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Opinião|A reforma tributária não autorizou a cobrança automática do ITCMD-Exterior

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O ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) é um tributo estadual que recai sobre transferências patrimoniais provocadas por herança ou doação, conforme artigo 155, I, da Constituição Federal.

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Sua eficácia depende da edição de legislação interna por cada Estado, salvo se o doador tiver domicílio ou residência no exterior, ou se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior.

É que, para essas hipóteses (“ITCMD-Exterior”), é necessário haver legislação de âmbito nacional (lei complementar) que regule possíveis conflitos de competência entre os próprios Estados, conforme artigo 155, III, “a” e “b”, da Constituição Federal.

Embora jamais tenha sido editada lei complementar nesses moldes, muitos Estados promulgaram suas próprias leis para propiciar a incidência do ITCMD-Exterior, o que ensejou discussões judiciais.

O assunto foi definido em 2021 pelo Supremo Tribunal Federal, que condicionou a validade da incidência do ITCMD-Exterior à edição de lei complementar regulamentando o assunto (RE nº 851.108/SP).

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Na sequência, o Supremo Tribunal Federal julgou diversas Ações Diretas de Inconstitucionalidades (ADIN) ajuizadas para questionar as leis estaduais que estabeleceram o ITCMD-Exterior. Nessas ocasiões, houve a declaração da inconstitucionalidade formal das regras que projetaram a incidência do ITCMD sobre transferências oriundas do exterior, a exemplo do que ocorreu com a legislação do Estado de São Paulo (ADIN nº 6.830).

O assunto ganhou novos contornos com a Reforma Tributária. A esse respeito, o artigo 16 da Emenda Constitucional nº 132, de dezembro de 2023, definiu a competência dos Estados para a cobrança do ITCMD sobre certas hipóteses de transferências patrimoniais oriundas do exterior.

O texto dessa regra dispõe que “Até que lei complementar regule o disposto no art. 155, § 1, III, da Constitucional Federal, o imposto incidente nas hipóteses de que trata o referido artigo competirá: [...]”.

Essa redação gera reflexões sobre a viabilidade de ativação automática da eficácia das leis estaduais que, antes da Reforma Tributária, já tratavam da incidência do ITCMD-Exterior, mas que não foram validadas diante da ausência de Lei Complementar regulamentando o assunto.

Sob uma perspectiva, como certos Estados já possuem legislação tratando do ITCMD-Exterior, o novo texto constitucional teria restabelecido automaticamente a eficácia dessas leis estaduais, desde que não houvesse conflito material com a nova regra constitucional.

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Sob outra perspectiva, apenas novas leis estaduais, editadas após a Emenda Constitucional nº 132, teriam o efeito de viabilizar a cobrança do ITCMD-Exterior.

Acreditamos que a cobrança do ITCMD-Exterior demanda a edição de novas leis estaduais instituindo validamente essa exigência.

Afinal, mesmo que o vigente texto constitucional autorize a incidência do ITCMD-Exterior “até que lei complementar regule” o assunto, parece-nos inviável sustentar que as leis estaduais anteriores devam ter sua eficácia automaticamente restabelecida.

Sim, pois essas leis estaduais tiveram sua inconstitucionalidade reconhecida pelo STF, o que provocou sua nulidade e consequente remoção do ordenamento jurídico.

Logo, a nova previsão constitucional não tem o efeito de provocar o restabelecimento automático de regras cuja inconstitucionalidade foi reconhecida pelo STF, sendo necessária a edição de novas leis estaduais prevendo a incidência do ITCMD-Exterior.

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As futuras leis estaduais tendem a preencher os requisitos de validade, quer porque editadas com o devido respaldo constitucional, quer em razão do debate legislativo que propiciará publicidade e transparência à sociedade, garantindo o respeito à legalidade e à segurança jurídica.

Caso os Estados realizem prematuras cobranças do ITCMD-Exterior, haverá a instauração de um novo contencioso.

Portanto, embora a Reforma Tributária tenha autorizado a incidência do ITCMD-Exterior “até que lei complementar regule” o assunto, acreditamos que apenas leis estaduais editadas no contexto desse novo cenário constitucional tenham a aptidão de instituir validamente a cobrança do ITCMD sobre transferências patrimoniais oriundas do exterior.

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Aurélio Longo Guerzoni
Sócio do Guerzoni Advogados e mestre em Direito Tributário pela Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV)
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Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão.

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