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Juíza condena Uber a indenizar em R$ 150 mil irmão de motorista morto por ladrões durante corrida

Sandra Brasil, da 2.ª Vara do Trabalho da zona Sul de São Paulo, anotou que empresa “auferia benefícios” decorrentes da atividade da vítima e concedeu ao irmão indenização por dano moral em ricochete, relacionada ao direito “de quem conviveu intimamente com o falecido”; nos autos, o aplicativo informou que pagou seguro de R$ 100 mil à família ‘não como assunção de culpa’ e alegou que não teve responsabilidade pelos fatos, ‘uma vez que a segurança pública é dever do Estado’

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Foto do author Pepita Ortega
Motorista de aplicativo. Imagem ilustrativa. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

A juíza Sandra dos Santos Brasil, da 2ª Vara do Trabalho da zona sul de São Paulo, condenou a Uber a indenizar em R$ 150 mil, por danos morais, o irmão de um motorista da plataforma que foi vítima de latrocínio (roubo seguido de morte), no dia de seu aniversário, em meio a uma corrida no Capão Redondo, bairro da periferia sul da capital paulista.

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No processo, a Uber sustentou que mantinha uma relação de “cunho comercial” com o motorista, não havendo vínculo empregatício entre as partes. Argumentou ainda que pagou ao pai e à viúva do motorista um seguro de R$ 100 mil, por “livre e espontânea vontade, não como assunção de culpa, mas para fins de solidariedade”.

Segundo os autos, o assassinato ocorreu no dia 19 de dezembro de 2022. O motorista aceitou uma corrida, pela Uber, com dois passageiros. Durante o percurso, um deles avisou que era um assalto. Os criminosos permaneceram com a vítima por cerca de duas horas antes de matá-la.

Ao acionar a Justiça do Trabalho, o irmão do motorista sustentou que a Uber é responsável pelo ocorrido, vez que “aceitou os riscos da atividade econômica e não zelou pela segurança dos condutores”.

Em contestação, a Uber apontou que o contrato do seguro pago à família do motorista “confere às partes quitação geral pelos danos materiais e morais decorrentes do infortúnio”. Alegou ainda que não teve qualquer responsabilidade pelos fatos, “uma vez que a segurança pública é dever do Estado”.

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Ao analisar o caso, a juíza destacou como a Uber “auferia benefícios” decorrentes da atividade do motorista, frisando que cabe à empresa não assumir somente lucros, mas também “riscos, insuscetíveis de transferência” a outra pessoa.

A magistrada ponderou que o fato de a segurança pública ser um dever do Estado não exclui a responsabilidade civil da empresa, decorrente do risco acentuado próprio da atividade empresarial, “que expõe os prestadores de serviço a potenciais danos no desempenho de suas funções”.

Segundo Sandra Brasil, o motorista estava no exercício de suas funções quando foi acionado para a corrida até o Capão Redondo, “Esteve sujeito a toda espécie de violência, com exposição do seu patrimônio, da integridade física e da sua própria vida”, destacou a juíza.

A magistrada anotou que a contratação de seguro por parte da Uber não parece ser uma benevolência, mas um reflexo de sua responsabilidade perante os “motoristas parceiros”.

“Não se faz necessário declarar aqui a existência do vínculo de emprego, posto que a relação de trabalho é incontroversa e contextualiza o infortúnio”, ela frisou.

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A avaliação foi a de que é aplicável ao caso o dispositivo do Código Civil que diz: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para o direito de outrem.”

Foi concedido ao irmão do motorista a chamada indenização por dano moral em ricochete - relacionada ao direito “de quem conviveu intimamente com o falecido” de pedir reparação em razão das circunstâncias da morte.

Segundo Brasil, a perda de membro da família configura dano moral diante de sua importância. A magistrada observou que a vítima morava com o irmão, que também é motorista da Uber.

O irmão pedia uma indenização de R$ 650 mil, mas o valor arbitrado foi de R$ 150 mil. A magistrada sinalizou que ao calcular o valor considerou a extensão do dano, o grau de culpa na conduta do empregador, o princípio da vedação do enriquecimento sem causa e o caráter pedagógico da medida.

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