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Ex-professor de kung fu faz cosméticos, usa secreção de caracol para cabelo e fatura R$ 96 milhões

Edson Borgo começou no quintal de casa, foi interditado pela Vigilância Sanitária, regularizou a marca Ecosmetics e hoje exporta para 70 países; linha capilar é o carro-chefe

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Foto do author Adele Robichez

Um pequeno fogareiro no fundo do quintal de casa era tudo o que Edson Borgo, 56, tinha para começar. Ele produzia cosméticos artesanais nos intervalos das aulas de artes marciais que ministrava. Anos depois, a produção caseira deu lugar à Ecosmetics, marca de cosméticos profissionais, com faturamento de R$ 96 milhões em 2023. Entre seus produtos, tem uma linha feita à base de secreção de caracol para hidratar os cabelos.

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Capixaba, Borgo morava em Vitória, onde trabalhava como professor de artes marciais, como kung fu e full contact. Em 2000, mudou-se para Teixeira de Freitas, no interior da Bahia, a convite do então namorado da sua mãe. “Ele disse que teríamos a oportunidade de montar um negócio de cosméticos juntos”, conta.

Dois meses se passaram e o homem resolveu retornar ao Sul. Borgo ficou na cidade baiana com a esposa e a filha de sete anos. Por conta própria, resolveu produzir cosméticos sozinho em casa. Investiu, na época, R$ 3 mil. “Era tudo o que eu tinha”, assume.

Edson Borgo, fundador da Ecosmetics Foto: Divulgação/Ecosmetics

“Era bem artesanal. Comprei uma pá de madeira, um tacho de 50 quilos e um fogareiro, e comecei a tentar fazer negócio”, diz. Ocasionalmente, ele ia a Belo Horizonte (MG) comprar matéria-prima em uma empresa que ensinava as formulações. “Eu ia aprendendo e colocando em prática”, relata.

A pequena casa onde ele morava com a família tinha três cômodos. Um deles, que funcionava como uma garagem, foi ocupado pelo negócio. “Só tinha um tanque, que eu usava para lavar os utensílios, e um pé de abacate. Como eu não tinha carro, usei o espaço”, explica.

A Vigilância Sanitária inspecionou a residência em 2002 e, ao identificar uma série de “inconsistências”, fechou o negócio. Para colocar comida na mesa, como ele diz, continuou paralelamente dando aulas de artes marciais na cidade.

Incentivado pela esposa, que cursava pedagogia, ele se graduou em administração, formando-se em 2006. Nesse meio tempo, continuou insistindo na empresa, enquanto aplicava os novos conhecimentos.

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Investiu R$ 60 mil para recomeçar em uma pequena fábrica de 290 metros quadrados em Teixeira de Freitas. Com o dinheiro das vendas, foi expandindo o lugar aos poucos, comprando as casas ao redor. “Nunca peguei um centavo em banco, pobre não tem histórico para isso”, brinca.

Em 2007, ele comprou o terreno de 10 mil metros quadrados onde ainda hoje funciona a fábrica da Ecosmetics, avaliada em U$ 200 milhões.

“Fui criando network, juntando pessoas, contratei gerentes de compras. Minha esposa continuou estudando, fez farmácia e doutorado. Eu fiz doutorado em economia. A educação o tempo inteiro fez parte do negócio”, orgulha-se.

Empresa exporta produtos para 70 países

A Ecosmetics fabrica 320 produtos profissionais variados e vende para 380 parceiros que fazem a distribuição para salões de beleza, majoritariamente das classes A e B. Atualmente a marca exporta cosméticos para 70 países.

São quatro centros de distribuição. Em Teixeira de Freitas e Vitória, fica a estrutura de envio dos produtos ao Brasil e países vizinhos. De Ílhavo, em Portugal, saem as exportações para Europa e Ásia. De Fort Lauderdale, nos Estados Unidos, para a América do Norte e América Central.

A marca também conta com um site de vendas no qual os consumidores finais, geralmente cabeleireiros, podem comprar diretamente. O e-commerce representa cerca de 15% do faturamento.

Linha Plástica Capilar Foto: Divulgação/Ecosmetics

O carro-chefe da empresa são os produtos da linha “Plástica Capilar”, lançada em 2006, que atuam na reconstrução do cabelo. “Em duas aplicações, parece que nasce um cabelo novo”, promete Borgo. Depois, vem a linha Scargot, com produtos feitos à base da secreção do caracol para hidratar os fios.

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A marca comercializa xampus, condicionadores, cremes e óleos capilares para hidratar, nutrir e reconstruir, além de pó descolorante e produtos para coloração dos fios. O preço médio dos produtos é de R$ 95,64, sendo o mais barato R$ 22 (creme de pentear) e o mais caro R$ 456 (Brazilian Keratin). O ticket médio das compras no site é de R$ 382,56.

O faturamento de R$ 96 milhões em 2023 representa um crescimento de 42% em relação a 2022. Durante o ano, foram produzidos 1.131.389 produtos, totalizando 483.864 quilos no total. A marca conta com 62 funcionários.

O escritório, que lida com a parte comercial e financeira da empresa, está situado em Vitória (ES), onde Borgo mora com a família. A fábrica permanece em Teixeira de Freitas. “Ela já anda sozinha, não preciso mais estar lá”, afirma o empresário.

Marca foi premiada com academia para cabeleireiros

A Ecosmetics conta, desde 2009, com uma academia para cabeleireiros. Como funciona? A cada compra no site, o profissional recebe pontos, que se transformam em bônus e podem ser trocados por cursos.

São aulas feitas para qualificar as pessoas que já atuam na área. “Muitos não tiveram oportunidade de estudar e aprenderam na prática com outros profissionais. Mas os produtos de alta tecnologia demandam um manuseio correto”, explica Borgo.

Há cursos sobre gestão de negócios, planejamento financeiro e desenvolvimento de habilidades: como colorir, tonalizar e tratar o cabelo. Assim como nas escolas e universidades tradicionais, as aulas seguem um cronograma planejado. Cerca de 2,5 mil pessoas são atendidas por ano na academia.

Edson Borgo na premiação de organização internacional. Foto: Divulgação/Ecosmetics

O projeto funcionou em Teixeira de Freitas até 2019. Ficou pausado durante dois anos, entre 2020 e 2021, por causa da pandemia de coronavírus. Depois, migrou para Vitória. A academia rendeu à Ecosmetics um prêmio da Organization Mondiale Coiffure (OMC), uma premiação internacional que acontece a cada quatro anos, na categoria educação, em 2018.

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A Ecosmetics tem trabalhado na implementação de práticas de ESG, projeto que deve ser finalizado em até cinco anos. A ideia é estar dentro das futuras normativas esperadas para as empresas que desejam estar listadas na Bolsa de Valores. Borgo quer tornar a empresa uma S.A., e tem investido no bem-estar dos seus funcionários, em trabalhos sociais e ligados à sustentabilidade ambiental, além da tecnologia para estar à frente das tendências do mercado de cosméticos.

Avaliação de clientes

A Ecosmetics tem 11 reclamações registradas no site Reclame Aqui. A maioria das queixas são relacionadas à frustração com o resultado de tratamentos capilares realizados com o produto. Os usuários não deixaram classificações. 28% das mensagens foram respondidas pela marca.

Os autores das mensagens não podem ser verificados. Eventualmente, comentários positivos ou negativos podem ser uma ação a favor ou contra a empresa.

Consultora avalia tendências do mercado de cosméticos no Brasil

Na avaliação da consultora de negócios do Sebrae-SP Maísa Blumenfeld, o mercado de cosméticos no Brasil está passando por transformações significativas, influenciadas principalmente pelo comportamento do consumidor.

Ela indica que uma das questões decisivas na escolha dos consumidores é a sustentabilidade. “Vai além dos recursos de matéria-prima. Os consumidores hoje se preocupam com questões ESG e querem produtos que sejam veganos, orgânicos, cuja produção tenha menos impacto no planeta”.

Outra tendência apontada por Blumenfeld é a personalização dos produtos. “Cada vez mais o consumidor vai querer um produto feito para ele, dentro das crenças e valores que ele tem. A empresa precisa pensar nisso”.

A consultora acredita ser essencial que as empresas invistam em tecnologia, como Inteligência Artificial e Realidade Aumentada, para proporcionar essa experiência personalizada ao cliente desde a escolha dos insumos até o uso final do produto.

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O Brasil é um mercado expressivo no setor de cosméticos, sendo o quarto maior consumidor de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (HPPC) no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, China e Japão. Segundo a especialista, esse destaque se deve, em parte, ao investimento em tecnologia e à riqueza do bioma brasileiro, que oferece uma vasta gama de recursos naturais e ativos para inovação.

Blumenfeld também ressalta alguns desafios enfrentados pelas empresas, como a importação de insumos e o desenvolvimento de fornecedores locais. “Precisamos de insumos tratados aqui, a indústria está buscando esses fornecedores. É necessária a preparação da cadeia, especialmente se tratando de produtos naturais e veganos”.

Além disso, ela destaca a importância da profissionalização da mão de obra. “As empresas devem investir na educação e qualificação das equipes”, recomenda.

A consultora orienta ainda que as companhias do segmento de cosméticos busquem parcerias e participem ativamente de eventos e feiras internacionais para acompanhar as tendências do mercado. “Não dá para esperar porque é um mercado muito competitivo, temos lançamentos novos a cada momento”, alerta.

Por fim, ela enfatiza a necessidade de uma maior atenção às regulamentações e prazos estabelecidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). “O setor é muito regulamentado e é importante seguir as normas porque é uma questão de saúde”.

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