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Exclusão do ICMS da base de cálculo do Funrural

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Por Alberto Dias , João Pedro França Teixeira , Daniel Passos , Luiz Conrado e Fernando Maragliano
Atualização:
FOTO: EPITÁCIO PESSOA/ESTADÃO Foto: Estadão

O produtor rural é toda pessoa física ou jurídica (empresa agrícola/agropecuária), proprietária ou não, que desenvolve, em área urbana ou rural, a atividade agropecuária, pesqueira ou silvicultural, bem como cuida da extração de produtos primários, vegetais ou animais, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos.

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O Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural), é uma contribuição social Rural de caráter previdenciário, paga pelo Produtor Rural, porém recolhida pela Pessoa Jurídica no momento da compra do produto, com base no valor bruto da comercialização.

Importante saber que, apenas a contribuição ao Funrural não garante o direito à aposentadoria, é necessário contribuir para o INSS de forma individual, pois o FUNRURAL não é uma contribuição para a aposentadoria específica do Produtor, mas para a previdência como um todo.

Portanto, o Funrural é uma contribuição substitutiva, ou seja, não vai incidir sobre a folha de pagamento, mas sim sobre a receita bruta obtida na comercialização da produção.

A questão gira em torno do fato do ICMS compor o preço da mercadoria e com isso, como o Funrural incide sobre a receita bruta advinda da venda da produção, acabava englobando o valor referente ao ICMS incidente na operação, a ensejar a sua exclusão da base de cálculo.

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Recentemente, o Supremo Tribunal Federal decidiu, também com repercussão geral reconhecida (RE nº 574.706/PR, Tema nº 69), que o ICMS não deve integrar a base de cálculo da contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS).

Isto porque o valor arrecadado a título de ICMS não se incorpora ao seu patrimônio, pois será entregue ao respectivo estado para pagamento do imposto.

Com efeito, a base de cálculo do Funrural não pode extravasar, desse modo, sob o ângulo do faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela percebida com a operação mercantil ou similar.

O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta.

Descabe assentar que os contribuintes do Funrural faturam, em si, o ICMS. O valor deste revela, isto sim, um desembolso a beneficiar a entidade de direito público que tem a competência para cobrá-lo.

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Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus, como é o ônus fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem a natureza de faturamento. Não pode, então, servir à incidência do FUNRURAL, pois não revela medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea 'b' do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal.

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Conforme salientado pela melhor doutrina, o FUNRURAL só pode incidir sobre o faturamento, que, conforme visto, é o somatório dos valores das operações negociais realizadas.

A contrário sensu, qualquer valor diverso deste não pode ser inserido na base de cálculo do Funrural. Há de se atentar para o princípio da razoabilidade, pressupondo-se que o texto constitucional se mostre fiel, no emprego de institutos, de expressões e de vocábulos, ao sentido próprio que eles possuem, tendo em vista o que assentado pela doutrina e pela jurisprudência.

Se alguém fatura ICMS, esse alguém é o Estado, e não o vendedor da mercadoria.

Conforme previsto no preceito constitucional em comento, a base de cálculo é única e diz respeito ao que faturado, ao valor da mercadoria ou do serviço, não englobando, por isso mesmo, parcela diversa. Olvidar os parâmetros próprios ao instituto, que é o faturamento, implica manipulação geradora de insegurança e, mais do que isso, a duplicidade de ônus fiscal a um só título, a cobrança da contribuição sem ingresso efetivo de qualquer valor, a cobrança considerada, isso sim, um desembolso."

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Sob este fundamento, o Ministro CELSO DE MELLO, fundamentou sua decisão COM REPERCUSSÃO GERAL (RE 574706), em recente declaração de inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e COFINS, destacando o papel da Constituição Federal na vanguarda da Constituição Federal:

"Torna-se essencial proclamar, por isso mesmo, que a Constituição não pode submeter-se à vontade dos poderes constituídos nem ao império dos fatos e das circunstâncias. A supremacia de que ela se reveste - enquanto for respeitada - constituirá a garantia mais efetiva de que os direitos e as liberdades jamais serão ofendidos. Ao Supremo Tribunal Federal incumbe a tarefa, magna e eminente, de velar por que essa realidade não seja desfigurada. (...)

Nenhum dos Poderes da República pode submeter a Constituição a seus próprios desígnios, ou a manipulações hermenêuticas, ou, ainda, a avaliações discricionárias fundadas em razões de conveniência política ou de pragmatismo institucional, eis que a relação de qualquer dos Três Poderes com a Constituição há de ser, necessariamente, uma relação de incondicional respeito, sob pena de juízes, legisladores e administradores converterem o alto significado do Estado Democrático de Direito em uma promessa frustrada pela prática autoritária do poder.

E conclui seu voto:

Concluo o meu voto, Senhora Presidente. E, ao fazê-lo, quero destacar que a orientação, por mim ora referida, que censura, de modo correto, por inconstitucional, a inclusão do ICMS na base de cálculo da COFINS (e da contribuição ao PIS) foi assim resumida na lição de ROBERTO CARLOS KEPPLER e de ROBERTO MOREIRA DIAS ("Da Inconstitucionalidade da Inclusão do ICMS na Base de Cálculo da Cofins", "in" Revista Dialética de Direito Tributário nº 75, p. 178, item n. 4, 2001):

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"(...) o ICMS não poderá integrar a base de cálculo da Cofins pelos seguintes motivos:

(i) o alcance do conceito constitucional de faturamento e receita não permite referida dilação na base de cálculo da exação;

(ii) isso representaria afronta aos princípios da isonomia tributária e da capacidade contributiva; e

(iii) o previsto no art. 154, I, da Constituição Federal seria afrontado."

Com essas considerações e com apoio em seu magnífico voto, Senhora Presidente, conheço e dou provimento ao presente recurso extraordinário interposto pela empresa contribuinte, acolhendo, ainda, a tese formulada por Vossa Excelência no sentido de que "O ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS".

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Neste diapasão, não resta dúvida da inconstitucionalidade declarada da atual formatação do cálculo, devendo excluir o ICMS da base de cálculo do FUNRURAL.

*Alberto Dias, João Pedro França Teixeira, Daniel Passos, Luiz Conrado e Fernando Maragliano, advogados

Artigo publicado no Jota

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