Líder de grupo mercenário russo ofereceu informações sobre movimentação de tropas de Putin à Ucrânia

Yevgeniy Prigozhin afirmou que diria aos militares da Ucrânia onde atacar as tropas russas caso Kiev retirasse suas próprias forças da cidade de Bakhmut, onde o Grupo Wagner estava sofrendo fortes perdas.

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Por Shane Harris e Isabelle Khurshudyan
Atualização:

No final de janeiro, com diversas perdas dentro do Grupo Wagner em meio a luta pela cidade de Bakhmut, o chefe do grupo, Yevgeniy Prigozhin, fez uma oferta extraordinária à Ucrânia. O grupo, composto por mercenários de elite, é usado pela Rússia na Ucrânia em outros países da África e do Oriente Médio.

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Prigozhin afirmou que se Kiev retirassem seus soldados da área ao redor de Bakhmut, ele daria a Ucrânia informações sobre as posições das tropas russas que a Ucrânia poderia usar para atacá-los. Prigozhin transmitiu a proposta a seus contatos no diretório de inteligência militar da Ucrânia, com quem manteve comunicações secretas durante a guerra, de acordo com documentos de inteligência dos EUA que foram vazados na plataforma Discord, mas ainda não tinham sido relatados.

O líder do Grupo Wagner tem criticado as autoridades russas publicamente, principalmente por conta da necessidade de reabastecimento de armas e munições do grupo, que forneceram forte apoio para a Rússia durante a guerra. Apesar de ser um aliado do presidente da Rússia, Vladimir Putin, o vazamento das informações pode ser considerado uma traição por Moscou.

O documento vazado não deixa claro quais posições das tropas russas Prigozhin se ofereceu para divulgar.

O chefe do Grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin, se ofereceu para ajudar a Ucrânia caso as tropas de Kiev se retirassem da cidade de Bakhmut  Foto: AP / AP

Duas autoridades ucranianas confirmaram que Prigozhin falou várias vezes com a diretoria de inteligência ucraniana, conhecida como HUR. Um funcionário afirmou que Prigozhin estendeu a oferta em relação a Bakhmut mais de uma vez, mas que Kiev a rejeitou porque as autoridades não confiam em Prigozhin e pensaram que suas propostas poderiam ter sido falsas.

Uma autoridade dos EUA também alertou que há dúvidas semelhantes em Washington sobre as intenções de Prigozhin. As autoridades ucranianas e americanas falaram sob condição de anonimato para discutir informações confidenciais.

Em entrevista ao The Washington Post neste mês, o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, não confirmou os contatos com Prigozhin. “Esta é uma questão de inteligência [militar]”, disse ele. O líder ucraniano também se opôs à divulgação pública de informações classificadas e disse acreditar que os vazamentos beneficiaram a Rússia.

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Prigozhin já reclamou publicamente de Moscou

Mas não há como debater que Prigozhin está frustrado com Moscou. O líder do Grupo Wagner reclamou de forma privada e também publicamente que o Ministério da Defesa da Rússia não deu as munições necessárias para que o sucesso da operação fosse garantido. A luta pela cidade de Bakhmut deixou muitas baixas no exército russo e ucraniano.

O chefe do Grupo Wagner, que chegou a prometer que assumiria o controle de Bakhmut até o dia 9 de maio, para as comemorações do Dia da Vitória, chegou a ameaçar publicamente que o grupo poderia retirar sua participação na guerra.

Nesse cenário tenso, Prigohzin manteve um relacionamento secreto com a inteligência ucraniana que, além de telefonemas, incluiu reuniões pessoais com oficiais do HUR em um país não especificado na África, afirma um documento. O Grupo Wagner fornece segurança a vários governos do continente.

De acordo com um documento, Prigozhin afirmou a um oficial de inteligência ucraniano que os militares russos estavam com poucos recursos. Ele aconselhou as forças ucranianas a avançar com um ataque à fronteira da Crimeia, que a Rússia anexou ilegalmente, enquanto a moral das tropas russas estava baixa. O relatório também se referiu a outras informações de inteligência, observando que Prigozhin estava ciente da queda de motivação entre as forças do Grupo Wagner e que alguns de seus combatentes haviam recusado ordens de se posicionar na área de Bakhmut, por medo de sofrer mais baixas.

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O Kremlin não respondeu a um pedido de comentário sobre as comunicações de Prigozhin com a Ucrânia.

Durante uma guerra, não é incomum que as partes opostas mantenham alguma forma de comunicação. E os documentos não revelam a intenção de Prigozhin em conversar com seus antigos inimigos na Ucrânia. Em uma entrevista, um oficial ucraniano caracterizou os contatos no espírito de “manter seus amigos próximos e seus inimigos ainda mais próximos”.

Os documentos também sugerem que Kiev suspeita que o Kremlin está ciente das comunicações de Prigozhin com a inteligência ucraniana.

Quando informado de que os documentos de inteligência dos EUA revelaram as comunicações de Prigozhin com a inteligência ucraniana, o comandante do Grupo Wagner pareceu minimizar a situação. “Sim, claro, posso confirmar esta informação, não temos nada a esconder dos serviços especiais estrangeiros. Budanov e eu ainda estamos na África”, escreveu Prigohzin no domingo por meio de seu canal no Telegram.

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