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Obesidade grave em crianças pode reduzir expectativa de vida para 39 anos, aponta estudo

No Brasil, especialistas classificam a doença como uma epidemia; indivíduos obesos têm maior risco de desenvolver diversos tipos de doenças crônicas

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Foto do author Isabella Pugliese Vellani

Crianças com obesidade grave aos 4 anos de idade e que não perdem peso ao longo do tempo podem ter uma expectativa de vida de apenas 39 anos. É o que mostra uma pesquisa apresentada no último Congresso Europeu de Obesidade, que aconteceu entre os dias 12 e 15 de maio. A idade sugerida é pouco mais do que a metade da longevidade média no Brasil, que é de 72 anos para os homens e de 79 anos para mulheres, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No País, a doença é considerada uma epidemia pelos especialistas.

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O estudo, realizado pela consultoria alemã Stradoo GmbH, utilizou dados de 50 estudos clínicos existentes com cerca de 10 milhões de participantes do mundo inteiro para medir a obesidade grave com base no Escore-Z do Índice de Massa Corporal (IMC), que mostra os desvios-padrões para idade e sexo. Ainda, foram levadas em consideração quatro variáveis: idade de início da obesidade, duração da doença, gravidade do caso e uma medida dos riscos irreversíveis.

A conclusão da análise indicou que a enfermidade no grau mais grave desde a infância pode aumentar a probabilidade do desenvolvimento das chamadas doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), como diabetes do tipo 2, doenças cardiovasculares ou respiratórias, câncer e até mesmo problemas psicoemocionais, como depressão e ansiedade.

Crianças com obesidade severa aos 4 anos e que não emagrecem ao longo do tempo têm redução drástica na expectativa de vida, revela estudo Foto: Protsenko Dmitriy/Adobe Stock

Para Tulio Konstantyner, membro do Departamento Científico de Nutrologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), o resultado é justificável, considerando que a obesidade tem impactos no corpo todo. “Quanto mais intensa é a doença, mais consequências vão acontecer em longo prazo. Hoje, no Brasil, as DCNTs representam cerca de 70 a 80% das causas de morte. Por conta da obesidade, essas doenças aparecem antes, assim como as complicações. Consequentemente, o risco de morrer mais cedo é maior”, explica.

No Brasil, nas últimas décadas, a expectativa de vida melhorou. Em 2019, uma pessoa tinha a expectativa de viver até os 76,6 anos, em média (73,1 anos para homens e 80,1 anos para mulheres), de acordo com os dados do IBGE. Com a pandemia da covid-19, a expectativa de vida diminuiu, mas voltou a subir em 2022. Porém, Konstantyner alerta que a estatística pode cair novamente nos próximos anos, justamente por conta da obesidade. “Uma população mais doente tende a morrer mais. A obesidade está na contramão da saúde”, ressalta o especialista.

Fatores que contribuem para a obesidade infantil

O estilo de vida de uma criança impacta diretamente na probabilidade de desenvolver a obesidade. Entre os fatores mais importantes nesse sentido estão o consumo de alimentos de baixo valor nutricional e de alta densidade calórica, além da falta de uma prática regular de atividade física.

Lívia Lugarinho, endocrinologista e coordenadora do Departamento de Obesidade Infantil da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), faz questão de chamar a atenção para o uso de telas, que contribui para o comportamento sedentário. “É muito importante que as famílias incentivem a redução do tempo de tela e o acesso a atividades que envolvam exposição ao ar livre com outras crianças”, orienta. Além disso, ela lembra do papel da atividade física em ambientes escolares.

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Segundo Konstantyner, a prevenção da obesidade acontece desde a gestação e, por isso, é preciso ter um bom pré-natal. Por exemplo: o ganho de peso excessivo na gravidez ou uma alimentação de baixa qualidade nesse período contribuem para uma maior possibilidade de o bebê nascer obeso ou desenvolver obesidade ao longo da vida. A amamentação, por outro lado, surge como aliada na prevenção do quadro.

“A amamentação exclusiva até os 6 meses e, depois, de forma complementar até 2 anos ou mais, é uma estratégia importantíssima de prevenção da obesidade”, reforça o especialista da SBP. Ele observa que, embora as crianças tenham suas características genéticas, não é só isso que conta em termos de saúde. “Nos primeiros meses de vida, elas são programadas metabolicamente para o que serão no futuro” diz.

Tratamento

Nos casos mais severos da doença, o tratamento indicado é a cirurgia bariátrica. O procedimento é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas o jovem precisa ter, no mínimo, 16 anos e atender a determinados critérios. Nos outros casos, quando a cirurgia não é uma opção, Lívia afirma que existe um desafio: não há disponibilidade de medicações antiobesidade no SUS. Os remédios disponíveis são focados nas complicações, como diabetes e hipertensão. “O tratamento fica preso na mudança do estilo de vida”, conta.

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E mesmo quando se fala em mudança de estilo de vida, há vários desafios a serem superados. De acordo com a médica da Abeso, é preciso ter áreas adequadas para que crianças e adultos possam fazer uma atividade física com segurança, por exemplo.

Konstantyner frisa que a obesidade é o resultado de uma transformação social, com grande influência também da alta disponibilidade de alimentos que possuem elevados teores de sal, gordura e açúcar na composição. Em algumas escolas, ainda são oferecidos doces, refrigerantes e outros produtos alimentícios que promovem a obesidade infantil. Ele crê que aumentar os impostos para itens que não são saudáveis é uma medida essencial na tentativa de prevenção e controle da doença.

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