AstraZeneca suspende testes de vacina contra covid por suspeita de reação adversa grave

Imunizante, desenvolvido em parceria com a Universidade de Oxford, estava em testes em vários países, incluindo o Brasil

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Foto do author Fabiana Cambricoli
Por Fabiana Cambricoli , Mateus Vargas e Tania Monteiro
Atualização:

A vacina contra covid desenvolvida pela Universidade de Oxford em parceria com a farmacêutica AstraZeneca, e que está sendo testada também no Brasil, teve seus estudos clínicos suspensos por suspeita de reação adversa grave em um dos voluntários participantes no Reino Unido.

De acordo com o jornal The New York Times, uma pessoa familiarizada com a situação disse, sob condição de anonimato, que o participante teve mielite transversa, uma síndrome inflamatória que afeta a medula espinhal e costuma ser desencadeada por infecções virais.

A previsão é produzir, inicialmente, 100 milhões de doses a partir de insumos importados Foto: Wilton Junior/Estadão

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A informação foi publicada na tarde desta terça-feira, 8, pelo site americano Stat News, especializado em notícias de saúde e ciência, e confirmada pelo Estadão com a AstraZeneca, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que tem parceria com a farmacêutica para produzir o imunizante.

A AstraZeneca afirmou que, ao realizar procedimento padrão de revisão, decidiu de maneira voluntária pausar a vacinação "para permitir a revisão dos dados de segurança por um comitê independente". Já havia acordo firmado entre o Ministério da Saúde e a AstraZeneca para que o imunizante fosse produzido no País após uma eventual aprovação. A fabricação seria possível graças a uma parceria para transferência de tecnologia para a Fiocruz.  No Brasil, os órgãos regulatórios responsáveis pelo acompanhamento das informações de segurança dos estudos clínicos são a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)

De acordo com a companhia, a interrupção é "uma ação rotineira que deve acontecer sempre que for identificada uma potencial reação adversa inesperada em um dos ensaios clínicos, enquanto ela é investigada, garantindo a manutenção da integridade dos estudos". Em grandes ensaios, ressalta a empresa, "os eventos adversos acontecem por acaso, mas devem ser revistos de forma independente para verificar isso cuidadosamente".

A AstraZeneca não detalhou qual foi o efeito colateral registrado nem quando ele ocorreu, mas afirmou estar "trabalhando para acelerar a revisão de um único evento para minimizar qualquer impacto potencial no cronograma do teste". A empresa disse ainda estar comprometida "com a segurança de nossos participantes e os mais altos padrões de conduta em nossos testes".

A vacina de Oxford está sendo testada no Brasil em cerca de 5 mil pessoas. Participam ainda dos estudos os Estados Unidos e a África do Sul, além do Reino Unido, primeiro país a testar o produto.

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O estudo brasileiro, iniciado em junho, está sendo coordenado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Procurada, a instituição informou que os testes foram suspensos em todos os centros no mundo, inclusive no Brasil, e afirmou que a pausa segue os padrões de segurança preconizados no protocolo do estudo da vacina de Oxford.

"Trata-se de uma prática comum em estudos clínicos envolvendo fármacos. O comitê de monitoramento de segurança do estudo analisa se o caso tem ou não relação com a vacina e, assim que a análise for concluída, a fase 3 deve ser retomada", disse a instituição, em nota.

A Unifesp informou ainda que o estudo no Brasil vinha avançando conforme o esperado. "Muitos (voluntários) já receberam a segunda dose e, até o momento, não houve registro de intercorrências graves de saúde", afirmou a universidade.

A Anvisa disse que aguarda mais informações da AstraZeneca para se pronunciar oficialmente sobre a interrupção dos estudos. Segundo fonte da agência, a AstraZeneca apenas enviou um comunicado sobre a interrupção, sem detalhar que tipo de efeito colateral foi notado em participante do estudo que travou os trabalhos. Técnicos da Anvisa, agora, buscam mais informações da AstraZeneca.

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"A decisão de interromper os estudos foi do laboratório, que comunicou os países participantes. A Anvisa já recebeu a mensagem e vai aguardar o envio de maisinformações para se pronunciar oficialmente", disse a Anvisa, em nota.

Já a Fiocruz também disse que foi informada pela AstraZeneca sobre a suspensão dos testes clínicos em fase 3 e destacou que irá acompanhar os resultados das investigações sobre possivel associação deefeito registrado com a vacina para se pronunciar oficialmente.

A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), responsável por garantir a segurança e direitos dos participantes de estudos com humanos no País, disse que realizou agora à noite audiência com pesquisadores do Brasil e dos Estados Unidos para obter mais detalhes sobre a decisão.

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"Foi uma medida de cautela. O comitê de segurança deve se reunir nós próximos dias para avaliar a continuidade da pesquisa", disse ao Estadão Jorge Venâncio, coordenador da Conep. Ele afirmou que os pesquisadores informaram à comissão detalhes sobre o tipo de reação adversa registrada, mas os dados são confidenciais.

Acordo com o Brasil

O acordo do governo brasileiro com a AstraZeneca garante acesso a 100 milhões de doses do insumo da vacina, das quais 30 milhões de doses seriam entregues entre dezembro e janeiro e 70 milhões, ao longo dos dois primeiros trimestres de 2021.

A decisão do laboratório britânico ocorre no dia em que o ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello, afirmou que em "janeiro a gente começa a vacinar todo mundo". O governo federal abriu crédito de cerca de R$ 2 bilhões para a Fiocruz receber, processar, distribuir e passar a fabricar sozinha a vacina.

Apesar de meses de negociação, o governo ainda não tem um contrato com a AstraZeneca, mas apenas um “memorando de entendimento”. O Estadão apurou que o Ministério da Saúde planejava assinar o contrato nesta quinta-feira, 10.  Em nota, o Ministério da Saúde informou que foi notificado pela AstraZeneca por e-mail. No texto, a pasta diz que "reforça o compromisso em garantir uma vacina segura e eficaz em quantidade para a população brasileira".

Os testes da vacina de Oxford e AstraZeneca são os que estão em estágio mais avançado no mundo. Os pesquisadores esperavam ter resultados parciais da fase 3, a última antes da comercialização, ainda em outubro.

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