje”, disse Monika Unterholzner, guia turística. Na Áustria, especialmente nas montanhas do Tirol, “schnapps é as duas coisas”, disse ela. “Faz parte da nossa identidade”.

Preparo de schnapps em um alambique em Rochelt, que não possui pomares próprios, mas compra ingredientes de alta qualidade, como damascos, de produtores locais selecionados. Foto: Sandra Singh/The New York Times

“Onde você possa receber os amigos”

O schnapps americano geralmente é uma bebida destilada à base de grãos e com sabor artificial, mas, no schnapps europeu, é a fruta que determina o resultado final, o que significa que a qualidade dos ingredientes é tudo. Os destiladores procuram os melhores frutos ou os cultivam nos seus pomares, onde podem acompanhar seu amadurecimento.

“O processo é muito simples”, disse Alexander Rainer, que dirige a destilaria Rochelt em Fritzens, perto de Innsbruck. “E acho que as coisas mais bonitas da vida geralmente não são complicadas”.

Na Rochelt, a luxuosa fabricação de schnapps fica escondida atrás dos portões de uma modesta casa de fazenda branca e verde. Lá dentro, o ar é tomado pelo cheiro de frutas fermentando.

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Dentro da sala de degustação de Rochelt, onde grandes jarras de schnapps são tampadas com panos de linho. Foto: Sandra Singh/The New York Times

A tradição da Rochelt remonta à década de 1970, quando o sogro de Rainer, Günter Rochelt, começou a destilar na garagem, como hobby. Agora, Rainer administra o negócio com o mesmo carinho incutido pela sogra, que fez um pedido ao marido quando ele abriu a destilaria.

“Se você construir sua destilaria, faça uma cozinha grande e um lugar grande onde possa receber os amigos”, disse ela, segundo Rainer contou. “Todo fim de semana ele fazia sessões de culinária com amigos e schnapps”.

Turistas atraídos pelos castelos medievais próximos, pela arquitetura contemporânea de nomes como Zaha Hadid e pelas vitrines dos cristais Swarovski podem desfrutar um pacote com tour, degustação e refeição na Rochelt por 60 euros – um preço surpreendentemente bom considerando que uma garrafa de schnapps Rochelt pode custar mais de US$ 300 nos Estados Unidos.

No começo do passeio, fui levada a uma cozinha iluminada e me deram um copo de água aromatizada com xarope caseiro de flor de sabugueiro. Um pote de geleia de damasco borbulhava no fogão – uma forma de aproveitar as frutas que sobraram do preparo do schnapps.

O refeitório do Rochelt, que oferece passeio, degustação e refeição por 60 euros, ou cerca de US$ 65. Foto: Sandra Singh/The New York Times

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Ao contrário da maioria das destilarias do Tirol, a Rochelt não tem pomares próprios. Rainer compra as frutas de produtores selecionados na vizinhança. Não importa qual seja a fruta, ela é deixada amadurecer no galho, depois colhida à mão, amassada e fermentada. O mosto então segue para a destilaria, onde os visitantes podem ver como se transforma numa bebida perfeitamente límpida. Mesmo no auge do inverno, disse Rainer, pelo menos um dos quatro alambiques de cobre fica funcionando.

Depois do passeio, almoçamos numa aconchegante sala construída com madeira recuperada de três fazendas de 150 anos. O cardápio trazia sopa de abóbora acompanhada de kaiserschmarrn, uma espécie de panqueca servida com geleia de damasco fresco. Para o toque final, Rainer borrifou schnapps de damasco no ambiente, para que a fruta madura envolvesse todos os sentidos.

O schnapps é profundamente saboroso – quando você agita a taça de degustação, a bebida deixa rastros nas laterais, muito parecidos com as lágrimas do vinho. O schnapps também é forte: a maioria das variedades tem cerca de 75% de álcool logo após a destilação. Mas em vez de diluí-lo em água, como faz a maioria dos fabricantes, Rainer deixa a bebida descansar no sótão até que os sabores do álcool e da fruta fiquem mais equilibrados.

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Schnapps rotulados manualmente na Rochelt, uma operação de luxo cujas garrafas podem ser vendidas por US$ 300 ou mais nos Estados Unidos. Foto: Sandra Singh/The New York Times

Pomares com vista de cartão postal

Nas tardes de neve, o centro de Seefeld, vilarejo a noroeste de Innsbruck famoso pelo esqui cross-country, atrai turistas para ruas repletas de lojas aconchegantes e hotéis em estilo chalé alpino. Cervejarias locais e pousadas tradicionais servem iguarias tirolesas, como carne de veado e bolinhos fritos. Crianças correm de trenó por uma pequena colina perto dali.

Vários dos resorts de luxo da região compram seu schnapps na Destilaria Draxl, do outro lado do caudaloso rio Inn, em Seefeld. Hubert Draxl supervisiona a fazenda de cerca de 30 mil metros quadrados com os pais e a esposa. A janela da moderna sala de degustação se abre para a fazenda e a vila de Inzing mais abaixo, uma vista de cartão postal, com o campanário da igreja emoldurado entre as montanhas.

Um gato branco passou enquanto Draxl exibia seus pomares, caminhando entre 10 mil árvores que cultivam ameixas e seis variedades de maçãs. Elas formavam linhas nítidas ao longo da encosta da montanha, revelando vislumbres do vale entre seus galhos nus.

Um depósito na Destilaria Draxl, que fornece aguardente para vários resorts de luxo ao redor da cidade de esqui de Seefeld, do outro lado do caudaloso rio Inn. Foto: Sandra Singh/The New York Times

A destilaria oferece aos visitantes refeições tirolesas de queijo, pão fresco e cisco, uma espécie de bacon (refeição e degustação por 50 euros), mas optei por apenas uma degustação de schnapps. Draxl tirou elegantes garrafas de vidro de uma prateleira e ofereceu amostras.

A ideia é que haja um schnapps para todos os gostos, disse Draxl – você só precisa encontrar o seu favorito. Pode ser um clássico schnapps de maçã ou uma variedade mais rara, como a feita com o fruto amargo do freixo da montanha. Esse fruto silvestre não é apetitoso para comer no galho, mas produz um schnapps delicioso, no qual provei notas de carvalho e marzipan.

O sabor das alturas

Uma variedade de ameixa que é característica das falésias e penhascos do Oberland tirolês, uma das poucas que crescem em altitudes tão elevadas, confere ao schnapps da região um sabor único. Os visitantes dos resorts de Ischgl podem provar essa fruta peculiar em várias destilarias perto de Landeck.

Um pomar de maçãs em Draxl, que tem cerca de 10.000 árvores formando linhas nítidas que emolduram a vista do vale do rio Inn abaixo. Foto: Sandra Singh/The New York Times

Na JP Kössler, o proprietário, Christoph Kössler, conduz passeios por sua destilaria moderna, repleta de janelas que dão para ameixeiras e as montanhas atrás delas. O espaço é maior e mais industrial do que a maioria no Tirol: os alambiques têm chapas brilhantes de aço inoxidável sobre o cobre tradicional, e uma parede está repleta de prêmios que Kössler ganhou.

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Logo ao lado, Kössler teve de se abaixar para entrar na sala com painéis de madeira de uma casa centenária onde nasceu o arquiteto barroco Jakob Prandtauer (o JP no logotipo da Kössler), no século 17. Saboreamos um schnapps feito de ameixas de seu próprio pomar, enquanto Kössler preparava bebidas. Um passeio e degustação na JP Kössler custa 20 euros por pessoa.

Uma garrafa de aguardente de sorveira no Draxl. Rowanberries, fruto do freixo da montanha, tem sabor amargo no galho, mas produz aguardente com notas de carvalho e maçapão. Foto: Sandra Singh/The New York Times

Kössler começou a destilar em 1995 – uma época, disse ele, em que havia um novo interesse em destilar produtos de qualidade, em vez de só usar sobras de frutas para fazer schnapps. Mas ele cometeu muitos erros antes de acertar.

“Se você faz schnapps e quer fazer um bom schnapps, você precisa de boas frutas”, disse Kössler, “e tem que destilar bem perto da produção”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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