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Opinião|Um Dia Nossos Segredos Serão Revelados

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio

 

Há filmes que chamam a atenção já pelo título. É o caso do alemão Um Dia Nossos Segredos Serão Revelados, de Emily Atef. Que segredos serão esses? Veremos ao longo da história (se é que...). 

Tudo se passa em 1990. Há pouco caiu o Muro de Berlim, que separava as duas Alemanhas, e era emblema da Guerra Fria. Chegou o tempo de reunificação do país. Maria (Marlene Burow) tem 19 anos e mora com a família do namorado, numa fazenda. Gosta de livros e não larga seu Dostoievski - o de Irmãos Karamazov. 

 

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Maria não parece uma sonhadora, mas acaba por se encantar com o vizinho, Henner (Felix Kramer), um homem de 40 anos, que parece o oposto de seu noivo. É quase um protótipo de homem másculo e um tanto primitivo. Vai logo encostando a mão na moça, sem cerimônias. O desejo nasce entre eles. E, como sabe a psicanálise desde sempre, com o desejo ninguém pode. 

A história, de qualquer forma, é o desdobramento dessa paixão assimétrica. A jovenzinha e o homem maduro. A moça educada e o bruto. Em paralelo, os desafios e contradições da reunificação do país. Um dos filhos da família vem da Alemanha Ocidental, com seus signos de progresso, tais como eletrodomésticos que facilitam a vida das mulheres. Mas também os inconvenientes da competição acirrada pela vida, etc. 

O filme se desdobra e evolui, porém negando alguns dos clichês expostos acima. Henner, o quarentão que se envolve com a quase adolescente Maria, é também um homem sofrido, com traumas próprios, que teve uma infância difícil. Lê também. Gosta de poesia. Mostra-se capaz de expor sensibilidades e fragilidades insuspeitas. Como conciliar tudo isso com a imagem-clichê de macho alfa, abusador e abrutalhado? Maria, por sua vez, é uma mulher ativa e altiva, a ponto de abandonar o noivo boa gente e o casamento promissor por uma aventura de fim incerto. Como se presta, então, a, no assim chamado paroxismo amoroso, dizer ao amante: "Faça de mim o que quiser" ?

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Ora, a vida é complexa e o cinema tem que se virar para dar conta de suas contradições - em especial neste nosso tempo medíocre, em que cada palavra, gesto ou opinião devem ser calculados para não provocar reações adversas, como se todo e qualquer ser humano devesse ser um modelo de comportamento e coerência. Que fantasia!

Ponto, portanto, para a diretora Emily Atef que, ao invés de livrar-se das tais contradições, as aprofunda nessa história envolvente e bem filmada. O sexo e a paixão estão na tela, no calor dos movimentos e dos corpos. Dores e baixezas também. Dor e paixão de viver. Tudo junto e muito humano, afinal de contas. 

Opinião por Luiz Zanin Oricchio

É jornalista, psicanalista e crítico de cinema

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