Notícias e artigos do mundo do Direito: a rotina da Polícia, Ministério Público e Tribunais

Opinião | O cangaço digital no Brasil

Os tempos mudam, as práticas evoluem. Se médicos operam remotamente, empresários assinam digitalmente, e o dinheiro é transferido virtualmente, os criminosos também se adaptam à transformação digital para cometer crimes

PUBLICIDADE

convidado
Por Edmar Araujo

Livros, filmes e a tradição popular fazem do Cangaço um misto de mito e fato, de medo e admiração, de heróis e vilões. O banditismo que forjou Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, como o principal símbolo de pilhagem, assassinato, sequestro e estupro no Nordeste brasileiro, ocupa um lugar privilegiado no imaginário e na cultura do país.

PUBLICIDADE

Os tempos mudam, as práticas evoluem. Se médicos operam remotamente, empresários assinam digitalmente, e o dinheiro é transferido virtualmente, os criminosos também se adaptam à transformação digital para cometer crimes. Hoje, homens e mulheres com a mesma índole de Lampião não usam mais cavalos, mas computadores e celulares como instrumentos para praticar crimes semelhantes aos dos antigos cangaceiros.

A pesquisa Panorama Político de 2024, realizada pelo Instituto DataSenado, revela dados importantes sobre os golpes digitais no Brasil. Segundo o levantamento, 24% dos brasileiros relataram ter perdido dinheiro em crimes cibernéticos no último ano, incluindo clonagem de cartão, fraudes online e invasão de contas bancárias. Esses bandoleiros digitais têm se mostrado muito eficientes.

Alguns números revelam o perfil mais vulnerável aos golpes virtuais. Pessoas com renda de até dois salários-mínimos representam 49% das vítimas. Além disso, 77% dos entrevistados têm escolaridade até o ensino médio, sendo que 28% sequer completaram o ensino fundamental. Do total de vítimas, 54% são mulheres. Embora a pesquisa não destaque um estado específico com o maior número de vítimas, o Ceará (17%) e o Piauí (18%) têm os menores índices de vítimas, enquanto nos demais estados a distribuição é relativamente uniforme.

Em outras palavras, mulheres de todo o Brasil, com menor renda e baixa escolaridade, são as mais afetadas pelos golpistas virtuais. Assim como os cangaceiros do passado, os criminosos virtuais perpetuam práticas de exploração, adequando-se aos novos tempos.

Publicidade

A pesquisa também aborda as apostas esportivas e o endividamento, revelando que 69% das pessoas com dívidas em atraso há mais de 90 dias ganham até dois salários-mínimos. O brasileiro mais roubado na internet é justamente aquele que já enfrenta problemas financeiros.

Diante desse cenário, é necessário refletir sobre como proteger as pessoas mais vulneráveis. A primeira medida seria investir em educação digital e conscientização, oferecendo campanhas educativas, cursos de segurança digital e educação financeira. Essa deve ser uma missão compartilhada por estado e sociedade, por meio de parcerias entre o governo, bancos, provedores de internet e empresas de tecnologia.

Por outro lado, os aplicativos e plataformas digitais precisam implementar urgentemente camadas adicionais de segurança, como autenticação multifatorial, criptografia e monitoramento em tempo real por Inteligência Artificial.

A vulnerabilidade de grande parte da população, especialmente mulheres de baixa renda e escolaridade, expõe a necessidade urgente de alfabetização digital e medidas robustas de segurança. O fato de os mais endividados serem os mais atingidos também indica uma falha no sistema de proteção social e digital.

Além de segurança tecnológica, as soluções precisam ser integradas com políticas de inclusão e proteção econômica, para que as pessoas não só sejam protegidas contra golpes, mas também possam prosperar em um ambiente digital seguro e acessível.

Publicidade

Convidado deste artigo

Foto do autor Edmar Araujo
Edmar Araujosaiba mais

Edmar Araujo
Jornalista, pós-graduado em Letras e MBA em Transformação Digital e Futuro dos Negócios. Diretor executivo da Associação Nacional de Certificação Digital (ANCD). Foto: Arquivo pessoal
Conteúdo

As informações e opiniões formadas neste artigo são de responsabilidade única do autor.
Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão.

Tudo Sobre
Comentários

Os comentários são exclusivos para cadastrados.