Nova peça de Felipe Hirsch faz um caleidoscópio visual e sonoro da Avenida Paulista

Espetáculo estreia neste sábado, 15, no Teatro do Sesi, com direção de arte e cenografia de Daniela Thomas e Felipe Tassara e músicas criadas por Arnaldo Antunes e outros grandes artistas de São Paulo

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Foto do author Ubiratan Brasil

Quando encerrou a jornada da peça Temporada de Gripe, em 2005, o diretor Felipe Hirsch descobriu-se sensibilizado pelos fortes temas do texto de Will Eno como a falência da criação e a corrosão do amor. Buscou, então, uma montagem que investigasse o contrário e o resultado foi Avenida Dropsie, um dos mais elogiados entre os 60 trabalhos de sua carreira. Inspirado no traço do grande quadrinista americano Will Eisner (1917-2005), o espetáculo descrevia o cotidiano feliz e trágico dos moradores de uma avenida do Bronx americano, situação habitualmente invisível aos olhos dos moradores de grandes cidades.

Passados 20 anos, Hirsch manteve sua preocupação com a condição humana ao criar Avenida Paulista, da Consolação ao Paraíso, peça inédita que oferece um retrato da inquietude da principal avenida de São Paulo e que estreia no Teatro do Sesi-SP no sábado, dia 15. Agora, ele desloca seu olhar dos cortiços do Bronx no começo do século 20 para o prédio do Conjunto Nacional, um dos símbolos da Paulista e cujos três andares são recriados de forma grandiosa por Daniela Thomas e Felipe Tassara, responsáveis pela direção de arte e cenografia.

Peça Avenida Paulista fica em cartaz no Teatro do Sesi até junho Foto: Helena Wolfenson/Divulgação

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”Foram várias versões de cenário - pensamos até na passagem subterrânea próxima da Rua da Consolação -, mas percebemos que o Conjunto Nacional é perfeito”, comenta Daniela. “É um edifício multifuncional. No térreo, há uma galeria comercial aberta, que permite chegar às três ruas que formam a quadra com a Paulista. Também há uma belíssima rampa em formato de caracol que dá acesso aos primeiros andares. Por fim, o prédio que tanto é comercial como residencial. Sem se esquecer do relógio luminoso no topo do edifício, que pode ser visto de vários pontos da cidade. O Conjunto Nacional é uma cidade.”

É nesse cenário com mais de 10 m de altura que 19 atores e músicos interpretam momentos que mostram o cotidiano de um centro urbano, palco de separações, solidão, pequenos furtos, alegres reencontros, situações que passam despercebidas pela maioria das pessoas. A grande riqueza corporal apresentada em Dropsie ganha aqui mais vigor para compor a memória da coletividade que marca a Avenida Paulista.

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”Além dos 20 anos da estreia de Avenida Dropsie, há também os 60 anos do Teatro do Sesi-SP, cuja história política e cultural é muito importante. As duas efemérides, aliadas ao fato de eu morar na região da Paulista desde 2005, me incentivaram a criar esse espetáculo sobre essa avenida que concentra um espectro democrático gigantesco de pessoas que vêm de todos os lugares da cidade”, diz Hirsch que, durante quatro meses, filmou, gravou, fotografou e, principalmente, ouviu histórias dos frequentadores dos 2,8 km da avenida inaugurada em 1891 para a criar dramaturgia da peça, que assina com Caetano Galindo, Guilherme Gontijo Flores e Juuar, além das sugestões do elenco.

Cena de 'Avenida Paulista, da Consolação ao Paraíso', de Felipe Hirsch Foto: Helena Wolfenson/Divulgação

Não se trata de um espetáculo com uma trama contínua, mas uma série de cenas que formam um caleidoscópio de pequenos retratos. Também não é cronológico, com saltos de tempo que permitem, por exemplo, a plateia ouvir tanto o trotar dos cavalos que transportavam as pessoas no século 19 como a reunião de nobres nos anos 1920 no Restaurante Trianon, onde hoje se localiza o Masp, para observar o distante bairro do Bixiga. Ou ainda escutar o pensamento dos viajantes que estão em um vagão do metrô no trecho que vai da Rua da Consolação até o Paraíso. “Gosto da mistura do som dos cavalos com a dos automóveis, provoca a sensação de estranheza de um tempo que esteve muito próximo de todos nós.”

Nos ensaios que realizou com a presença de público, Hirsch notou uma imediata identificação das pessoas com diversas histórias apresentadas. O que é reforçado pelas canções que transformam o espetáculo em um musical. Para compor a trilha dessa metrópole, o encenador convidou 15 artistas da cena paulista para criar canções inéditas. Assim, a trilha sonora é composta por música de Alzira E., Arnaldo Antunes, DJ K., Kiko Dinucci, Jéssica Caitano, Juçara Marçal, Maria Beraldo, Maria Esmeralda, Maurício Pereira, Negro Leo, Nuno Ramos, Rodrigo Campos, Rodrigo Ogi, Romulo Fróes e Tulipa Ruiz.

”Todos revelam diferentes sentimentos na forma de olhar a Paulista”, conta Maria Beraldo, também responsável pelos arranjos e a direção musical. “Jéssica, por exemplo, mostra a forte conexão de São Paulo com os migrantes nordestinos. Tulipa focou na estátua do Trianon, enquanto Maurício faz um passeio aéreo pela avenida até dar um zoom nos apartamentos e Rodrigo narra um fato corriqueiro, como cair e se machucar. Há desde rap a samba, sonoridades que caracterizam a Paulista”, afirma.

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A trilha sonora foi gravada e será lançada como disco em março e, no entender do encenador, deverá ser um marco. “Além de exibir uma riqueza melódica única, é um retrato da Avenida Paulista. Espero que, daqui a 20 anos, as pessoas continuem ouvindo e cantando essas músicas, algo que fazemos hoje com as trilhas de Calabar e Gota D’Água”, diz.

Além de Avenida Paulista, da Consolação ao Paraíso, título escolhido por trazer o sabor musical do teatro de revista, Hirsch também prepara uma instalação sobre a obra do escritor Dalton Trevisan para o Instituto Moreira Salles, além de participar do conselho que organiza a reedição da obra do Vampiro de Curitiba, morto no final de 2024 aos 99 anos, pela editora Todavia. E começa a rodar seu novo longa-metragem, com Wagner Moura, sobre a experiência do pedagogo Paulo Freire em Angicos, sertão do Rio Grande do Norte.

Avenida Paulista: Da Consolação ao Paraíso

  • Teatro do SESI-SP, no Centro Cultural Fiesp (Av. Paulista, 1313)
  • Temporada: 15/2 a 29/6. 5ª a sábado, às 20h; Domingo, às 19h
  • Duração: 3 horas (sem intervalo)
  • Classificação indicativa: 16 anos
  • Acessibilidade: Sessões com Libras e audiodescrição aos sábados e domingos
  • Os ingressos são gratuitos e devem ser reservados pelo Meu SESI

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