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Leis e desordem: PLs de internet no País

Apesar das muitas propostas, lentidão, despreparo e falta de consenso impedem a adoção de legislação eficaz

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Por Redação Link
Atualização:

Há mais de mil projetos de lei para regulamentar a internet no Brasil. Lentidão, despreparo e falta de consenso impedem a adoção de legislação eficaz

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Anna Carolina PappTatiana de Mello Dias

SÃO PAULO – Todas as vezes que viaja ao exterior para encontrar os colegas, o diretor de políticas públicas do Google Brasil, Marcel Leonardi, tem de se desdobrar para explicar como funcionam as leis de internet aqui. “É um sistema muito complexo”, diz Leonardi, que vai a Brasília toda semana para participar de audiências e discutir projetos de lei relativos à rede com parlamentares.

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Não é fácil acompanhar. Segundo um levantamento do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV-Rio, hoje há mais de mil projetos de lei na Câmara e no Senado que mencionam a palavra “internet”. Eles tentam regular tudo: de crimes online ao comércio eletrônico, passando por proteção à privacidade, liberdade de expressão e acesso à banda larga. Alguns se repetem; outros são contraditórios.

“O problema é que, por melhores ou piores que sejam as intenções do legislador, diversos projetos acabam tratando dos temas em desconformidade com o que a tecnologia deveria ser: essa grande plataforma para inovação”, explica Bruno Magrani, pesquisador do CTS e um dos responsáveis pelo estudo.

Há algumas semanas, por exemplo, dois projetos de lei apareceram de supetão na pauta da Câmara. Um permitiria que empresas coletassem dados pessoais sem autorização do usuário e outro, para regular o e-commerce, poderia estabelecer mecanismo de retirada de conteúdo de sites sem ordem judicial.

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Quem conhece a Câmara e o Senado já sabe: quando um tema chama a atenção – como o vazamento de fotos da atriz Carolina Dieckmann, que deu origem à lei que tipifica crimes eletrônicos em vigor desde a semana passada – os parlamentares se apressam para apresentar ou resgatar os PLs sobre o assunto.

Quando os Estados Unidos se mobilizaram contra a Sopa e a Pipa, duras leis antipirataria que poderiam impedir o acesso a determinados sites (e foram derrubadas após pressão popular e de gigantes da tecnologia), os pesquisadores da FGV descobriram na Câmara uma versão brasileira dos polêmicos projetos – uma tradução. “Alguém interessado traduziu esse projeto de lei e convenceu um deputado a apresentá-lo. Ele fez isso sem saber que aquele projeto era a Sopa a Pipa”, diz Magrani. Houve uma grande repercussão no Twitter e o deputado retirou o projeto.

Há ainda outro personagem nessa trama complexa: os projetos de lei mortos-vivos. Mesmo quando um texto é deixado de lado, suas propostas podem ser ressuscitadas em um novo projeto. “A gente vê esses artigos de lei reciclados e reenxertados que nem zumbis: você mata e eles voltam”, diz o pesquisador.

Artigos com pontos polêmicos ou ambíguos são inseridos em projetos que não têm a ver diretamente com a internet – mas que, se fossem aprovados, poderiam mudar o modo como os brasileiros acessam a rede.

“Isso tem a ver com a lentidão do Legislativo. E com aquela crítica tradicional: quando a gente fala de legislação de tecnologia, temos de ter um grupo de pessoas especializadas que vão legislar no mesmo tempo do avanço tecnológico”, diz o advogado Renato Opice Blum, especialista em direito digital.

 

O Marco Civil da Internet surgiu há três anos para tentar organizar a regulamentação da internet. Foi uma resposta à Lei Azeredo, que poderia retirar a liberdade dos usuários da rede no País.

Discutido em consulta pública aberta na internet, o Marco Civil surgiu com um tom de “Constituição da Internet”. Seu objetivo é regular temas como liberdade de expressão, privacidade e a garantia de que todos teriam acesso igualitário à rede. Mas o tempo mostrou que tais princípios não eram tão universais assim.

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Quando chegou à Câmara, começou um jogo de interesses. Empresas de conteúdo queriam poder remover pirataria sem a necessidade de ordem judicial. As de telecomunicações eram contra a neutralidade, princípio que diz que não deve haver discriminação no tráfego na internet. O relator Alessandro Molon (PT-RJ) tentou votar o projeto sete vezes, mas não houve consenso.

Molon acredita que o Marco Civil funcionará como um “guarda-chuva” que ajudará na elaboração de projetos mais específicos. “Ele trata a internet de forma estruturante”, defende. Ele acredita que o projeto será votado em abril – desta vez, com um debate mais amadurecido.

Outros estão mais céticos. “Por mais que a gente tenha conseguido fazer uma lei excelente e ideal, talvez a gente não consiga aprová-la. Mas acho que se pelo menos conseguirmos aprovar alguma lei, uma lei que garanta questões básicas e mínimas, isso já seria um grande avanço”, diz Magrani.

—-Leia mais:‘As leis influenciam a arquitetura da rede’Emaranhado de interesses • Link no papel -8/4/2013

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