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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

O artigo 19 do Marco Civil será inconstitucionalissimamente declarado inconstitucional?

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Por Redação
 Foto: arquivo pessoal.

Luis Fernando Prado, Sócio do escritório Prado Vidigal Advogados. LLM em Direito Digital e Sociedade da Informação pela Universidade de Barcelona. Pós-graduado em Propriedade Intelectual e Novos Negócios pela FGV SP

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O ano de 2023 tem sido ótimo para lembrarmos que, muito além da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), temos questões de igual importância a serem discutidas no campo do Direito & Tecnologia. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal (STF) convocou, para o dia 28 de março, audiência pública que, em síntese, debaterá sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que, respeitadas algumas exceções, dispõe que provedores de aplicações de internet (plataformas) somente poderão ser responsabilizados pelo conteúdo gerado por terceiros (usuários) se descumprirem ordem judicial específica para sua remoção.

Pouco questionada nos primeiros anos de vigência do Marco Civil da Internet (ano de 2014 e seguintes), a constitucionalidade do artigo 19 ganhou os holofotes mais recentemente, especialmente diante de aparente movimento político e legislativo que busca enrijecer as regras contra os grandes provedores de aplicação de internet que hospedam conteúdo de seus usuários.

Sou sensível ao debate. Entendo que o ritmo e intensidade de propagação da informação via redes sociais mudou a forma como vivemos em sociedade. Entendo os argumentos utilizados para criticar a forma como algumas organizações lidam com a remoção de conteúdo de terceiros na internet.  Entendo, aliás, que essas críticas sempre existirão, seja qual for a postura adotada pelos provedores (mais ou menos liberal).

Entendo que, em tempo de proliferação de fake news, cancelamentos e discursos de ódio por maus usuários, a discussão sobre a necessidade de adoção de mecanismos de moderação de conteúdo que mitiguem tais problemas sociais esteja acalorada.

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No entanto, não consigo entender, especificamente, os argumentos que são utilizados para defender a inconstitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, especialmente porque referido dispositivo:

(i) não veda/impede/obsta que conteúdo seja removido independentemente de ordem judicial, o que, inclusive, acontece a cada segundo nos casos de violação dos termos que regem o uso da aplicação;

(ii) garante aos usuários o inafastável protagonismo do Judiciário no julgamento de questões envolvendo eventuais conflitos de direitos fundamentais (i. e. direito à honra x liberdade de expressão), especialmente em situações limítrofes, em que não tenha sido verificada clara violação aos termos de uso da plataforma;

(iii) traz segurança jurídica à inovação, na medida em que ter de assumir risco jurídico decorrente da responsabilização por conteúdo de terceiro seria um cartão vermelho para startups/provedores menores; e

(iv) é fruto de amplo, extenso e exaustivo debate multissetorial que passou pela ponderação entre direitos fundamentais previstos em nossa constituição.

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Não bastasse, eventual declaração de inconstitucionalidade do artigo 19 traz consigo o inafastável risco de termos uma internet cada vez menos livre, plural e democrática, na medida em que o receio causado pela possível responsabilização por conteúdos de terceiro seria um convite para adoção de postura conservadora e restritiva por parte de provedores de aplicações de internet.

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Portanto, parece-me ser muito mais inconstitucional a sua derrubada que a sua manutenção, especialmente porque o artigo 19 é pedra basilar na sustentação dos direitos fundamentais da liberdade de manifestação e de expressão, além de ser garantidor de nível mínimo de segurança jurídica à inovação.

No mais, eventual declaração de inconstitucionalidade do artigo 19 não resolve o problema a que se propõe. Na verdade, o afastamento do Judiciário como julgador daquilo que deve ou não ser mantido no ar, especialmente nas frequentes situações em que alegadas infrações legais não restam claras, despertará ainda mais polêmicas e discordâncias em relação à conduta adotada pelas plataformas, o que repercutirá, inclusive, na esfera judicial.

Por ser sensível ao debate, reconheço que, após os lamentáveis fatos vividos em nosso País no dia 8 de janeiro, o calor das discussões chegou a outro patamar. Meu receio, no entanto, é de que o calor do momento esteja tão elevado que chegue a queimar, definitivamente, relevantes conquistas trazidas pelo Marco Civil da Internet na última década.

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