Opinião|Alice Ferraz: Quando saímos do nosso país, temos de estar abertos ao mundo dos outros

A beleza de viajar é ter a oportunidade de interagir com a cultura local, aprender e até concordar ou discordar, mas sempre estar atento ao novo

PUBLICIDADE

colunista convidado
Foto do author Alice Ferraz
Atualização:

A cultura de cada país é formada por tradições, costumes e valores compartilhados. Somam-se a isso arte, música, literatura e idioma, que ligam pessoas por fios invisíveis, formando comunidades, cidades, países. A beleza de viajar é ter a oportunidade de interagir com a cultura local, aprender e até concordar ou discordar, mas sempre estar atento ao novo.

PUBLICIDADE

Meu pai era piloto e viajar, para minha família, era algo natural. Assim, para mim pareceu até instintivo escolher uma profissão que também me oferecesse essa possibilidade - o que me faz muitas vezes ao ano embarcar rumo ao conhecido/desconhecido. Digo isso porque, depois de tantos anos cobrindo semanas de moda em Paris e Milão, por exemplo, às vezes sinto que conheço a cultura local. Na verdade, é quase uma pretensão achar que, por estar em uma cidade por 4 ou 5 dias, blindada em um ambiente exclusivamente profissional, conheço a cultura francesa ou italiana.

A tecnologia contribui também para essa distorção. Um colega meu se diz expert em Japão depois de passar um mês por lá; outro acredita que, depois de morar um ano em Nova York, sabe como são os americanos. Bobagem. Meu amigo Nilton Bonder me disse certa vez que nos achamos super-homens, com verdadeiros superpoderes, pois voamos com nossas asas metálicas pelo mundo em um piscar de olhos. Entendo o que ele diz. Nunca estivemos tão próximos, por meio da comunicação, do que acontece no mundo todo - e podemos estar fisicamente em quase qualquer lugar.

SAO PAULO CADERNO 2 24-01-2023 COLUNA ALICE FERRAZ COLUNA ALICE FERRAZ FOTO PRADA  Foto: DIV

Mas essa facilidade de locomoção não veio junto com um guia de comportamento. Como se naquele lugar, a só 11 horas de voo de distância, você pudesse se sentir em casa, chegando com sua mala, suas regras e sua cultura.

Quando saímos do nosso país, temos de estar abertos ao mundo dos outros. Nas fronteiras, que são a porta de entrada da casa do outro, mostramos nosso passaporte e somos avaliados e autorizados ou não a entrar. Devia haver ali mesmo uma plaquinha, dizendo: respeite a cultura local. Mas não tem. E aí passamos por cima de tradições que, para nós, nada significam e invadimos espaços que têm regras próprias.

Achamos que o francês é mal-educado, que o americano é frio, que o italiano grita, quando isso é só a ponta visível de um modo de vida, de expressão e de entendimento da cultura local.

Descobri que, quanto mais curtas são minhas viagens e menos tempo tenho para absorver as diferenças culturais, mais difícil se torna minha jornada. Viajar a trabalho por quatro dias leva meu corpo físico, mas minha alma e minha mente demoram mais para chegar. Esse desencontro é fatal para que eu desenvolva a ligação com a cultura local, que é o que me preenche de entusiasmo.

Publicidade

Opinião por Alice Ferraz

É especialista em marketing de influência e escritora, autora de 'Moda à Brasileira'

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.