PUBLICIDADE

Publicidade

Reforma tributária: Indústria e grandes empresas querem restituição de crédito do IVA em até 30 dias

Companhias também pleiteiam que legislação preveja mecanismos para ‘obrigar’ poder público a realizar pagamento dos créditos; temor é de que regulamentação do novo imposto leve a judicializações como ocorreu com a Lei Kandir

Foto do author Alvaro Gribel
Foto do author Bianca Lima
Por Alvaro Gribel e Bianca Lima
Atualização:

BRASÍLIA – Às vésperas de o governo federal enviar ao Congresso os projetos de lei que vão regulamentar a reforma tributária, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) defendem que a restituição dos créditos gerados pelo novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) aconteça em no máximo 30 dias, a contar do pedido feito pelas empresas.

PUBLICIDADE

Isso porque o IVA tem como princípio a não cumulatividade plena, a fim de evitar a chamada tributação em cascata – ou seja, cada setor da cadeia só pagará imposto efetivamente sobre o valor que adicionou ao produto. Assim, tributos pagos em insumos, por exemplo, viram crédito e serão devolvidos às empresas.

O Ministério da Fazenda, procurado, diz que o texto ainda está sendo finalizado, mas a proposta original do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), fundado pelo atual secretário extraordinária da Reforma Tributária, Bernard Appy, falava em um prazo de até 60 dias.

Segundo o superintendente de economia da CNI, Mário Sérgio Telles, a PEC aprovada pelo Congresso já fala em restituição imediata desses créditos, mas a definição desse prazo acontecerá agora, por meio das leis complementares.

Mário Sérgio Telles, superintendente de economia da CNI, defende prazo máximo de 30 dias para a devolução do crédito às empresas. Foto: Iano Andrade/CNI

“A PEC garante restituição imediata, mas agora será definido o prazo. Defendemos que seja em no máximo 30 dias. Se é apurado em um mês, é preciso que a restituição aconteça em até um mês após o pedido da empresa”, afirmou Telles.

“Nossa posição também é de 30 dias. É um prazo razoável”, completou Pablo Césario, presidente-executivo da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca).

Sanções

Além do menor prazo de ressarcimento, empresas também pleiteiam que a nova legislação tributária preveja mecanismos para “obrigar” o poder público a realizar o pagamento dos créditos – o chamado enforcement, na expressão em inglês.

Publicidade

“Muito mais importante do que a discussão do prazo, para a devolução dos créditos, é a previsão expressa na lei de uma sanção caso isso não ocorra. É preciso que se tenha preocupação com a segurança jurídica dos contribuintes”, afirma o tributarista Luiz Bichara, sócio do Bichara Advogados.

A Abrasca defende que haja correção caso o crédito devido não seja pago no prazo definido. “No caso da CBS (IVA federal) e do IBS (IVA estadual e municipal), como o cachorro mordido por cobra tem medo do rabo, a gente defende que devolva em 30 dias, e a partir do 31.º dia, se não for devolvido, tenha uma correção igual à que a empresa deveria pagar ao governo caso atrasasse o boleto”, afirma Cesáreo.

A coalizão de frentes parlamentares que discute propostas alternativas de regulamentação da reforma tributária também defende o prazo de devolução de 30 dias e pleiteia a aplicação de multa em caso de descumprimento.

“Se não ocorrer (a devolução), tem que corrigir com a taxa Selic e ter multa de mora na mesma proporção de quando o contribuinte deve, de quando está em atraso ao Fisco; a mesma regra. Ou seja, 0,33% ao dia, limitado a 20% (sem definição de prazo)”, afirmou a advogada tributarista Lina Santin, coordenadora do grupo Mulheres no Tributário, que participou dos debates da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE).

PUBLICIDADE

Em ofício enviado à Comissão de Sistematização da reforma, ao qual o Estadão teve acesso, o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) afirma que o enforcement seria fundamental devido ao “histórico de inadimplência do Poder Público em relação ao ressarcimento de créditos tributários”.

Nesse sentido, o instituto sugere que seja autorizada a compensação da CBS com todos os tributos federais, inclusive contribuições previdenciárias, e do IBS com quaisquer tributos estaduais e municipais.

Além disso, as mineradoras defendem a previsão de transferência de créditos entre contribuintes, especialmente para os que investem em capital. “A cessão de créditos deve ser irrestrita, limitada apenas pelas disposições contratuais futuramente firmadas entre os cedentes e os adquirentes”, diz o ofício.

Publicidade

Risco de judicialização

Telles, da CNI, teme que aconteça com a reforma tributária o mesmo que houve com a Lei Kandir. O texto constitucional que aprovou a criação do ICMS, principal imposto estadual, acabou sendo modificado em vários pontos pelas leis complementares, o que levou a décadas de disputas judiciais.

“Não pode acontecer de novo o que houve com o ICMS e a Lei Kandir, que regulamentou o imposto e gerou confusão. O IVA gera saldo credor, e a restituição precisa ser garantida e rápida. Não se deve falar sequer em crédito cumulativo, porque a ideia é que seja pago imediatamente, antes de acumular”, disse.

A CNI espelhou internamente com seus associados, em paralelo, os 19 grupos de trabalho (GTs) criados pelo governo para discussões das propostas de regulamentação da reforma. Agora, essas diretrizes da CNI serão encaminhadas ao governo e ao Congresso, para que ajudem na elaboração das propostas.

“O único tema em que não houve consenso para a elaboração de propostas foi a Zona Franca de Manaus. Diante de visões divergentes, não contribuímos com esse tema”, afirmou Telles.

Sobre a disputa entre as empresas do setor de bebidas – o segmento de destilados quer ter a mesma alíquota do segmento de cervejas no imposto seletivo, sem distinção por teor alcoólico –, a CNI preferiu não se posicionar, defendendo apenas que haja “cautela” com a calibragem da alíquota, para que o setor mantenha a mesma carga atual.

Propostas

A Abrasca também finaliza documento com propostas para serem encaminhadas ao governo. Pelo menos seis pontos são considerados essenciais para que a reforma não seja descaracterizada, na visão da associação. Um deles, que os contratos de longo prazo de prestadores de serviços públicos possam ser revistos, para incorporar a nova carga de tributos, que pode crescer ou cair, em determinados casos.

“A reforma tributária pode ser considerada um choque externo e haverá desequilíbrio de vários contratos. Por isso, revisões tarifárias serão necessárias em setores como saneamento, energia, concessões rodoviárias”, explicou Cesário.

Publicidade

Na segunda-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, discutiu pontos sensíveis da regulamentação com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois de ter se reunido com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) para tratar do envio dos dois projetos de lei, prometidos para esta segunda-feira, 15.

Segundo Haddad, as propostas já haviam sido concluídas pela equipe econômica, mas ainda precisavam passar pelo crivo de Lula e da Casa Civil antes de serem enviadas ao Congresso. Com eleições municipais este ano, que acabarão encurtando o calendário de votações nas duas Casas, a expectativa é de que pelo menos um dos projetos seja aprovado.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.