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CPI das Pirâmides Financeiras pede indiciamento de 45 pessoas, incluindo oito sócios da 123milhas

Entre os 45 nomes também aparecem Ronaldinho Gaúcho e o ‘Faraó das Bitcoins’; envolvidos negam irregularidades

Por Agência Câmara de Notícias
Atualização:

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Pirâmides Financeiras aprovou na segunda-feira, 9, o relatório final de 509 páginas proposto pelo relator, deputado Ricardo Silva (PSD-SP). O texto recomenda o indiciamento de 45 pessoas, incluindo oito sócios da 123milhas - entre eles, Ramiro Julio Soares Madureira e Augusto Julio Soares Madureira, que foram ouvidos pela CPI. A empresa anunciou em agosto a suspensão de pacotes de viagens de sua linha “Promo”, mais barata, que já tinham sido pagos pelos clientes.

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Segundo o relator, a 123milhas não se mostrou uma empresa de intermediação de milhas, mas uma empresa que dá prejuízo. “Essa empresa nunca daria certo. Eles mantinham a empresa aberta atraindo mais pessoas com gastos vultosos em publicidade, chegando à casa de bilhão, e também com empréstimos bancários, num clássico esquema de pirâmide. Pelas contas analisadas, a 123milhas operava sempre no vermelho, com tendência à insustentabilidade”, destacou Ricardo Silva.

A CPI também pediu o indiciamento, entre outros, de Glaidson Acácio dos Santos, conhecido como o “Faraó dos Bitcoins”, da GAS Consultoria; e do ex-jogador Ronaldinho Gaúcho e de seu irmão, o empresário Roberto de Assis Moreira, no caso da 18K Ronaldinho.

As sugestões de indiciamento ocorrem devido a “fortes indícios” de participação em esquemas de pirâmide financeira e pela prática de crimes como estelionato, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta, entre outros. Os 45 nomes sugeridos pelo relatório estão ligados às seguintes empresas:

  • 123milhas
  • Trust Investing
  • Binance
  • GAS Consultoria
  • OWS
  • Braiscompany
  • 18K Ronaldinho
  • MSK Investimentos
  • Rental Coins
  • RCX Group
  • Grow Up
  • Atlas Quantum
  • Indeal Consultoria e Investimentos

A CPI começou a funcionar no dia 13 de junho com o objetivo de investigar empresas que ofereciam a clientes investimentos em criptomoedas com promessas de rendimentos acima da média do mercado financeiro. Entre os anos de 2019 e 2022, clientes dessas empresas passaram a relatar dificuldades para acessar os rendimentos e até os valores inicialmente investidos. Os fatos levantaram suspeitas de se tratar de esquemas de pirâmides financeiras, que consistem na prática de atrair novos clientes para pagar os rendimentos dos mais antigos.

O relatório aprovado pelos deputados ainda propõe a aprovação de quatro projetos de lei:

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  • Que altera a Lei dos Crimes contra a Economia Popular e a Lei de Crimes Financeiros para criar definição específica para o crime de pirâmide financeira, com pena de 6 a 10 anos de reclusão e multa e, quando praticado com ativos virtuais, como criptomoedas, com pena de 8 a 12 anos e multa;
  • Que pretende regulamentar o funcionamento de programas de milhagem de empresas do setor aéreo;
  • Para regulamentar a publicidade de criptoativos realizada por influenciadores digitais;
  • Para regulamentar os requisitos para a autorização e o funcionamento dos prestadores de serviços de ativos virtuais, conhecidos pela sigla em inglês VASPs (virtual assets service provider), incluindo o pagamento de tributos no Brasil.

Presidente da CPI, o deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ) ressaltou que mais de 3 milhões de brasileiros foram lesados por esquemas de pirâmides nos últimos anos, com valores que superam R$ 100 bilhões. “A gente tem que votar com urgência esses projetos para impedir a criação de novos sheiks, faraós e engomadinhos que retiram recursos da população”, disse o deputado, em entrevista coletiva.

Uma das propostas exige ainda que as transferências de recursos entre usuários e prestadores de serviços sejam feitas por meio de contas de depósito ou de pagamento individualizadas, para evitar que o patrimônio de sócios e clientes se misture.

“Nós nos deparamos com muitas corretoras de criptoativos que não fazem a chamada segregação patrimonial. Elas utilizam todo o dinheiro em uma conta só, o que é um facilitador do crime de lavagem de dinheiro e de pirâmides financeiras”, afirmou o relator.

Recomendações

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O relatório final traz ainda sugestões do deputado Alfredo Gaspar (União-AL) para que o Ministério Público Federal (MPF) apure especificamente as condutas praticadas pelas empresas Binance – maior exchange global do segmento de venda de ativos digitais no Brasil – e Infinity Asset.

No caso da Binance, Gaspar recomenda que a empresa seja investigada por possíveis infrações à ordem econômica, incluindo os crimes de sonegação e evasão fiscal, lavagem de dinheiro e financiamento ao crime organizado e ao terrorismo. Em relação à Infinity Asset, a documentação recebida pela CPI sugere que houve movimentação atípica em fundos geridos pela empresa.

CPI das Pirâmides Financeiras concluiu os trabalhos com aprovação de relatório final do deputado Ricardo Silva.  Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados

A CPI também decidiu encaminhar ao MPF todas as informações coletadas em depoimentos e documentos em quase cinco meses de investigação, incluindo as quebras de sigilo. Para garantir o ressarcimento às vítimas das fraudes, o colegiado sugere ao MPF que considere a possiblidade de pedir o sequestro de bens dos indiciados na investigação parlamentar.

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A CPI apresenta ainda recomendações administrativas a órgãos como a Receita Federal do Brasil (RFB), o Banco Central, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon).

À Receita Federal, por exemplo, o colegiado sugere a instauração de processo administrativo sobre o recolhimento de impostos por prestadores de serviços de ativos virtuais estrangeiros que atuam no Brasil.

O relatório conclui que é necessário exigir dessas exchanges os tributos relacionados às intermediações realizadas no Brasil (IRPJ, CSLL, PIS, Cofins e IOF). “Elas se beneficiam dos bilhões de reais transacionados anualmente em suas operações no País junto a consumidores brasileiros”, diz o relatório.

A CPI recomenda também o aprofundamento das investigações de mais de 20 outras empresas por possíveis condutas ilícitas.

Outro lado: 123milhas

Procurada, a 123milhas informou que nega veementemente que tenha atuado como pirâmide financeira ou que sua atuação possa sequer ser comparada à de uma instituição financeira. Em nota, a empresa aponta que atua há mais de 14 anos no mercado de viagens e turismo e realizou mais de 18 milhões de embarques ao longo de sua existência, tendo sido responsável, em 2021, por 10% de todos os embarques realizados no Brasil.

“É leviana ainda a afirmação de que sócios e parentes realizaram movimentações financeiras ilícitas ou ocultação de patrimônio, assim como as acusações infundadas sobre as condições financeiras da empresa nos últimos quatro anos. Seus balanços, declarações fiscais sempre foram transparentes, legítimos e regulares”, disse a empresa.

A 123milhas afirma ainda que o produto “Promo” foi criado em 2021, quando a empresa “tinha disponibilidade de caixa superior a R$ 100 milhões, como provam os documentos entregues à Justiça”, e que mais de 300 mil pessoas viajaram com passagens adquiridas da linha. Também diz que a empresa sempre dispôs de crédito e boa relação com as instituições bancárias, sem qualquer registro de empréstimos ou tomadas de valores atípicos para suas operações, e que seus gestores cooperam com as autoridades em um plano de recuperação que viabilize o mais rápido possível o cumprimento dos compromissos com credores e o restabelecimento das atividades da empresa.

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Outro lado: Glaidson Acácio dos Santos

Em depoimento à CPI das Pirâmides Financeiras, Glaidson Acácio dos Santos, conhecido como o “Faraó dos Bitcoins”, negou que a GAS Consultoria e Tecnologia, empresa na qual era presidente, funcionava como fachada para um esquema de pirâmide financeira. Ele está preso desde a primeira fase da Operação Kryptos, deflagrada pela PF em agosto de 2021.

Ele afirmou, no entanto, que a única garantia para o rendimento médio de 10% ao mês prometido aos clientes era “a experiência da empresa”. Glaidson explicou que os contratos firmados eram “invioláveis e irretratáveis” por 24 ou 36 meses, a fim de garantir uma “estratégia operacional responsável”, e ressaltou que os clientes não compravam criptomoedas especificamente, mas adquiriam os serviços de negociadores (traders) da empresa, que investiam em criptoativos com a promessa de entregar o retorno financeiro no prazo acordado.

Glaidson disse que a operação da PF impediu a GAS de honrar seus compromissos e afirmou ser possível retomar as atividades da empresa e pagar todos os clientes. “A empresa não deixou de pagar os seus clientes. Ela foi violada pela PF e paralisou suas operações”, disse. “A GAS nunca atrasou um dia em nove anos de operação. Sempre pagamos adiantado os nossos clientes. Desbloqueando os recursos que estão nas plataformas e pegando o que foi sequestrado pela PF, a GAS tem toda condição de retornar as atividades”, acrescentou.

Outro lado: Ronaldinho Gaúcho e o irmão

Também em depoimento à CPI, Ronaldinho Gaúcho e seu irmão, Roberto de Assis Moreira, negaram ser fundadores ou sócios da empresa 18k Ronaldinho Comércio e Participações Ltda, que fazia compra e venda de moedas bitcoins. “Os sócios de tal empresa são os senhores Raphael Horácio Nunes de Oliveira e Marcelo Lara Marcelino”, afirmou Ronaldinho. Os irmãos afirmaram que jamais foi autorizado o uso do nome e da imagem de Ronaldinho pela empresa.

Ronaldinho afirmou que, em 2016, foi realizado contrato com a empresa americana 18k Watch Corporation, para a criação de uma linha de relógios com a imagem dele. Já em julho de 2019, ele assinou contrato com a empresa brasileira 18k Watch Comércio Atacadista e Varejista de Negócios, de propriedade de Marcelo Lara, autorizando o uso de imagem para outros produtos além do relógio, mas esse contrato foi rescindido em outubro de 2019. “Esse contrato nem sequer chegou a ser executado”, alegou. Ele afirma que gravou propagandas apenas para os relógios.

Roberto de Assis Moreira admitiu que manteve contrato com as empresas 18K Watches, marca de relógios esportivos, 18K Corporation e 18K Marketing Multinível, sendo remunerado por royalties. Questionado sobre qual providência adotou diante de denúncias envolvendo a 18K Ronaldinho, que usava a imagem do seu irmão, ele afirmou que “ao ver que alguma coisa estava fora do que era o contrato pela venda de relógios e outros produtos”, ele decidiu rescindir o contrato “na mesma hora”. Ele reafirmou que as imagens foram usadas indevidamente, mas negou ter processado a 18K por isso.

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