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Sociedade merece saber por que vai pagar por novo programa automotivo, diz pesquisador da FGV

Iniciativa batizada de Mobilidade Verde e Inovação foi anunciada pelo governo na noite de sábado, 30; programa deve custar R$ 19,3 bilhões até 2028

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Por Luiz Guilherme Gerbelli
Atualização:
Foto: Fabio Motta/Estadão
Entrevista comArmando CastelarPesquisador associado do Ibre/FGV

Pesquisador associado do Ibre/FGV, Armando Castelar avalia que o novo programa de benefício tributário para o setor automotivo nasce sem um debate claro do governo com a sociedade. “Eu acho que o contribuinte merece ter uma justificativa melhor do motivo de arcar com essa conta”, afirma.

O programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover) foi criado por meio de medida provisória publicada no sábado, 30. Em 2024, o custo estimado é de R$ 3,5 bilhões e será bancado, em parte, pelo aumento do imposto de importação dos carros elétricos e híbridos. Até 2028, custará R$ 19,3 bilhões.

“Num certo sentido, quando vai se impor uma conta de R$ 19 bilhões ao contribuinte, deveria haver o cuidado para mostrar por que ele tem que pagar essa conta”, diz.

Faltou debate do governo com a sociedade no novo programa automotivo, diz Castelar Foto: Fabio Motta/Estadão

A seguir os principais trechos da entrevista.

Como o sr. avalia o pacote anunciado pelo governo?

São algumas coisas que me vem à cabeça. A primeira é por que uma medida provisória? A medida provisória, segundo a Constituição, pelo menos, é para coisas que são urgentes. É difícil entender a escolha de uma medida provisória, e não um projeto de lei para permitir uma discussão mais ampla. Senti um pouco falta de debater mais essa proposta na sociedade. Fica estranho uma medida provisória. Até a data é estranha.

É um setor que há 70 anos recebe incentivos do governo. É um programa que vem na sequência de outros dois, o Inovar Auto e o Rota 2030. E não tem uma avaliação clara: por que ainda há necessidade desse tipo de coisa e o que se aprendeu com os programas anteriores? O Ministério do Planejamento criou uma secretaria específica para a avaliação de projetos sociais. Se a gente vai fazer isso para projetos sociais, por que não vamos fazer para esse tipo de política também?

Faltou clareza com a proposta?

Faltou o mínimo de justificativa para a sociedade de por qual motivo ela vai incorrer nesse custo. Afinal de contas — e esse é outro comentário —, o governo tem batido muito na tecla de que tem de aumentar a receita tributária, mas faz um programa para reduzir a receita. Isso significa que ele vai cobrar imposto de alguém para pagar essa conta. Eu acho que o contribuinte merece ter uma justificativa melhor por qual motivo ele vai arcar com essa conta. Foi tudo feito de uma maneira que não permite o debate. Não se faz uma avaliação das políticas anteriores. Minha sensação é que faltou tudo isso. Num certo sentido, quando vai se impor uma conta de R$ 19 bilhões ao contribuinte, deveria haver o cuidado para mostra por que ele tem que pagar essa conta.

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E qual é a avaliação sobre o fato de ser um programa que foca na transição energética?

É o objetivo. Será que vai conseguir? Qual é a dimensão (dessa transição)? O que está colocado lá é a direção. Mas será que o tamanho do impacto justifica? Qual é o tamanho da transição? Por que (se escolheu) esse mecanismo e não outro? São várias perguntas. Você pode ter o mesmo objetivo e alcançá-lo de maneira diferente. E de novo: estão criando uma inconsistência na própria política do governo, que é a de reduzir isenções em outras áreas. São opções que estão sendo feitas e que precisam ser discutidas. Por que nesse setor ou não em outro? Fica pouco claro.

E por que esse setor consegue tantos benefícios?

É um setor superbem organizado. Em geral, setores que conseguem esse tipo de benefícios têm poucas indústrias, poucas empresas. Essa é uma razão pela qual você deveria avaliar o que foi feito, quais são as lições do passado e por que, depois de 70 anos de incentivo, continua sendo necessário o contribuinte arcar com uma conta desse tamanho.

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