Polícia prende 38 na Cracolândia e região e desmonta feira de drogas

Realizada após sete meses de investigação, megaoperação capturou dois homens importantes do PCC e apreendeu armas e crack; policiais lançaram bombas de efeito moral para dispersar usuários, que se espalharam pelo entorno

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Foto do author Marco Antônio Carvalho
Por Alexandre Hisayasu e Marco Antônio Carvalho
Atualização:
Polícia Civil realiza, na manhã deste domingo, 21, uma grande operação na região da Cracolândia, no centro de São Paulo Foto: WERTHER SANTANA/ESTADAO

SÃO PAULO - Um total de 900 policiais, entre civis e militares, realizaram na manhã deste domingo, 21, uma das maiores operações na Cracolândia e região contra o tráfico de drogas. Foram presos 38 traficantes – entre eles estão bandidos que foram filmados segurando armas no entorno, nas últimas semanas – e apreendidas diversas armas, como fuzis e submetralhadoras, além de uma quantidade de crack não divulgada. A polícia desmontou as 34 barracas da feira de drogas que funcionava na área e comercializava 19 quilos de crack por dia.

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As investigações que resultaram na megaoperação começaram a ser feitas pelo Departamento de Investigação Sobre Narcóticos (Denarc) em novembro, quando foram identificados os fornecedores de droga e as principais lideranças do Primeiro Comando da Capital (PCC) que atuavam na região. 

Às 6 horas, os PMs entraram na Cracolândia e avançaram com o apoio de dois helicópteros, cercando as saídas do quadrilátero formado por Alameda Dino Bueno, Rua Helvétia, Alameda Cleveland e Avenida Duque de Caxias. Foram lançadas bombas de efeito moral para dispersar os usuários de crack, que correram pelas ruas próximas, carregando seus pertences. Carros foram depredados, e o lixo acabou sendo espalhado pelas ruas.

Investigadores entraram em hotéis e estabelecimentos comerciais à procura de traficantes, armas e drogas. Não foram observados agentes de saúde ou da assistência social durante a ação policial, o que foi posteriormente justificado pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) como uma medida de segurança.  A operação ocorreu durante a Virada Cultural, que foi realizada também na região central da cidade

A Justiça havia expedido 69 mandados de prisão e cerca de 50 de busca e apreensão para a megaoperação. Do total de procurados, 28 foram detidos na Cracolândia e 10 em outros pontos. Entre os presos estão dois homens importantes do PCC, organização que controla o tráfico de drogas no Estado de São Paulo. Acusado de ser o responsável pelo abastecimento de crack na Cracolândia, Fabio Lucas dos Santos, o FB, foi capturado em Caraguatatuba, no litoral norte.

Também foi preso Leandro Monteiro Moja, o Léo do Moinho, que, segundo o Denarc, foi quem ordenou que traficantes matassem, na Cracolândia, o socorrista Bruno de Oliveira Tavares, no início do mês. Ele havia ido à região com o dono de uma clínica resgatar um usuário, mas acabou morto após ser confundido com um integrante do Comando Vermelho (CV), facção rival ao PCC. 

O representante comercial Marcos da Silva, de 33 anos, contou que acordou assustado com a polícia invadindo a pensão onde mora, na Rua Helvétia. Do lado de fora, ouvia as bombas que eram lançadas para dispersar as pessoas que estavam no fluxo. “Invadiram (a pensão), mas não acharam nada. Aí pediram desculpa e saíram”, contou.

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Apesar do susto, Silva acredita que a ação foi positiva e espera que os usuários de droga e traficantes não retornem para a região. “Isso aqui está um inferno pelo menos desde 2014. Preciso tomar remédio para dormir e não consigo sair de casa depois das 18h30, por medo.

É como viver no interior do inferno”, afirmou. A megaoperação foi encerrada às 8h30. O governador Geraldo Alckmin (PSDB) e o secretário de Segurança Pública, Mágino Alves Filho, participaram durante a manhã de uma reunião em uma unidade móvel dentro da Cracolândia. O prefeito João Doria (PSDB) também esteve no local após a ação.

Policiais civis e policiais militares do Comando e Operações Especiais (Coe) também cumprem mandados na Favela do Moinho, na região central Foto: GABRIELA BILO/ ESTADÃO

Ação acorda favela do Moinho

Chovia fino quando sete homens de farda camuflada, capacete e rostos cobertos por balaclavas (máscaras que deixam apenas os olhos visíveis) abriram caminho para a operação na Favela do Moinho, apontando fuzis para o alto dos barracos. Ligado ao 4.º Batalhão de Policiamento de Choque da Polícia Militar de São Paulo, o Comando e Operações Especiais (COE), unidade a qual pertencem os agentes, é especializado em ações de alto risco em áreas de difícil acesso. Atrás deles, mais de uma dezena de policiais civis tentava encontrar o endereço do alvo da ação naquele local: o traficante Leandro Monteiro Moja, o Léo do Moinho.

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Às 7 horas, a comunidade situada abaixo do Viaduto Engenheiro Orlando Murgel, no Bom Retiro, região central de São Paulo, começava a acordar quando se deparou com o aparato em frente ao seu acesso principal. Incêndios recorrentes nos últimos cinco anos testaram a resiliência dos moradores e atraíram atenção para o local. Ontem, os policiais avançaram rapidamente entre estreitas ruelas e inúmeros barracos rumo ao imóvel que procuravam: de alvenaria, era a maior casa do lugar. 

Da varanda, adultos e crianças ainda de pijamas se entreolhavam assustados enquanto os policiais subiam as escadas até alcançar o segundo e último andar do imóvel. Ainda sem reboco nas paredes externas, os tijolos expostos denunciavam uma recente reforma de ampliação de Léo para abrigar mais familiares.

Lá, os investigadores buscavam provas que reforçassem o elo do homem com a liderança responsável por distribuir drogas para a Cracolândia. Passaram por ali decisões de abastecimento e atuação da quadrilha para a área situada a não mais que um quilômetro de distância.

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Uma hora de buscas resultou em quase nada para a polícia. Léo já havia sido preso instantes antes em uma outra residência na zona oeste da capital, em outra operação da Polícia Civil. E as caras assustadas que, no início da manhã, arriscavam-se a abrir a janela para observar aquela estranha movimentação em uma manhã de domingo, no final da operação já pareciam demonstrar uma incomum familiaridade diante de um fuzil apontado para elas.

No fim, o cachorro, que desde o início acompanhara latindo toda a ação, se acalmara e uma mulher atravessava, carregando o pão francês da manhã, a guarda postada perto da trave sem rede do campinho da favela. 

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