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Economia e políticas públicas

Opinião|Brasil pode não estar tão envelhecido quanto mostra o Censo

Economista Francisco Pessoa Faria, da LCA, refaz projeção populacional do IBGE de 2018 e chega a população em 2022 de 213 milhões, 10 milhões a mais que o resultado oficial do Censo 2022. Detalhe: quem ‘sumiu’ não estava entre os mais velhos.

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Atualização:

Um cuidadoso exercício estatístico demográfico realizado pelo economista Francisco Pessoa Faria, da consultoria LCA, chegou a uma população brasileira de 213,4 milhões em 2022, com 10,3 milhões a mais de pessoas que o resultado do Censo 2022, que encontrou uma população de 203,1 milhões.

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Um aspecto muito importante na comparação entre o exercício de Faria e o Censo, segundo o economista, é que a população "a mais" na primeira contagem não ocorre entre os mais idosos, isto é, não ocorre na população de 60 anos ou mais. A estimativa de Faria aponta 32,5 milhões de brasileiros nessa faixa etária, enquanto o Censo contabiliza 32,1 milhões, com uma diferença de apenas 400 mil.

Já na faixa etária de 25 a 39 anos, a diferença é maciça. O exercício do economista da LCA chega a 51,2 milhões, enquanto o Censo aponta 47,1 milhões, com uma diferença de 4,1 milhões. Na faixa etária de 40 a 59 anos, o exercício contabiliza 1 milhão a mais brasileiros que o Censo, e, de zero a 24 anos, 4,8 milhões a mais.

Faria nota que, se o seu exercício estiver correto, as implicações são enormes. O Brasil está menos adiantado no processo do envelhecimento do que aponta o Censo 2022, e os mais alarmados com a Previdência devem pensar duas vezes antes de clamar por uma nova reforma.

O trabalho do economista consistiu em revisitar a projeção demográfica do IBGE de 2018 - ou mais precisamente, a revisão da projeção demográfica de 2013 realizada pelo IBGE em 2018.

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Estudo mostra que população brasileira pode não estar tão envelhecida quanto mostra o Censo Foto: Pedro Kirilos/Estadão

Essa projeção de 2018 indicou 214,8 milhões de brasileiros em 2022. Faria buscou refazer agora os passos da projeção do IBGE de 2018, principalmente corrigindo os números pelos impactos (imprevisíveis em 2018) da pandemia, não só em termos de aumento das mortes, mas também de redução de nascimentos. Daí se explica a maior parte da diferença de 1,4 milhão entre a projeção do IBGE de 2018 (com total maior) e o exercício do economista da LCA.

O economista explica que essas projeções populacionais intercensitárias (e também entre Censos e contagens da população) do IBGE são feitas há cerca de 40 anos. Elas são muito importantes para que haja uma continuidade de parâmetros demográficos que definem de composição de casas legislativas a fundos de participação de Estados e municípios, passando por inúmeras políticas públicas cruciais, como em educação e saúde.

As projeções têm como ponto central algum dos Censos, e buscam compatibilizar seus resultados com outros Censos (anteriores e/ou posteriores).

Num exemplo bem esquemático, Faria aponta que, se a população numa determinada faixa etária tem determinado tamanho num Censo, a população da faixa etária dez anos mais velha não pode ser o dobro daquela primeira no Censo seguinte, normalmente realizado dez anos depois (a menos de uma imigração maciça para o Brasil, que certamente não ocorreu no período histórico recente). O trabalho, portanto, consiste em harmonizar os dados dos Censos (sexo é outra característica que entra nesse tipo de procedimento), encontrando onde estão os erros.

Uma ferramenta complementar fundamental nesse processo é o uso de registros administrativos, como certidões de nascimento e óbito, declaração de imposto de renda, Caged, registros no SUS etc. Faria nota que a qualidade e a abrangência desses registros administrativos melhoraram muito no Brasil nos últimos tempos, e hoje eles são muito úteis para se fazer aproximações confiáveis com variáveis demográficas.

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Assim, a revisão da projeção demográfica pelo IBGE em 2018 foi um trabalho cuidadoso, utilizando ferramentas testadas ao longo do tempo e em processo de aprimoramento constante. Já o Censo de 2022, afetado por questões orçamentárias e por turbulências políticas, vindo na esteira da pandemia (o calendário tradicional apontaria 2020 como o ano de realização), sofreu de inúmeros problemas, nota o economista. Ele ressalva que o IBGE como instituição - perfeitamente capaz em termos técnicos para o trabalho - não é responsável por esses problemas.

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Em conclusão, Faria pensa que a utilização de dados administrativos, de qualidade reconhecida pelo IBGE, indicam uma trajetória da população mais próxima da contida na Revisão 2018 do que a da apresentada no Censo 2022 (o seu exercício, como notado acima, é uma atualização da Revisão 2018, com resultado próximo).

"Considerando todos os problemas enfrentados pelo IBGE ao longo do período de coleta do Censo 2022, é legítimo acreditar que a subenumeração nesta edição do Censo tenha alcançado patamar superior à média das edições anteriores, assim como aconteceu na Contagem 1997", afirma o economista.

Ele sugere a realização de mais Pesquisas de Avaliação da Cobertura da Coleta (relativamente ao Censo 2022), e que se acelere o processo de projeções de população, com grande transparência sobre como o IBGE vai lidar com a grande divergência entre a Revisão 2018 e o Censo 2022.

Mas a principal recomendação de Faria é que "considerações a respeito de alterações profundas em políticas públicas baseadas no resultado do Censo 2022 devem ser feitas com muita cautela".

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Faria publicou em setembro, no Blog do IBRE, este artigo sobre o tema.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 29/11/2023, quarta-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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