PUBLICIDADE

Foto do(a) blog

Notícias e artigos do mundo do Direito: a rotina da Polícia, Ministério Público e Tribunais

O fracasso das teses derivadas da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins

PUBLICIDADE

Por Bruno Minoru Takii
Bruno Minoru Takii. Foto: Divulgação

Até o momento final do julgamento da chamada "Tese do Século", nem mesmo o mais otimista dos tributaristas acreditava na possibilidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) vir a reconhecer a constitucionalidade da exclusão do ICMS da base de cálculo das contribuições ao PIS/Cofins.

PUBLICIDADE

Porém, por um placar de 6 a 4, prevaleceu o entendimento da ministra Carmen Lúcia, para quem o conceito constitucional de faturamento ou receita bruta (termo equivalente) não comporta valor que, de antemão, já tem destinação certa. Vale aqui lembrar que o faturamento é a base de cálculo desses tributos e que, no caso do ICMS, o titular legalmente declarado é a Fazenda Estadual.

Conceitualmente correta ou não, essa foi a decisão proferida pelo Supremo em sede de repercussão geral e foi com base nela que empresas, contabilistas e advogados elevaram as suas apostas no êxito das teses que partiam da mesma premissa, qual seja: na determinação do valor do tributo cuja base de cálculo seja o faturamento, devem ser excluídos todos os tributos (ao menos, os indiretos) que tenham integrado essa base de cálculo, uma vez que se destinam, de antemão, à Administração Pública, seja ela municipal, estadual, distrital ou federal.

E essa expectativa em relação às teses derivadas faz todo o sentido no momento atual do direito brasileiro, uma vez que a teoria da transcendência dos motivos determinantes, segundo a qual a razão de decidir (ratio deciendi) também faz coisa julgada no controle concentrado de constitucionalidade, já se faz presente há razoável tempo em nossa legislação e na prática atual dos Tribunais Superiores. Contudo, não parece ser essa a lógica aplicada para este específico caso.

Até o presente momento, o STF julgou apenas uma das teses derivadas em sede de repercussão geral, que foi a exclusão do ICMS da base de cálculo da contribuição previdenciária sobre a receita bruta (CPRB - Tema 1.048), e a decisão foi contrária à pretensão dos contribuintes, com placar de 7 a 4 para a prevalência do voto apresentado pelo ministro Alexandre de Moraes.

Publicidade

De acordo com o ministro, a tese desenvolvida no Tema 69 não poderia ser estendida à CPRB porque, primeiro, a adoção da CPRB seria facultativa (sendo a outra opção a CP apurada sobre a folha de pagamentos) e, depois, porque a exclusão do ICMS ampliaria demasiadamente a redução da carga tributária proporcionada ao contribuinte. E por incrível que pareça, a decisão obtida no Tema 1.048 tem, também, sido utilizada pelo Supremo para confirmar a compreensão do ICMS na base de cálculo do Funrural, outro tributo cuja determinação depende do que se depreende por faturamento.

É evidente até para um leigo que ambos os fundamentos apresentados no Tema 1.048 não guardam qualquer conexão com a questão que o contribuinte pretendia ver respondida, dando a entender que o conceito de faturamento chancelado no Tema 69 seria um caso isolado, aplicado apenas naquela específica relação, mesmo tendo sido fixado em sede de repercussão geral.

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, em sede de recurso repetitivo (Tema 1.008), que o ICMS não deve ser excluído da base de cálculo do IRPJ/CSLL. De acordo com o ministro Gurgel de Faria, autor do voto vencedor, a tese do Tema 69 não seria extensível à hipótese porque a sistemática do lucro presumido não permite "quaisquer deduções, tais como custo das mercadorias ou serviços, despesas administrativas ou financeiras".

De fato, a apuração do IRPJ/CSLL pelo lucro presumido não permite que o contribuinte deduza de seu faturamento (base de cálculo) custos ou despesas de sua atividade. Salvo melhor juízo, o contribuinte não perguntou se o ICMS seria dedutível da base de cálculo imposta pela legislação do lucro presumido, mas se, pura e simplesmente, o conceito de faturamento trazido pelo STF no Tema 69 poderia também ser aplicado neste contexto.

Considerando-se a vinculação por ratio deciendi, fosse esse fundamento do STJ aplicado de forma inversa, então o Tema 69 não poderia ser estendido às contribuições do PIS/Cofins apuradas dentro do regime cumulativo, isto porque, tal como no lucro presumido, é próprio dessa sistemática não se admitir a apuração de qualquer crédito sobre custos e despesas incorridas pelo contribuinte.

Publicidade

Das teses derivadas pendentes de apreciação no STF, a que tem possibilidades reais de gerar uma reviravolta na jurisprudência pacificada há 6 anos é aquela que guarda a quase total identidade com a apreciada no Tema 69, que é a exclusão do ISS da base de cálculo das contribuições ao PIS/Cofins.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Observe-se que, nesse caso, a única mudança ocorre quanto à titularidade do tributo, que deixa de ser estadual (ICMS) e passa ser municipal (ISS), diferença esta que, logicamente, não tem a potencialidade de alteração de qualquer entendimento, mas sob uma condição: rebus sic stantibus, expressão latina comumente usada por economistas para estabelecer ressalvas às suas projeções.

Ocorre que, como ressaltamos no início deste texto, o placar do julgamento do Tema 69 foi decidido por 6 a 4 a favor do contribuinte, com os ministros Carmen Lúcia, Rosa Weber, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Celso de Mello aderindo à tese, e refutando-a os ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, não tendo votado o ministro Alexandre de Moraes.

Note-se que, nesse placar, todos os ministros que votaram contra a tese ainda continuam em seus cargos, enquanto que, do outro lado, a maior parte já se aposentou ou irá se aposentar em breve, sendo que dois de seus substitutos serão, dentro dos próximos meses, escolhidos pelo presidente Lula, o qual defende abertamente a necessidade de elevação da arrecadação tributária.

Independentemente da existência de argumentos técnicos plausíveis contrários ao que foi decidido no Tema 69, é totalmente desaconselhável a alteração de um entendimento jurisprudencial tido como consolidado em um período tão curto de tempo, especialmente quando a matéria a ser julgada produz impactos diretos e imediatos sobre os custos de operação de negócios no Brasil. Se isso vier a ocorrer, o STF passará novo recado, do grande ao pequeno empreendedor, que a previsibilidade e a segurança jurídica passam longe deste país.

Publicidade

*Bruno Minoru Takii é sócio da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.