Dan Brown divulga primeiro capítulo de 'Origem'; leia

O quinto livro da série best-seller que tem o simbologista Robert Langdon como protagonista será lançado internacionalmente em 3 de outubro - tiragem brasileira será de 250 mil exemplares

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Foto do author Maria Fernanda Rodrigues
Por Maria Fernanda Rodrigues
Atualização:

O convite dizia: “Sábado à noite. Esteja lá. Confie em mim”. No envelope, uma passagem aérea, a reserva do hotel e um bilhete de um antigo aluno insistindo para que o famoso simbologista Robert Langdon viajasse a Bilbao. Langdon fez as malas com pressa e de repente estava na frente do Museu Guggenheim, sentindo-se um pouco ridículo com a gravata borboleta branca, a casaca preta e o colete branco que pegou por engano em seu armário achando que estaria levando seu smoking. 

Dan Brown situa sua obra em Barcelona e em outras cidades espanholas Foto: Quim Vives

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Como ele, centenas de pessoas importantes tinham sido atraídas à Espanha para ouvir a misteriosa revelação de Edmond Kirsch, conceituado cientista de computadores, futurólogo, inventor, empreendedor bilionário e colecionador de arte.

Assim o escritor americano Dan Brown dá início ao quinto livro de sua série best-seller que já vendeu, no mundo todo, 200 milhões de exemplares - só de O Código Da Vinci foram 80 milhões de cópias. Origem chega às livrarias pela Arqueiro no dia 3 de outubro, com tiragem inicial, aqui, de nada menos que 250 mil exemplares. Nesta quarta, 13, o autor divulgou o prólogo e o primeiro capítulo do livro (leia abaixo), onde lemos, também, sobre um encontro realizado um ano antes entre Langdon e Kirsch em que o ex-aluno, ateu, queria ouvir sobre Deus. 

Apaixonado pela cultura espanhola, Brown contou recentemente que a Espanha foi o primeiro país que conheceu – aos 16, ele fez intercâmbio nas Astúrias. Como queria escrever um romance que misturasse o antigo com o moderno, não teve dúvida: situou sua história lá. 

A aventura de Langdon começa, então, no prédio pós-moderno projetado por Frank Gehry, que o autor descreve como que “saído de uma alucinação alienígena”. Do museu com 30 mil placas de titânio, o leitor será levado a cenários como o Mosteiro de Montserrat, a Casa Milà (A Pedreira) e A Sagrada Família, em Barcelona, o Palácio Real de Madri e a Catedral de Sevilha, entre outros lugares. 

Como nos demais livros do autor, esses locais são peças-chave no enredo – no caso de Origem, é a tentativa do simbologista de salvar a descoberta de Kirsch, “algo que “promete abalar os alicerces de todas as religiões e mudar para sempre a face da ciência”, ou seja, a resposta às perguntas “de onde viemos?” e “para onde vamos?”.

A noite em que ele está prestes a revelar isso se transforma num caos. Diante de uma ameaça iminente, Langdon foge com Ambra Vidal, diretora do museu, e, juntos, partem para Barcelona à procura de uma senha que ajudará a desvendar o segredo de Kirsch. Em meio a fatos históricos ocultos e extremismo religioso, eles lutam contra um inimigo onisciente e a jornada da dupla é marcada por obras de arte moderna, símbolos enigmáticos e pistas que vão deixá-los cara a cara com uma “verdade espantosa”, informa a editora.

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Leia o primeiro capítulo de 'Origem'

O professor Robert Langdon olhou para o cachorro de 12 metros sentado na praça. O pelo do animal era um tapete vivo de grama e flores perfumadas.

Estou tentando amar você, pensou. De verdade.

Refletiu um pouco mais sobre a criatura e depois continuou andando por uma passarela suspensa, descendo por uma ampla escadaria cujos degraus de tamanhos diferentes se destinavam a arrancar o visitante de seu ritmo e das passadas usuais. Missão cumprida, decidiu, quase tropeçando duas vezes nos degraus irregulares.

Na base da escada parou bruscamente, olhando um objeto enorme.

Agora vi tudo.

Uma altíssima viúva-negra se erguia à frente dele, com as finas patas de ferro sustentando o corpo volumoso a pelo menos nove metros de altura. Da barriga da aranha pendia um saco de ovos feito de tela de arame, cheio de globos de vidro.

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– O nome dela é Mamãe – disse uma voz.

Langdon baixou o olhar e viu um homem magro parado embaixo da aranha. Ele usava um casaco indiano de brocado preto e tinha um bigode enrolado para cima, quase cômico, estilo Salvador Dalí.

– Meu nome é Fernando – continuou ele – e estou aqui para lhe dar as boas-vindas ao museu. – O homem olhou para uma fileira de crachás na mesa à frente. – Poderia me dizer seu nome, por favor?

– Certamente. Robert Langdon.

Os olhos de Fernando se ergueram de novo, bruscamente.

– Ah, sinto muito! Não o reconheci, senhor!

Eu mesmo mal me reconheço, pensou Langdon, avançando rigidamente com sua gravata-borboleta branca, a casaca preta e o colete branco. Estou parecendo um almofadinha. A casaca clássica de Langdon tinha quase 30 anos, preservada desde os dias do Ivy Club em Princeton. Mas, graças à fiel rotina de natação diária, a roupa ainda servia bastante bem. Na pressa para fazer as malas tinha pegado a sacola errada no armário, deixando para trás o smoking usual.

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– O convite recomendava traje a rigor, preto e branco – disse Langdon. – Imagino que a casaca seja apropriada, não?

– Casacas são clássicas! O senhor está muito vistoso! – O homem se aproximou rapidamente e prendeu um crachá na lapela de Langdon. – É uma honra conhecê-lo. Sem dúvida já nos visitou antes, não é?

Langdon olhou através das patas da aranha para o prédio reluzente diante deles.

– Na verdade fico sem graça em dizer, mas nunca estive aqui.

– Não! – O homem fingiu desmaiar. – O senhor não é fã de arte moderna?

Langdon sempre havia gostado do desafio da arte moderna, principalmente de explorar o motivo para determinadas peças serem saudadas como obras- -primas: as pinturas de tinta espirrada de Jackson Pollock; as latas de sopa Campbell de Andy Warhol; os retângulos de cor de Mark Rothko. Mesmo assim ficava muito mais confortável discutindo o simbolismo religioso de Hieronymus Bosch ou as pinceladas de Francisco de Goya.

– Sou mais classicista – respondeu. – Costumo me sair melhor com Da Vinci do que com De Kooning.

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– Mas Da Vinci e De Kooning são tão semelhantes!

Langdon sorriu, paciente.

– Então, sem dúvida, preciso aprender um pouco sobre De Kooning.

– Bom, então veio ao lugar certo! – O homem ergueu o braço na direção do edifício enorme. – Neste museu o senhor vai encontrar uma das melhores coleções de arte moderna da Terra! Espero que goste.

– É o que pretendo – respondeu Langdon. – Só gostaria de saber por que estou aqui.

– O senhor e todo mundo! – O homem sorriu alegremente, balançando a cabeça. – O seu anfitrião foi muito sigiloso quanto ao objetivo do evento desta noite. Nem mesmo os funcionários do museu sabem o que vai acontecer. O mistério é parte da diversão: os boatos correm à solta! Há várias centenas de convidados lá dentro, na maioria rostos famosos, e ninguém tem nenhuma ideia do que está na programação desta noite!

Agora Langdon riu. Muito poucos anfitriões teriam a bravata de enviar convites de última hora dizendo essencialmente: Sábado à noite. Esteja lá. Confie em mim. E um número ainda menor seria capaz de convencer centenas de pessoas importantes a largar tudo e viajar para o norte da Espanha para comparecer ao evento.

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Langdon saiu de baixo da aranha e continuou pelo caminho, olhando um enorme estandarte vermelho que se enfunava no alto.

UMA NOITE COM EDMOND KIRSCH

Sem dúvida, Edmond nunca sofreu de falta de confiança, pensou, achando divertido.

Cerca de 20 anos antes, Eddie Kirsch tinha sido um dos primeiros alunos de Langdon na Universidade de Harvard – um gênio da informática com cabelos de esfregão, cujo interesse por códigos o levou a fazer um curso com Langdon no primeiro ano: Códigos, Cifras e a Linguagem dos Símbolos. A sofisticação do intelecto de Kirsch impressionou profundamente o professor, e ainda que o jovem tivesse abandonado o poeirento mundo da semiótica em troca da promessa luminosa dos computadores, ele e Langdon haviam desenvolvido um elo entre aluno e professor que os manteve em contato durante as duas últimas décadas, desde a formatura de Kirsch.

Agora o aluno suplantou o professor, pensou Langdon. Em vários anos-luz.

Hoje em dia Edmond Kirsch era um pensador independente, de fama mundial: cientista de computadores, futurólogo, inventor e empreendedor bilionário. Aos 40 anos, era pai de uma variedade espantosa de tecnologias avançadas que representavam saltos importantes em campos diversos como robótica, ciência do cérebro, inteligência artificial e nanotecnologia. E as previsões acuradas sobre futuros progressos científicos haviam criado uma aura mística ao seu redor.

Langdon suspeitava que a incrível capacidade de prognósticos de Edmond resultava de seu conhecimento espantosamente amplo do mundo. Desde que podia recordar, o sujeito havia sido um bibliófilo insaciável: lia tudo o queestivesse ao seu alcance. A paixão pelos livros e sua capacidade de absorver os conteúdos ultrapassavam tudo o que Langdon jamais havia testemunhado.

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Nos últimos anos Kirsch vivia principalmente na Espanha, e atribuía essa escolha a um contínuo caso amoroso com o charme de mundo antigo do país, com a arquitetura de vanguarda, os bares e o clima perfeito.

Uma vez por ano, quando Kirsch voltava a Cambridge para falar no Media Lab do MIT, Langdon fazia uma refeição com ele num dos novos lugares da moda, do qual nunca tinha ouvido falar. As conversas nunca eram sobre tecnologia; Kirsch só queria falar com Langdon sobre arte.

– Você é minha conexão com a cultura, Robert – Kirsch costumava brincar. – Você é meu bacharel particular, um sujeito que só se casou com as artes!

A cutucada brincalhona no estado civil de Langdon era particularmente irônica vinda de um colega solteirão que denunciava a monogamia como “uma afronta à evolução” e fora fotografado com uma enorme variedade de supermodelos no decorrer dos anos.

Considerando a reputação de Kirsch como inovador na ciência da computação, seria fácil imaginá-lo como um geek com a camisa abotoada até o colarinho. Mas em vez disso ele havia se tornado um moderno ícone pop que circulava entre celebridades, vestia-se nos estilos mais atuais, ouvia música underground desconhecida e colecionava uma infinidade de caríssimas obras de arte impressionistas e modernas. Kirsch costumava mandar e-mails para Langdon, pedindo conselho sobre novas obras que estava avaliando para sua coleção.

E depois fazia exatamente o oposto do aconselhado.

Cerca de um ano antes ele tinha surpreendido Langdon perguntando não sobre arte, mas sobre Deus – um assunto estranho para quem se proclamava ateu. Diante de um prato de costeletas no Tiger Mama de Boston, fez indagações detalhadas sobre as crenças básicas de várias religiões mundiais, em particular sobre as diferentes histórias da Criação.

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Langdon lhe deu uma visão geral sólida sobre as crenças atuais, desde a narrativa do Gênesis compartilhada pelo judaísmo, o cristianismo e o islamismo até a história hindu de Brama, o conto babilônico de Marduk e outras.

– Estou curioso – disse Langdon enquanto saíam do restaurante. – Por que um futurólogo se interessa tanto pelo passado? Quer dizer que nosso famoso ateu finalmente encontrou Deus?

Edmond riu alto.

– Pode sonhar! Só estou avaliando minha concorrência, Robert.

Langdon sorriu. Típico.

– Bom, ciência e religião não competem, são duas linguagens diferentes tentando contar a mesma história. Neste mundo há espaço para as duas.

Depois desse encontro, Edmond ficou sem fazer contato por quase um ano. E então, do nada, três dias antes, Langdon recebeu um envelope da FedEx com uma passagem de avião, uma reserva de hotel e um bilhete escrito à mão insistindo que ele fosse ao evento dessa noite. Dizia: Robert, seria importantíssimo para mim que você, especialmente, pudesse comparecer. Suas ideias durante nossa última conversa ajudaram a tornar essa noite possível.

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Langdon ficou pasmo. Nada naquela conversa parecia nem de longe relevante para um evento apresentado por um futurólogo.

O envelope continha ainda uma imagem em preto e branco de duas pessoas frente a frente. Kirsch tinha escrito um pequeno poema para Langdon.

Robert, Quando estivermos cara a cara, revelarei o vazio que nos separa. – Edmond

Langdon sorriu ao ver a imagem: uma inteligente alusão a um episódio em que estivera envolvido anos antes. A silhueta de um cálice, ou Graal, revelada no espaço vazio entre os dois rostos.

Agora Langdon estava diante desse museu, ansioso para saber o que seu ex-aluno iria anunciar. Uma brisa suave agitava as abas da casaca enquanto ele andava pelo caminho de cimento à margem do sinuoso Rio Nervión, que já fora a principal artéria de uma próspera cidade industrial. O ar tinha um vago cheiro de cobre.

Enquanto virava uma esquina, Langdon finalmente se permitiu olhar o museu enorme e reluzente. Era impossível captar toda a estrutura de uma vez. Por isso seu olhar ia e voltava por toda a extensão daquelas formas bizarras, alongadas.

Este edifício não viola simplesmente as regras, pensou. Ele as ignora por completo. É um local perfeito para Edmond.

O Museu Guggenheim de Bilbao, na Espanha, parecia algo saído de uma alucinação alienígena: uma colagem rodopiante de formas metálicas retorcidas que pareciam ter sido encostadas umas nas outras de modo quase aleatório. Estendendo-se até a distância, a massa caótica era coberta por mais de 30 mil placas de titânio que brilhavam como escamas de peixe e davam à estrutura uma sensação ao mesmo tempo orgânica e extraterrestre, como se um leviatã futurista tivesse se arrastado da água para tomar sol à margem do rio.

Quando o edifício foi inaugurado em 1997, a revista The New Yorker saudou seu arquiteto, Frank Gehry, como tendo desenhado “um fantástico navio de sonho, de formas onduladas, sob uma capa de titânio”, e outros críticos alardearam: “O edifício mais incrível do nosso tempo!”, “Brilho mercurial!”, “Espantoso feito arquitetônico!”.

Desde a inauguração do museu, dezenas de outros edifícios “desconstrutivistas” tinham sido erguidos: o Walt Disney Concert Hall em Los Angeles, o BMW World em Munique e até a nova biblioteca da universidade de Langdon. Cada 22 um desses tinha projeto e construção que fugiam radicalmente das convenções, no entanto Langdon duvidava que algum deles pudesse competir com o Guggenheim de Bilbao por sua pura capacidade de chocar.

Enquanto Langdon se aproximava, a fachada coberta de placas parecia se alterar a cada passo, oferecendo uma nova personalidade de cada ângulo. Agora a ilusão mais dramática do prédio ficava visível. Incrivelmente, a partir dessa perspectiva, a estrutura colossal parecia literalmente flutuar acima da água, à deriva num vasto lago de “horizonte infinito” cujas ondas fracas batiam contra as paredes externas do museu.

Langdon parou um momento para se maravilhar com esse efeito e depois começou a atravessar o lago pela ponte minimalista que fazia um arco sobre a água. Estava na metade do percurso quando um sibilo alto o espantou. O som emanava de baixo dos seus pés. Parou justo quando uma nuvem em redemoinho começou a sair de baixo da passarela. O denso véu de névoa subiu ao redor e se espalhou pelo lago, rolando na direção do museu e engolfando a base de toda a estrutura.

A Escultura de Névoa, pensou.

Tinha lido sobre essa obra da artista japonesa Fujiko Nakaya. A “escultura” era revolucionária por ser construída com o ar visível, uma parede de neblina que se materializava e se dissipava com o passar do tempo; e como as brisas e as condições atmosféricas jamais eram idênticas de um dia para o outro, a obra era diferente a cada vez que aparecia.

A ponte parou de sibilar e Langdon viu a parede de névoa se acomodar em silêncio sobre o lago, fazendo redemoinhos e se arrastando como se tivesse vontade própria. O efeito era ao mesmo tempo etéreo e desorientador. Todo o museu parecia pairar sobre a água, repousando sem peso numa nuvem – um navio fantasma perdido no mar.

Justo quando Langdon ia andar de novo, a superfície plácida da água foi despedaçada por uma série de pequenas erupções. De repente cinco colunas de fogo dispararam para o alto, saindo do lago, trovejando como foguetes que rasgavam o ar enevoado e lançavam brilhantes jorros de luz nas placas de titânio do museu.

O gosto arquitetônico de Langdon tendia mais para o estilo clássico de museus como o Louvre ou o Prado. Mas, olhando a névoa e as chamas pairarem sobre o lago, não conseguia pensar num local mais perfeito do que esse museu ultramoderno para um evento programado por um homem que amava a arte e a inovação e que vislumbrava o futuro com tanta clareza.

Agora, atravessando a névoa, seguiu até a entrada do museu – um agourento buraco negro na estrutura reptiliana. À medida que se aproximava, teve a sensação inquietante de entrar na boca de um dragão.”

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