Em ato em Brasília, Bolsonaro faz discurso com ameaças ao Congresso e Judiciário

Presidente afirmou que 'ou o chefe desse Poder enquadra o seu' ou 'pode sofrer aquilo que não queremos'; ele não citou a quem se referia, mas fala remete ao STF; Bolsonaro afirma ainda que vai convocar o Conselho da República

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Por Redação
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BRASÍLIA - O presidente Jair Bolsonaro fez um discurso em tom de ameaça ao Judiciário e ao Congresso para manifestantes que se aglomeram na Esplanada dos Ministérios nesta terça-feira, 7. Sem citar diretamente a quem se referia, o presidente disse que "ou o chefe desse poder enquadra o seu ou esse poder pode sofrer aquilo que nós não queremos". Ele afirmou que vai convocar o Conselho da República e levar aos presidentes do Congresso, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, a "foto" do povo hoje nos atos.

O presidente disse que hoje começa um novo momento no País ao fazer um ultimato para os outros poderes. "A partir de hoje, uma nova história começa a ser escrita aqui no Brasil. Peço a Deus mais que sabedoria, força e coragem para bem decidir. Não são fáceis as decisões. Não escolham o lado do confronto. Sempre estarei ao lado do povo brasileiro”, afirmou o presidente, em cima de um carro de som, ao lado de alguns de seus ministros. O discurso não foi transmitido ao vivo, mas divulgado no Facebook do presidente pouco tempo depois.

O Conselho da República citado pelo presidente é um órgão superior de consulta do presidente da República, criado pela Lei 8.041 de 1990 para se pronunciar sobre intervenção federal, estado de defesa, estado de sítio e questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas.

O órgão é dirigido pelo presidente da República e composto também pelo vice-presidente da República, os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, os líderes da maioria e da minoria nas duas Casas, o ministro da Justiça e seis cidadãos brasileiros com idade superior a 35 anos. De acordo com a legislação, o Conselho da República se reunirá por convocação do presidente da República e suas audiências serão realizadas com o comparecimento da maioria dos conselheiros. 

Presidente Jair Bolsonaro se encontra com apoiadores na rampa do Palácio do Planalto. Foto: Marcos Corrêa/PR

A última vez que o órgão se reuniu foi em 2018, quando o então presidente Michel Temer determinou a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro. Procuradas, as assessorias de Pacheco, presidente do Senado, e da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), afirmaram que não foram convidados para qualquer reunião do conselho até o momento. Também integrante do grupo, o vice-presidente, Hamilton Mourão, tem agenda na Amazônia nesta quarta-feira, 8, e também não deve comparecer.

No discurso que fez a seus apoiadores, Bolsonaro disse que não poderia mais "aceitar que uma pessoa" continuasse "barbarizando nossa população", mas não citou nominalmente a quem se referia."Não podemos aceitar mais prisões políticas no nosso Brasil. Ou o chefe desse poder enquadra o seu ou esse poder vaisofrer aquilo que não queremos. Porque nós valorizamos, reconhecemos e sabemos o valor de cada poder da República", afirmou.

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"Um ministro do Supremo Tribunal perdeu as condições mínimas de continuar dentro daquele tribunal", disse. Manifestantes gritavam de volta "fora, Alexandre" neste momento, em referência a Alexandre de Moraes, que determinou a prisão de bolsonaristas nos últimos meses. Bolsonaro chegou a ingressar com um pedido de impeachment do ministro no Senado, que nem sequer foi analisado.

“Este retrato que estamos tendo neste dia, não é de mim nem de ninguém em cima deste carro de som. Este retrato é de vocês. É um comunicado, é um 'ultimato', para todos os que estão na Praça dos Três poderes, inclusive eu, presidente da República, de para onde devemos ir. Cada um de nós deve se curvar à nossa Constituição Federal. Nós temos essa obrigação: se queremos a paz e a harmonia, devemos nos curvar à nossa Constituição.”

Nos últimos dias, Bolsonaro e seus apoiadores vinham divulgando os protestos de 7 de Setembro como manifestações à favor da liberdade de expressão - o tema, no entanto, ficou praticamente ausente nas faixas dos apoiadores de Bolsonaro, que prometiam tentar invadir o prédio do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta terça. 

“O Brasil pede socorro!!! Queremos Tribunal Militar para Ministros do STF e (membros) do Congresso, Criminosos e todos os mergulhados em corrupção…”, dizia uma das faixas. “Só sairemos de Brasília quando nossa pauta for atendida”. “Destituição de todos os ministros do STF”, dizia outro cartaz. O pedido contradiz falas do próprio Bolsonaro, que disse no último domingo, dia 5, que os protestos eram apenas contra um ministro do STF, referindo-se a Alexandre de Moraes.

A Polícia Militar bloqueou o acesso dos manifestantes à Praça dos Poderes, onde ficam os prédios do STF e do Congresso. Em frente ao Palácio do Itamaraty, o mais próximo da sede do Supremo, um grupo de manifestantes insulflava a multidão para avançar contra a barricada da Tropa de Choque da Polícia Militar do DF, mas foram contidos. Um início de confusão, logo pela manhã, foi controlado após os policiais usarem spray de pimenta. A polícia não estimou quantos manifestantes participaram do ato em Brasília.

Na noite de segunda-feira, 6, um grupo de apoiadores do presidente chegou a furar o bloqueio de segurança montado pelo governo do Distrito Federal, em Brasília, e conseguiu entrar com carros e caminhões na Esplanada dos Ministérios. A circulação de veículos no local estava restrita desde esta madrugada como medida preventiva. Apenas a passagem de pedestres estava permitida.

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Em vídeos divulgados por apoiadores do presidente, é possível ver as pessoas retirando barreiras que haviam sido colocadas e um início de confronto com a polícia.  "Momento histórico do Brasil, a invasão em Brasília", diz um manifestante não identificado pela reportagem que filmou a ação do grupo. "Acabamos de invadir, a polícia não deu conta de segurar o povo. E nós vamos invadir o STF amanhã", afirma.  Com faixas e bandeiras a favor do governo, o grupo se dirigiu para áreas próximas aos prédios do Congresso e do Supremo, principais alvos dos manifestantes, mas foi contido antes de chegar à Praça dos Três Poderes. 

Repercussão

Embora não faça parte oficialmente do Conselho da República, o presidente do Supremo, Luiz Fux, disse, também por meio de sua assessoria, que não irá participar da reunião caso eventualmente seja convocado.

Sobre a fala de Bolsonaro na manifestação em Brasília, que foi carregada de ameaça ao Judiciário e ao Congresso, Fux disse que vai "aguardar São Paulo" e falar com os ministros mais tarde. Ainda hoje, Bolsonaro promete fazer "discurso robusto" no ato programado para ocorrer à tarde na Avenida Paulista, em São Paulo.

Um dos principais alvos da base bolsonarista nos protestos , Alexandre de Moraes pregou a defesa da democracia em postagem nas redes sociais.

“Nesse Sete de Setembro, comemoramos nossa Independência, que garantiu nossa Liberdade e que somente se fortalece com absoluto respeito a Democracia”, escreveu nas redes sociais. / André Shalders, Camila Turtelli, Daniel Weterman, Eduardo Rodrigues, Lauriberto Pompeu, Idiana Tomazelli, Weslley Galzo e  Amanda Pupo

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