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Juiz aceita denúncia contra hackers, mas deixa Glenn de fora

Ricardo Augusto Soares Leite, da 10ª Vara Federal de Brasília, decidiu não receber 'por ora' a acusação da Procuradoria da República contra editor do Intercept Brasil 'diante da controvérsia sobre a amplitude da liminar do ministro Gilmar Mendes', que vetou responsabilização do jornalista

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Por Rafael Moraes Moura/BRASÍLIA e Luiz Vassallo/SÃO PAULO
Atualização:

O jornalista Glenn Greenwald. FOTO: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO  

BRASÍLIA - O juiz Ricardo Leite, da Justiça Federal do Distrito Federal, decidiu poupar o jornalista Glenn Greenwald, não aceitando, "por ora", a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) por participação em um esquema de invasão de celulares e roubo de mensagens de autoridades públicas, como o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. O juiz, no entanto, aceitou a acusação contra outras seis pessoas investigadas no âmbito da Operação Spoofing por associação criminosa e crime de interceptação telefônica, informática ou telemática.

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Leite observou que, apesar de encontrar indícios criminosos contra Glenn, está em vigor uma liminar concedida pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que proíbe que o jornalista seja investigado e responsabilizado pelas autoridades públicas e órgãos de apuração administrativa ou criminal (como a PF) pela "recepção, obtenção ou transmissão" de informações publicadas.

"Deixo de receber, por ora, a denúncia em desfavor de Glenn Greenwald, diante da controvérsia sobre a amplitude da liminar deferida pelo ministro Gilmar Mendes", escreveu Leite.

Documento

DECISÃO

A acusação formal contra Greenwald gerou repercussão no mundo político e jurídico. Segundo apurou o Estado, Gilmar avalia que a denúncia apresentada pelo MPF contra Glenn desrespeitou sua decisão. O juiz federal do DF, por outro lado, escreveu que vê "dúvida razoável" sobre se a determinação do ministro impede a denúncia ofertada pelo Ministério Público Federal contra o jornalista.

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"Como a questão foi judicializada, entendo, como regra de prudência, aguardar o desfecho de sua resolução pelo próprio Supremo Tribunal Federal", frisou Leite, que dedicou a maior parte da decisão a tratar da situação do jornalista.

O jornalista Glenn Greenwald em seu depoimento na Câmara dos Deputados em junho Foto: Adriano Machado/Reuters

Greenwald é fundador do site The Intercept Brasil, que iniciou a publicação de uma série de reportagens sobre mensagens trocadas entre Moro - quando juiz da 13ª Vara Federal em Curitiba -, o coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol, e outras autoridades da Lava Jato.

Para sustentar a acusação contra Greenwald, a Procuradoria da República no DF cita um diálogo entre o jornalista e Luiz Molição, acusado de ser um dos hackers que invadiu os celulares das autoridades. A conversa teria ocorrido em junho de 2019, após a publicação de reportagens sobre a invasão do celular de Moro.

"O agente (no caso Luiz Molição) já possuía um plano de comportamento em mente, sendo motivado por Glenn. Pelo nosso sistema penal, esta conduta integra uma das formas de participação moral, atraindo sua responsabilidade sobre a conduta praticada. Neste ponto, entendo que há clara tentativa de obstar o trabalho de apuração do ilícito, não sendo possível utilizar a prerrogativa de sigilo da fonte para criar uma excludente de ilicitude", observou o juiz.

Na avaliação de Leite, não pode o jornalista sugerir o que o criminoso deve fazer para não deixar rastros. "Pode sim manter segredo e não revelar para autoridades públicas a identificação de sua fonte, mas sem qualquer instigação ou reforço de uma ideia já existente no agente que dificulte o trabalho apuratório. No caso, conforme mencionado, Luiz Molição revela dúvida se deve ou não apagar as mensagens, e Gleen exara um parecer favorável a esta predisposição, mesmo, conforme mencionado, havendo uma indiferença prévia a esta questão", escreveu o juiz.

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Para o magistrado, Glenn atuou não como "mero receptador de conteúdo ilícito", mas como "instigador da conduta dos outros denunciados", já que o repórter teria recebido as informações não de uma única vez, e sim várias vezes, "mesmo já iniciada a divulgação" das matérias.

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O delegado Luiz Flávio Zampronha, responsável pelo inquérito policial do caso havia tido uma interpretação diferente ao analisar o mesmo diálogo. Para ele, a conversa demonstrava que Greenwald adotou uma "postura cuidadosa e distante" em relação às invasões de celulares. No relatório final da PF que encaminhou em dezembro passado para a 10ª Vara Federal em Brasília, o delegado afirma que Greenwald disse a Molição que, para não ser acusado de participação na invasão, ele "teria que provar que somente falou com a 'fonte' das informações após a conclusão da ação criminosa".

Na época em que a denúncia foi apresentada, Greenwald negou que tenha cometido crime e classificou a denúncia do MPF como um ataque à liberdade de imprensa.

COM A PALAVRA, GLENN GREENWALD

O jornalista se manifestou, por meio de seu Twitter.

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"Oi, eu sou Glenn Greenwald, com o Intercept, e queria discutir com vocês a decisão, hoje, do juiz que rejeitou a denúncia do Ministério Público Federal contra mim, e gostaria de começar a provar que este mesmo procurador, Wellington Oliveira, que teve uma outra denúncia em dezembro também rejeitada, aquela contra Felipe Santa Cruz, que mostra que ele está abusando do seu poder contra os inimigos políticos do senhor Sérgio Moro, tentando criminalizar pessoas que reportaram, criticaram o ministro da Justiça.

Neste caso, o juiz disse que ele não pôde aceitar a denúncia contra mim por causa da decisão anterior do STF, que proibiu que eu possa ser investigado por causa da minha reportagem, muito menos denunciado por causa da minha reportagem, porque isso é uma violação da Constituição, do direito constitucional para uma imprensa livre.

Mas, isso não é suficiente pra gente.

Nossos advogados agora vão ir para o STF e eles vão pedir uma decisão que deixe bem claro que essa denúncia não é só contrária à decisão anterior do STF mas muito mais do que isso, como quase todas as organizações de mídia e organizações em defesa da liberdade de imprensa, não só aqui no Brasil mas mundial, inclusive hoje a ONU que, como todos, disseram que essa denúncia é um ataque grave contra uma imprensa livre e à liberdade de imprensa.

E, agora nossos advogados vão ir para o STF para ter uma decisão deixando isso bem claro. Obviamente é uma boa notícia que o juiz não aceitou essa denúncia, que foi rejeitada, mas vamos ir para o STF para ter mais ainda. Muito obrigado para todos para todo seu apoio."

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COM A PALAVRA, O ADVOGADO ARIOVALDO MOREIRA, DEFENSOR DE GUSTAVO, SUELLEN E DELGATTI

Tratá-se de decisão esperada. Estamos convictos que instrução processual demonstrará q os fatos não ocorreram nos temos da denúncia e o magistrado por óbvio irá absolver meus clientes das infundadas acusações.

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