Reação ao governo Lula veio rápida demais com movimento dos caminhoneiros

É um sinal de que a direita brasileira criada em função de Jair Bolsonaro está aí para ficar

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colunista convidado
Foto do author J.R.  Guzzo
Por J.R. Guzzo

O movimento dos caminhoneiros em apoio ao presidente Bolsonaro e contra o governo Lula, que vem deixando tão aflitas as almas progressistas, os jornalistas e os outros agrupamentos que ganharam a eleição presidencial, é primeiro conflito que o novo governo tem para enfrentar. Veio rápido demais – poucas horas depois de anunciado o placar final do TSE e dois meses inteiros antes de Lula assumir. É também um sinal, ou talvez se devesse dizer uma prova, de que a direita brasileira criada nos últimos anos em função de Jair Bolsonaro está aí para ficar. Não se trata, agora, de uma direita que faz discurso e age pouco, no estilo PSDB de fazer “oposição”. Os caminhoneiros são outro animal: o Brasil se inquieta de verdade, porque as suas ações mexem diretamente com necessidades básicas e interesses materiais da população. Estarão aí pelos próximos quatro anos; é bom começar a pensar como se vai lidar com isso. Os caminhoneiros não estão pedindo aumente no frete ou subsídio para o diesel – querem, agora, participar da política, e não vai dar para dizer a eles que, nesse caso, devem se contentar em concorrer a uma cadeira de deputado ou senador.

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A esquerda, os seus associados no sistema STF-TSE e demais forças a seu serviço estão jogando a solução desta dificuldade na repressão. Nada de “diálogo” ou de “negociação, como recomendam em 101% dos casos de conflito que envolvem as “categorias populares”. Aqui é pau direto. O que se quer não é algum tipo de entendimento como o adversário – é a sua eliminação. Manda a Polícia Rodoviária. Manda a PM. Manda a Tropa de Choque. Manda bomba de gás lacrimogêneo. Dá multa – já foram dados 18 milhões reais em multas até o momento – processa, prende; é assim que querem resolver o problema dos caminhoneiros – e, possivelmente, quaisquer outros problemas que aparecerem.

É natural. Sob o seu novo líder político e espiritual, o ministro Alexandre de Moraes, os esquerdistas brasileiros se acostumaram a agir cada vez como policiais, e estão encantados com isso – imaginam hoje que é a polícia, em vez dos proletários, a vanguarda da revolução socialista no Brasil. Acham que o novo enfoque pode dar certo e acabar deixando Lula e o PT para sempre na presidência. Contam, é claro, com a colaboração estreita da atual ditadura judiciária, que conseguiu anular as funções do Poder Executivo e do Congresso, e está governando o país com grupos da Polícia Federal; acabou, aliás, de ganhar a eleição presidencial que vai ficar conhecida como a “eleição do STF-TSE”. Mas a direita é uma realidade nova. Ela vai muito além dos caminhoneiros. Dá para fazer com que desapareça através de ordens do ministro Moraes?

Você pode tirar os caminhões das estradas; a PM não gosta de fazer isso, porque acha que deveria estar agindo contra criminosos, e não contra trabalhadores essenciais para o funcionamento do país, mas faz. Mais difícil é tirar a nova direita do Brasil. Vão por onde? Campos de “reeducação”? Há muito mais que caminhoneiro, aí; para começar, há uma parte considerável dos 58 milhões que votaram em Bolsonaro. Lula fez discursos dizendo que quer governar para “todos os brasileiros”, e não apenas para os que votaram ele; falta combinar com as vastas nações petistas que hoje operam na extrema esquerda, com Alexandre de Moraes e com o STF. Ninguém, aí, quer que Lula governe “para todos”; querem que os eleitores de Bolsonaro sejam destruídos, junto com os caminhoneiros e quem mais estiver criando problema. O mandamento principal da sua Bíblia; “Não podemos, de jeito nenhum, admitir a possibilidade de que eles voltem um dia para o governo.” Se não admitem a alternância de poder, qual o destino que reservam para os brasileiros que não concordam com eles?

Bloqueio na Raposo Tavares, em Sorocaba; movimento dos caminhoneiros é sinal, ou talvez se devesse dizer uma prova, de que a direita brasileira criada nos últimos anos em função de Jair Bolsonaro está aí para ficar.  Foto: José Maria Tomazela/Estadão - 01/11/2022

Fazer bloqueios de tráfego com caminhões impede todos os demais cidadãos, que não são caminhoneiros, de usarem estradas que são comuns; é uma violação do direito e ir e vir. Os caminhoneiros têm o direito de se manifestar e reivindicar como qualquer cidadão brasileiro, mas não podem tirar os carros e ônibus das estradas. Podem, por exemplo, fazer greves, deixando os caminhões nas garagens; seria interessante, aliás, saber o que os ministros do STF iriam fazer para resolver isso. No movimento atual, de qualquer forma, tem contra si a lei e a razão. Tudo bem: mas porque a esquerda, a mídia e as classes que aparecem na mídia dizem sistematicamente, sem variar as palavras, que estão praticando “atos antidemocráticos”, ou “ilegais”, que exigem punição, e não acham “atos antidemocráticos, nem “ilegais”, as invasões de terra pelo MST? Também não pode, pela lei. Mas aí é preciso “dialogar” – como o ministro Barroso acaba de decidir, ao exigir que todos os processos de reintegração de posse, inclusive os já encaminhados, têm agora de passar pelo exame prévio de “comissões”, com a participação de “todas as artes”, antes de seguir para juiz. É perseguição direta e imediata ao produtor rural, a ser destruído porque votou em Bolsonaro e irritou o ministro Barroso. É este o “governo para todos os brasileiros”?