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Opinião|A República em xeque

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convidado
Por Leonardo Bellini de Castro

Não tomamos com nenhuma surpresa a notícia de que o Brasil galgou postos negativos nos índices de percepção da corrupção, estando novamente ocupando lugar de destaque entre os Países mais corruptos do mundo.

Ora, já de há muito assentado que um ambiente institucional não politizado e infenso a aventuras partidárias se constitui como condição irrefragável para a investigação, persecução e punição de agentes políticos envolvidos com malfeitos envolvendo o erário. O Brasil, certa e infelizmente, andou na contramão dessa máxima.

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O que temos testemunhado, para além do verniz midiático, é o retorno da normalização pública de práticas ilícitas envolvendo o erário público, bem como o avanço de práticas clientelistas no preenchimento de cargos chaves na estrutura judicial, o que obviamente rende frutos que não contribuem para o amadurecimento de nossa República.

Causa ainda espanto observar que o avanço de tais práticas de tomada institucional do Estado Brasileiro não tem se restringido aos espaços públicos, esses já plenos de cargos para a famosa troca de favores, mas também tem avançado até mesmo ao nível dos espaços privados, aviltando uma justa governança corporativa, a qual que se constitui mesmo como uma legítima expectativa dos acionistas.

Basta ver o que ocorreu recentemente com uma gigante da extração de minério, que foi vítima de intensa pressão para a nomeação de político de preferência do Palácio do Planalto para ocupar cargo de presidência na companhia, ao que noticiado sob pena de sofrer eventual revés em seus interesses corporativos no tocante a expedição de licenças ambientais, fato esse que não tão curiosamente foi noticiado com naturalidade pela imprensa.

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É dizer, as alianças político partidárias e midiáticas têm efetivamente dado o tom da ocupação de espaços no Estado Brasileiro, tudo em prejuízo de uma decisão técnica e embasada na capacidade decisória dos agentes nomeados, o que certamente esgarça os mecanismos de controle e punição de malfeitos, que a essa altura se afiguram como rematada quimera.

A própria crítica, análise e difusão de eventuais notícias questionando o modelo que tem avançado no Brasil, que inclusive busca apertar o cerco contra a livre manifestação do pensamento, tem se mostrado como uma tarefa de alto risco, havendo preocupantes precedentes nessa seara.

Ademais, em face dos evidentes retrocessos históricos que testemunhamos e da subsequente perseguição a agentes públicos que agiram com lisura e altivez no exercício dos respectivos cargos no tocante à persecução da corrupção, se nos afigura altamente improvável que surjam novos agentes públicos dispostos a se expor a uma batalha que já de antemão se mostra como vencida.

Forçoso é concluir, portanto, que a posição atual do Brasil nos índices de percepção da corrupção não causa espanto, mas para além disso é mais preocupante o fato de que não existem perspectivas alvissareiras à frente.

A concentração de poder decisório no tocante aos ditos peixes graúdos e a percepção corrente e já manifesta de que o resultado punitivo dificilmente será eficaz, tornam a tarefa de investigação e persecução esvaziada e infértil, bastando ver que se extinguiram as notícias que antes se faziam correntes de operações que abarcavam ilícitos nesse domínio.

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Assim e infelizmente, podemos esperar que os anos vindouros tragam uma intensificação crônica da corrupção, com perversos resultados para a sociedade em geral e para a preservação da República e democracia, que se tornaram reféns de um discurso político eminente formal e dissociado da realidade substantiva.

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Como consequência, para além dos óbvios e naturais prejuízos concretos decorrentes da corrupção generalizada, que mina a capacidade de ação e investimento do Estado, também os prejuízos morais reverberam com vigor entre a sociedade, que não mais vê entre as instituições públicas uma opção viável para a salvaguarda de seus interesses.

E nessa toada surge a natural deterioração do capital social, que nada mais é que a falta de confiabilidade mútua entre os cidadãos, o que impõe pesados ônus cívicos, já que as palavras de ordem passam a ser “cada um por si” e “todos fazem”, inaugurando-se um círculo vicioso em que a ética pública é vista como uma postura que coloca o cidadão em evidente desvantagem nas trocas sociais.

A autotutela e a intensificação de ilícitos de todos os espectros já têm ocorrido a corroborar essa tese, estando hoje o cidadão brasileiro lançado a própria sorte em um terreno perigoso.

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Esta série é uma parceria entre o Blog do Fausto Macedo e o Instituto Não Aceito Corrupção. Os artigos têm publicação periódica

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Leonardo Bellini de Castro
Promotor de Justiça – MPSP e mestre em Direito pela USP
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