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Governo autorizou R$ 16,7 bilhões para projetos da Lei Rouanet, mas valor captado foi menor; entenda

Mecanismo permite que produtores culturais busquem patrocinadores, que em troca ganham desconto no IR; valor captado no ano passado foi de R$ 2,2 bilhões

Por Maria Eduarda Nascimento

A notícia de que o governo Lula autorizou em 2023 R$ 16,7 bilhões para projetos aprovados pela Lei Rouanet foi distorcida nas redes sociais após postagens sugerirem que o valor saiu direto dos cofres públicos para os artistas. Na realidade, o governo autoriza que produtores culturais captem recursos junto a empresas ou pessoas físicas que, em troca, recebem abatimento no Imposto de Renda. O valor que efetivamente foi captado em 2023 foi bem menor que o autorizado: R$ 2,2 bilhões, de acordo com a plataforma Salic Comparar, do Ministério da Cultura. Em 2022, o valor captado havia sido de R$ 2,1 bilhões.

A Lei Rouanet é alvo recorrente de desinformação. Neste texto, o Verifica explica como funciona a captação de recursos para projetos culturais aprovados a partir da Lei Federal de Incentivo à Cultura, qual foi o valor captado e renunciado pelo governo federal em 2023, além das regras que os proponentes precisam seguir após ter a proposta aprovada. Confira abaixo.

Cena do musical 'Sunset Boulevard', no Teatro Santander Foto: ALEX SILVA/ESTADAO

A Lei Rouanet

Sancionada em 1991 pelo ex-presidente Fernando Collor de Mello, a Lei de Incentivo à Cultura é a principal ferramenta de fomento à produção cultural no Brasil. É por meio dela que produtores culturais apresentam propostas e especificam quanto pretendem arrecadar para viabilizar o projeto, que pode vir a ser aprovado para receber apoio de pessoas físicas e jurídicas a partir de renúncia fiscal.

Como funciona a captação de recursos?

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Para serem aprovado pela Lei Rouanet, os projetos passam por quatro fases de avaliações técnicas que ocorrem desde a apresentação até a autorização para execução da proposta. Na primeira etapa, é avaliado se a proposta atende aos objetivos da lei. Se aceito, o projeto recebe autorização para captar recursos e os valores captados ficam em uma conta bancária que é monitorada pelo Ministério da Cultura.

Na fase de captação, que tem duração de 24 meses, o produtor cultural poderá buscar incentivo de pessoas físicas e de empresas para patrocinar sua ideia. Aqueles que apoiam projetos culturais podem abater o valor total ou parcial do apoio do Imposto de Renda. Pessoas físicas tem desconto de até 6% do imposto devido e pessoas jurídicas de até 4%. É importante destacar que, embora o governo dê autorização para captação de determinado montante, isso não significa que o autor da proposta vai obter todo dinheiro previsto. Além disso, o produtor cultural só pode movimentar os recursos captados quando o projeto atingir o mínimo de 20% do valor proposto.

Os recursos para a execução dos projetos culturais não saem diretamente das contas públicas para o dono do projeto. Na prática, o governo abre mão de receber parte do imposto dos apoiadores para que projetos culturais sejam realizados.

Valor captado e renunciado pelo governo em 2023

Os R$ 16 bilhões apontados em postagens nas redes sociais como gastos do governo federal com projetos aprovados pela Lei Rouanet são, na realidade, a soma de todos os valores autorizados para captação de recursos dos projetos aprovados em 2023. De acordo com dados da plataforma Salic Comparar, do Ministério da Cultura, no ano passado a pasta aprovou 10.816 propostas, que representam R$ 16,7 bilhões autorizados para captação com patrocinadores.

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Ao Verifica, o Ministério da Cultura informou que o valor efetivamente renunciado pelo governo federal em 2023 só será possível precisar em 2025, porque esse número é divulgado pela Receita Federal cerca de dois anos após o exercício fiscal. Porém, dados divulgados no Salic Comparar mostram que o valor captado no ano passado foi de R$ 2,28 bilhões.

Em comparação com 2022, foram aprovadas 2.954 propostas, totalizando R$ 3,4 bilhões autorizados para captação de recursos. O valor captado pelo governo federal no último ano do governo de Jair Bolsonaro (PL) foi de R$ 2,1 bilhões.

Nem todos os projetos que recebem aprovação para captar recursos via Lei Rouanet conseguem atingir seus objetivos. De acordo com o ministério, atualmente há 2.612 projetos em execução e 8.703 propostas autorizadas a captar recursos. Conforme explicou a pasta, os projetos que estão em fase de execução captaram o suficiente para iniciar essa etapa, mas podem continuar captando recursos. O número de propostas em execução inclui projetos aprovados em anos anteriores.

Na plataforma VerSalic, que agrega dados de proponentes e seus projetos, é possível navegar por projetos aprovados e conferir o valor da proposta, o valor captado, além de outras informações sobre a iniciativa que está buscando apoiadores.

Quais regras os proponentes devem seguir?

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Além de ser submetido a avaliações técnicas, os projetos culturais, quando aprovados, devem cumprir as medidas de acessibilidade previstas em lei e oferecer o mínimo de 10% de ingressos ou produtos gratuitos, até 10% para patrocinadores, até 10% para divulgação promocional; 20% dos ingressos devem ter o preço máximo de 3% do salário mínimo, e 50% para livre comercialização, desde que o valor médio não ultrapasse R$ 250,00.

De acordo com uma publicação do governo federal sobre a Lei Rouanet, todos os projetos incentivados pela lei e que cobram ingressos devem oferecer ações formativas para até 500 pessoas (dependendo da quantidade de público previsto no projeto). A oferta pode ser em forma de bolsas de estudo, ensaios abertos, estágios, cursos, palestras e oficinas.

Prestação de contas

Durante a execução do projeto, os propositores devem realizar a comprovação das despesas de forma eletrônica. Essas informações são cruzadas com os valores utilizados em conta bancária específica e acompanhada em tempo real pelo Ministério da Cultura.

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A execução do projeto incentivado é acompanhada pelo ministério de forma eletrônica, por trilhas implementadas no Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura (Salic), que identificam possíveis inconsistências de execução. Esse acompanhamento é diferenciado pelo valor captado do projeto, classificado como pequeno (até R$ 750 mil), médio (de R$ 750 mil até R$ 5 milhões) e grande (acima de R$ 5 milhões).

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