A exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas virou um cabo de guerra entre os ministros Alexandre Silveira (Minas e Energia) e Marina Silva (Meio Ambiente). Enquanto a Petrobras defende o projeto, um parecer técnico do Ibama recomenda o indeferimento do pedido de licença ambiental feito pela companhia. A última palavra caberá ao instituto vinculado à pasta de Marina, que já deu sinais de qual será sua decisão.
Mesmo assim, o impasse que opõe duas áreas do governo deverá ser arbitrado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A ministra do Meio Ambiente definiu o projeto como “altamente impactante” e disse isso ao presidente da Petrobras, Jean Paul Prates.
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O Estadão apurou que em uma das reuniões com Prates, no dia 30 de março, Marina sustentou que o estudo não tinha viabilidade socioambiental, além de não estar alinhado com o programa de governo. Em entrevista ao site Sumaúma, Marina afirmou que vê o projeto para exploração de petróleo na foz do Amazonas “do mesmo jeito” que havia olhado para a polêmica construção da usina de Belo Monte.
No segundo mandato de Lula, em 2008, a hidrelétrica foi um dos motivos que levaram Marina a deixar o governo e a sair do PT – hoje, a ministra é filiada à Rede Sustentabilidade. À época, além do desgaste com Lula, ela entrou em confronto com a então titular da Casa Civil, Dilma Rousseff, eleita presidente dois anos depois.
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Agora, no entanto, a posição do Meio Ambiente é muito mais forte no governo. Depois que o assunto escancarou a rota de colisão entre Marina, Silveira e Prates, porém, a ministra preferiu o silêncio. Diagnosticada com covid-19 na semana passada, Marina estava internada desde sábado, 6, no InCor, em São Paulo, e recebeu alta nesta quarta-feira, 10.
O parecer técnico do Ibama, ao qual o Estadão teve acesso, pede que o processo de licenciamento ambiental para prospecção de petróleo na foz do Amazonas seja arquivado. O texto diz haver “inconsistências identificadas sucessivamente” e “notória sensibilidade socioambiental da área de influência e da área sujeita ao risco”, destacando a necessidade de “avaliações mais amplas e aprofundadas”.
O documento está sob análise de Rodrigo Agostinho, presidente do Ibama, instituto subordinado ao ministério comandado por Marina. De acordo com o texto, a Petrobras não conseguiu provar que teria condições de agir a tempo para mitigar danos de um eventual acidente com vazamento de óleo. Há grande preocupação ambiental por causa da riqueza de ecossistemas na região.
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Derrocada
Sete dias depois de receber, em 20 de abril, o parecer da área técnica do Ibama, Agostinho atendeu a um telefonema do ministro de Minas e Energia. Em tom diplomático, Silveira pediu que ele procurasse “uma solução” para o licenciamento. Argumentou que a exploração de petróleo na foz do Amazonas tem grande potencial de desenvolvimento econômico e é essencial para o futuro após o pré-sal. Na avaliação de Silveira, o veto ao projeto da Petrobras seria “uma grande derrocada” para o País.
“O ministro me ligou querendo saber, querendo entender o que estava acontecendo. Eu deixei claro para ele que as decisões tomadas pelo Ibama são técnicas. Disse que ainda não há uma decisão da instituição, mas que a equipe técnica já tem o entendimento de que faltam subsídios para a concessão da licença”, afirmou Agostinho.
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Ao Estadão, Silveira disse que avaliações técnicas do Ministério de Minas e Energia indicam ser possível o desenvolvimento sustentável na foz do Amazonas. “Não há motivos para não conceder o licenciamento ambiental”, destacou o ministro.
A queda de braço chegou ao Palácio do Planalto. Prates já conversou mais de uma vez sobre o assunto com Lula, que tem defendido com ênfase a agenda de proteção ao meio ambiente e aborda o tema em todas as viagens internacionais.
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O presidente da Petrobras alega, porém, nunca ter havido vazamento durante a atividade de perfuração em mar. Na avaliação de Prates, a exploração na margem equatorial é muito importante para a garantia da segurança e soberania energética nacional. “Seu potencial petrolífero tem sido corroborado por descobertas recentes feitas por outras empresas em regiões vizinhas, como Guiana, Guiana Francesa e Suriname”, disse ele.
A Petrobras busca licença para atividade de perfuração marítima no chamado Bloco 59, localizado a 179 quilômetros da costa do município de Oiapoque (AP), e assegura que todas as suas operações seguem “rigorosamente” as normas ambientais e de segurança. Os direitos exploratórios deste e de outros cinco blocos vizinhos foram adquiridos pela estatal em leilões da Agência Nacional de Petróleo (ANP), entre 2018 e 2020.
Rodrigo Agostinho, presidente do Ibama
Considerada como o “novo pré-sal”, a região constitui uma das cinco bacias da margem equatorial, que se estende do Amapá ao Rio Grande do Norte e fica próxima à fronteira marítima com a Guiana Francesa. O que está em jogo agora, na prática, é uma licença para perfuração, com o objetivo de averiguar o volume de petróleo disponível. Para a exploração em si, a Petrobras precisaria abrir um segundo pedido de licenciamento. O processo dura cerca de seis anos, ou seja, as plataformas começariam a operar perto de 2030.
Pressão
O gabinete de Marina enviou ofício ao Ibama, em 14 de março, contendo um abaixo-assinado “em defesa da biodiversidade e das comunidades indígenas e tradicionais da foz do Rio Amazonas”. O manifesto foi organizado pela ONG Coalizão Pelos Rios.
No dia 12 de abril, 80 organizações ambientais, entre elas a WWF-Brasil e o Observatório do Clima, entregaram uma nota conjunta aos ministérios de Minas e Energia, dos Povos Originários, de Pesca e Aquicultura, das Relações Exteriores e também ao Ibama, pedindo o arquivamento do processo de licenciamento do bloco. A principal reivindicação das entidades é que seja feita uma avaliação ambiental de área sedimentar, uma espécie de estudo estratégico para aprofundar o conhecimento sobre a região.
Ex-presidente do Ibama e especialista sênior de políticas públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo disse ao Estadão que a bacia da foz do Amazonas é uma região de alta biodiversidade, com presença de espécies ainda não catalogadas. A pesquisadora observou que, dada a correnteza no local, um eventual vazamento de óleo levaria menos de dez horas para alcançar águas internacionais, o que dificultaria a contenção da crise. Além disso, as condições da água naquela região dificultariam o deslocamento das equipes de suporte. Todos esses pontos são citados no parecer técnico.
Suely Araújo, ex-presidente do Ibama e especialista sênior de políticas públicas do Observatório do Clima
Quando presidia o Ibama, em 2018, Suely negou licença de operação para blocos vizinhos, na mesma região, para a francesa TotalEnergies, que detinha os direitos exploratórios daquela área, antes da Petrobras. “Acho bastante questionável como opção estratégica para o País abrir novas fronteiras de petróleo em áreas sensíveis para a produção, em 2030, numa época em que a tendência indica o petróleo caindo de importância no mundo”, disse a ex-presidente do Ibama.
Rede
Integrantes do partido de Marina defendem a saída da ministra do governo Lula caso o projeto seja aprovado. “Todo o mundo sabe que a coerência e a história de vida dela a impedem de permanecer em um governo que autoriza a perfuração de petróleo na Amazônia, isso não precisa ser dito”, afirmou um dirigente da sigla, que falou sob condição de anonimato.
“O governo não pode ser irresponsável e autorizar a exploração nessa região sabendo que isso pode ser um desastre de proporções mundiais. A ministra sabe disso, o Ibama sabe disso, e isso vai ter de ser dialogado internamente no governo”, disse.
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