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O avanço para a produção das vacinas repousa na mesa de Bolsonaro

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Por Pedro Villardi
Atualização:
Pedro Villardi. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

A pandemia acabou. Essa é a frase que queremos ouvir desde que foram decretadas as primeiras medidas de restrição da circulação e do fechamento de comércio. Mas na realidade isso só será possível quando tivermos uma distribuição equitativa das vacinas, desenvolvidas em tempo recorde e com altas somas de recursos públicos investidas.

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Poucas pessoas imaginavam que em setembro de 2021 ainda estaríamos lutando contra uma pandemia que já tirou a vida de mais de 4,5 milhões de pessoas e que mata mais de 10.000 pessoas por dia no mundo. Atualmente, o Brasil sozinho é responsável por 10% desse trágico número diário de mortes, embora sejamos apenas 2,7% da população mundial.[1]

Esses dados tornam-se especialmente dramáticos quando notamos que quase 65%[2] das mortes no planeta aconteceram após o FDA (Federal Drug Administration) aprovar, em 11 de dezembro, o primeiro registro da uma vacina contra a COVID-19. Como podemos aceitar que quase três milhões de pessoas morreram, mesmo depois do desenvolvimento de uma tecnologia capaz de prevenir uma enorme parte dessas mortes? É inaceitável, mas explicável.

Durante a pandemia de COVID-19 nos deparamos com o desafio de fornecer os mesmos insumos para 8 bilhões de pessoas ao mesmo tempo. Se as pessoas tivessem sido colocadas em primeiros lugar, racionalmente teríamos de trabalhar no sentido de colocar toda a capacidade global de produção e distribuição para vacinar o maior número de pessoas no menor tempo possível. Mas não é isso o que está acontecendo. Vejamos.

Em que pesem os vultosos investimento públicos e garantias de compras antecipadas, atualmente são poucas empresas que controlam a produção e distribuição global de vacinas para COVID-19. Essas empresas fazem isso por meio de patentes, um título que lhes garante um monopólio de, no mínimo, 20 anos. Com isso, qualquer tentativa de produzir vacinas para a COVID-19 depende da permissão dessas empresas. O efeito disso é que, ao invés de gerarmos imunidade global, geramos nove novos bilionários[3].

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Há uma medida que pode superar o problema dos monopólios nacionalmente: a licença compulsória. No Brasil estamos muito próximos de ter uma das leis mais avançadas no mundo nessa questão. O PL 12/21 está na mesa do presidente Jair Bolsonaro para ser sancionado. O PL 12/21 não inaugura a licença compulsória no Brasil - instituto que já existe há quase 100 anos. Na verdade, trata-se de um aperfeiçoamento do mecanismo, criando um rito mais adequado para tempos de emergência sanitária. Isso porque o PL 12/21, ao contrário do atualmente previsto na lei brasileira, permite o licenciamento compulsório de várias tecnologias simultaneamente, além de admitir também a participação da sociedade civil no processo de elaboração da lista de tecnologias de interesse ao combate da emergência sanitária.

Embora tenha tido sua eficácia comprovada em salvar vidas durante a epidemia de HIV/AIDS, a licença compulsória ainda é vista com desconfiança por causa de, basicamente, dois motivos. O primeiro, a eventual retaliação que poderia gerar ao país emissor. O segundo, sua suposta ineficácia devido à não cooperação do titular da patente licenciada.

Sobre o primeiro ponto, não há qualquer pesquisa ou mesmo relato que aponte que países foram retaliados por emitir licenças compulsórias. Também não há qualquer relação entre emissão de licenças compulsórias e queda nos investimentos ou diminuição de postos de trabalho. As únicas consequências da licença compulsória são o aumento do acesso à tecnologia licenciada e importantes economias de recursos públicos, ao gerar concorrência e diversificar as fontes de oferta dessas tecnologias.

Em relação ao segundo ponto, o PL 12/21 traz duas previsões que pretendem lidar com essa questão. São as obrigações tanto do titular da patente licenciada compulsoriamente, como das agências públicas nacionais, de compartilharem todas as informações necessárias para a reprodução da tecnologia. Com isso, espera-se que empresas brasileiras possam reproduzir as tecnologias licenciadas, caso o titular da patente recuse cooperar.

A bola agora está com a Presidência da República, que tem até a próxima quinta-feira, dia 02/09, para sancionar o PL 12/21. Em meio ao morticínio em que vivemos, pressionados pelas variantes que reduzem a eficácia das vacinas, pela baixa disponibilidade de imunizantes e pela possibilidade de ter de administrar doses de reforço ou organizar campanhas anuais de vacinação, sancionar o PL 12/21 é urgente.

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Câmara e Senado fizeram suas partes e as vitórias acachapantes que o PL teve nas votações mostram que se trata de tema de alto interesse público. Cabe agora ao presidente escolher o lado do povo e sancionar o PL 12/21. Ou proteger os interesses de grandes corporações transnacionais e seus CEOs bilionários, que apostam com a vida e lucram com a morte de milhões de pessoas.

*Pedro Villardi é coordenador do Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual (GTPI) e da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids. É doutor em Ciências Humanas e Saúde pelo Instituto de Medicina Social da UERJ (2018) e pesquisador de saúde pública, medicamentos essenciais e patentes farmacêuticas

[1] https://ourworldindata.org/coronavirus

[2] Elaborado com dados de https://ourworldindata.org/coronavirus

[3] https://www.oxfam.org.br/noticias/vacinas-contra-a-covid-19-criaram-9-novos-bilionarios/

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