PUBLICIDADE

Delivery de lixo cresce com cliente atento ao descarte de resíduos

Negócios no Rio e no interior de São Paulo cobram para coletar resíduo orgânico na casa do cliente; legislação paulistana, porém, não permite retirada sem caminhão compactador

PUBLICIDADE

Por Marina Dayrell

Na lacuna deixada pelo poder público no tratamento de material orgânico nas cidades, surgem pequenos negócios que por meio de uma assinatura mensal coletam o lixo na residência dos clientes, fazem a compostagem e devolvem o resíduo em forma de adubo e sementes. Com isso, os empreendimentos apostam em engajar os clientes para diminuir a poluição do solo, da água e do ar. A dinâmica funciona como um delivery às avessas: o cliente paga uma assinatura mensal e recebe um coletor (um balde com tampa) para armazenar o lixo orgânico, entre cascas e restos de frutas, verduras e legumes, borra de café, guardanapo, folhas e sementes, por exemplo. De acordo com o plano escolhido - coleta semanal, quinzenal ou mensal -, um funcionário da empresa vai de bicicleta (sem impacto para o ambiente) até a residência, recolhe o lixo gerado no período e o leva para uma central de compostagem.

A fluminense Ciclo Orgânicotem uma base de 1.400 clientes pessoas físicas e 100 estabelecimentos, como escolas, restaurantes e escritórios. Foto: Alex Ribeiro/Estadão

Referência no mercado, a fluminense Ciclo Orgânico aposta no método desde 2015 e hoje tem uma base de 1.400 clientes pessoas físicas e 100 estabelecimentos, como escolas, restaurantes e escritórios. Até o início do ano passado, a compostagem era realizada dentro da capital de forma manual. Com o crescimento do serviço, a empresa expandiu para a região metropolitana do Rio e acrescentou o uso de caminhão e maquinário. “Agora nós usamos o triciclo para levar os resíduos até o ponto de transbordo (dentro da capital) e, duas vezes por semana, o caminhão os recolhe e leva para Duque de Caxias", explica Lucas Chiabi, idealizador do negócio. O serviço atende 21 bairros do Rio de Janeiro, espalhados entre zona sul, zona oeste e centro, ao custo de R$ 35 a R$ 99 por mês, a depender da periodicidade da coleta e do tamanho do balde. Para fechar o ciclo do lixo, cada cliente recebe de volta uma parte do adubo produzido na compostagem e um pacote de sementes. Em cinco anos de funcionamento, os 15 funcionários - entre ciclistas e administradores - já tiraram das ruas mais de 1.000 toneladas de resíduos e o transformaram em 600 toneladas de adubo. Segundo dados mais recentes da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), o Brasil gerou 79 milhões de toneladas de resíduos em 2018 e metade deles pode ser considerada lixo orgânico. Em Botucatu, no Estado de São Paulo, três sócios se inspiraram na iniciativa fluminense para criar a Ciclo Limpo. Há quatro anos, o negócio funciona nos mesmos moldes da Ciclo Orgânico, com planos que variam entre R$ 35 e R$ 50 reais por mês. “O lixo orgânico é o que mais temos em abundância e é onde os municípios estão atuando menos. O nosso desafio é a conscientização. No Brasil, as pessoas acham que é só colocar (o lixo) para fora, a mágica se faz e ele desaparece”, conta o sócio Julio Pinhel. Para engajar o cliente e inseri-lo no ciclo da compostagem, a empresa envia mensalmente um relatório com informações sobre o que foi feito com o resíduo recolhido, a quantidade de adubo produzido e os efeitos para o planeta. “O nosso negócio não é do tipo que a pessoa contrata imediatamente, ela precisa de um tempo porque acha que não é uma necessidade. Sabemos que não é toda cidade que vai aderir e nem todo mundo vai poder pagar, mas uma parcela considerável da sociedade tem essa opção”, destaca. 

Para inserir o cliente no ciclo da compostagem, a Ciclo Limpoenvia mensalmente um relatório com informações sobre o que foi feito com o resíduo recolhido Foto: Flávio Kenji

PUBLICIDADE

Outras iniciativas, como a Re-ciclo, em Porto Alegre (com mensalidades a partir de R$ 60), e a Brotei, em Florianópolis (a partir de R$ 45), também oferecem o serviço.

Legislação emperra expansão de negócios

​Na capital paulista, a oferta ainda é incipiente. Segundo Pinhel, a Ciclo Limpo recebe pedidos para atuar em São Paulo, mesmo estando a mais de 230 km. De acordo com a Autoridade Municipal de Limpeza Urbana (Amlurb), por dia a capital paulista descarta 12 mil toneladas de resíduo domiciliar (entre orgânicos e recicláveis).

A carência de empresas atuantes nesse setor pode ser explicada pela legislação paulistana, explica Fernando Beltrame, presidente da Eccaplan, que há dez anos atua com consultoria de sustentabilidade. “A Prefeitura considera o resíduo orgânico perigoso e exige que a empresa tenha um caminhão de lixo compactador para o transporte. Em outros lugares do Brasil, é possível transportar de bicicleta ou com caminhão fechado. Para a compostagem funcionar, não pode dificultar o transporte.”

Além de oferecer a gestão de resíduos para grandes empresas e eventos, pela campanha Sou Resíduo Zero, a Eccaplan começou em novembro um projeto piloto para realizar a compostagem de resíduos orgânicos de moradores de Pinheiros, na zona oeste paulistana. Por enquanto, os interessados pagam cerca de R$ 40 mensais e têm de levar o lixo até a estação de coleta, no mesmo bairro.

Publicidade

Em nota, a Prefeitura de São Paulo, por meio da Amlurb, informou que a lei nº 13.478/2002 veda “a execução, pelos munícipes-usuários, da coleta regular de resíduos de qualquer natureza excetuadas as hipóteses de autorização ou permissão para a prestação de tais serviços e outras expressamente previstas na regulamentação”.

Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.