Justiça decreta sequestro de bens do PCC e de contador ligado a Lula

Bloqueio alcança R$ 45 milhões do contador João Muniz Leite, do traficante Anselmo Becheli Santa Fausta, o “Cara Preta”, e de seu sócio, Silvio Luiz Ferreira, o “Cebola”; advogado destaca que empresa de contador tem histórico de atuação ilibada e atende ‘mais de 100 clientes’

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Foto do author Luiz Vassallo
Por Marcelo Godoy e Luiz Vassallo
Atualização:

A 1ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Dinheiro da Justiça estadual de São Paulo determinou o bloqueio de R$ 45 milhões em imóveis e ônibus de integrantes do PCC e do contador João Muniz Leite, que foi responsável pelo Imposto de Renda do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, até hoje, cuida da contabilidade e divide sala com empresas do filho do petista, Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha.

João Muniz depõe para o juiz Sérgio moro no processo sobre o Tríplex, de Lula Foto: MPF

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O pedido foi feito pelo delegado Fernando Santiago, e endossado pelo Ministério Público Estadual de São Paulo. Além de Muniz, atinge o traficante de drogas Anselmo Becheli Santa Fausta, o Cara Preta, considerado um dos principais fornecedores de drogas do Primeiro Comando da Capital (PCC), e seu sócio, Silvio Luiz Ferreira, o “Cebola”, chefe da Sintonia do Progresso, o setor que cuida do tráfico doméstico mantido pela facção. Santa Fausta foi morto, em dezembro de 2021, em uma emboscada na zona leste.

A medida da Justiça atingiu 250 ônibus da UPBus, a empresa de ônibus comprada por Santa Fausta supostamente com o dinheiro lavado nas loterias. A UPBus mantém contrato de R$ 660 milhões com a Prefeitura de São Paulo e toma conta de 13 linhas de ônibus na zona leste. Além de Santa Fausta, Cebola, que está foragido, faz parte da diretoria da empresa. O sequestro dos ônibus e não das contas da empresa serviu para que ela não paralise seu funcionamento, prejudicando os usuários.

Em entrevista coletiva à imprensa, o delegado Fernando Santiago afirmou que, tirando as apostas vencedoras em valores de R$ 16 milhões, a compra de bilhetes de loteria era deficitária em relação aos prêmios. “Ele apostava um valor muito mais alto do que o valor do prêmio. Havia um prejuízo de 20% quando a gente compara o valor da aposta e o valor do prêmio. Qual era a vantagem disso? O dinheiro passava a ter uma origem”, diz.

Muniz teria começado a trabalhar para Santa Fausta em 2016, quando ajudou o traficante a abrir uma empresa com uso de um nome falso. As transações suspeitas envolvendo bilhetes de loteria foi identificada a partir do fim de 2020.

Coletiva que ocorreu nesta quinta-feira, 16, com o delegado Fernando Santiago, responsável pelo caso do contador do Lula acusado lavagem dinheiro com PCC, Rodolfo Miranda Foto: Werther Santana/Estadão

Segundo os últimos números da investigação, somente o contador teve R$ 5 milhões em bens bloqueados. Do total, R$ 1 milhão são apenas referentes aos valores de automóveis. No total, o bloqueio já alcançou R$ 45 milhões. “Eles não serão apreendidos para evitar a paralisação do funcionamento da empresa”, afirmou o delegado.

Lavagem

O contador é suspeito de ser o “operador de um complexo esquema de lavagem de dinheiro através de prêmios da Loteria Federal”. Como mostrou o Estadão, Muniz, ao lado da esposa, ganhou em loterias federais 55 vezes somente no ano de 2021. Segundo a contagem final da Polícia Civil, o montante lavado pelo contador em prêmios na loteria chegou aos R$ 40 milhões. Do total, R$ 16 milhões ficaram com o contador e o restante teria ficado com Santa Fausta. Em diversas ocasiões, os valores das apostas superavam o dos prêmios obtidos, com exceção de dois prêmios de R$ 16 milhões na Mega Sena.

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Familiares

O ex-presidente Lula não é alvo da investigação. Muniz é contador da família do ex-presidente até os dias atuais. Levam o logo da JML Assessoria Contábil e Fiscal os documentos de cadastro, na Junta Comercial de São Paulo, em fevereiro de 2022, da mais recente empresa criada por Lulinha, a LLF Tech Participações LTDA, sediada no apartamento onde o filho do ex-presidente reside. O imóvel está em nome do empresário Jonas Suassuna, que foi sócio de Lulinha e proprietário formal do sítio Santa Bárbara, em Atibaia, propriedade em razão da qual Lula foi processado na Lava Jato.

O advogado de João Muniz, Jorge Delmanto, afirmou ao Estadão que vai “acessar o processo”, para, então se manifestar sobre a investigação. “Adianto apenas que a empresa de Contabilidade tem mais de 30 anos de atuação, com mais de 60 funcionários e média de 1000 clientes ativos, sendo empresa voltada ao profissionalismo, legalidade, ilibada e com postura ética em todos os casos”, disse.

A reportagem procurou ainda a assessoria de Lula e a sua defesa e a de seu filho. O advogado Cristiano Zanin Martins, que defende Lula, disse não saber se Muniz ainda presta serviços para o petista. O criminalista Fábio Tofic, que defende Lulinha, não se manifestou. A defesa da família Santa Fausta e dos demais integrantes do PCC investigados pelo Denarc também não foi localizada pela reportagem.

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